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Transeuntes nas paredes: a arte de Lúcio Rodrigues na Praça CEU

Na parede
Na parede
“Pra que fazer igual, copiar o que já está aí?”, questiona o artista visual Lúcio Rodrigues (Foto: Fernando Priamo)
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Em 2009, Lúcio Rodrigues ocupava o Centro Cultural Bernardo Mascarenhas (CCBM) com a exposição “Habitantes”. Nela, uma série de rostos sugestivos, que representam os invisíveis transeuntes das cidades, coloriram as paredes em quadros sem moldura. Durante o ano passado, essas imagens retornaram ao seu imaginário, mas já com outras significações, impulsionadas pela invisibilidade que o estar o tempo todo nas redes sociais ocasiona. Dessa vez, seu espaço eram as bulas dos remédios que comprava para sua mãe. Ele disse que tem cerca de 800 guardadas. Já no final do ano passado, a Fundação Alfredo Ferreira Lage (Funalfa) lançou o edital “Na parede”, que visava valorizar os espaços públicos através de grafites feitos por artistas da cidade. Lúcio foi um dos cinco contemplados. “Habitantes”, agora, tem vista pública na Praça CEU (Centro de Artes e Esportes Unificados Coronel “Adelmir Romualdo de Oliveira”).

Para a inscrição no edital, era necessário enviar um croqui com o desenho que seria realizado, primeiramente, em um viaduto da cidade. Depois de alguns embates, decidiu-se que cada artista escolheria um local onde tivesse afinidade para exibir a obra. Lúcio escolheu a praça da Zona Norte porque é um lugar que acompanha diariamente. Ao contrário do proposto, ele não costuma fazer esboços do trabalho que vai realizar – só nesses casos mesmo. Ele conta que, enquanto pinta, não pensa muito no que está fazendo. Ele vai “viajando” e busca no momento a referência necessária para pintar. O ponto de início pode ser o tema que foi sugerido quando encomendado. Se existe mais liberdade, a inspiração vem do que ele está lendo no momento ou “da vida”.

Paredes como folhas

(Foto: Fernando Priamo)

“Habitantes” consegue exprimir bem o trabalho que Lúcio faz. Com tantos anos vivendo disso e desenhando todos os dias, ele garante: “tenho meu jeito próprio de pintar”. No entanto, diz que está “sempre mudando”. A ideia é fazer com que suas obras explorem o lado mais “rabiscado” do desenho. Como se a parede fosse uma folha e os jatos e pincéis fossem o lápis e a caneta. Na Praça CEU, por exemplo, os rostos são, em sua maioria, feitos com traços em preto e branco com algumas aquarelas.
Lúcio defende que suas artes são, geralmente, minimalistas. “Eu não faço realismo. Pra que fazer igual, copiar o que já está aí?” Ao mesmo tempo, acredita que “a arte tem que dar um peteleco nas pessoas”, mesmo sendo, muitas vezes, pessoal. Mas não tem como impor um significado, cada um, com seu olhar, vai trazer uma versão. “Eu tô aqui para pintar, não para explicar.”

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Buscando as liberdades

Ele começou a desenhar cedo. Desde os anos 1980 é grafiteiro. Nesse tempo, começou a faculdade de filosofia, de cinema, mas só terminou a de design gráfico. É um leitor ávido e já fez de tudo um pouco nesse mundo artístico, apesar de afirmar que gosta mesmo é dos painéis. Durante toda a conversa, ele estava pintando uma parede para uma loja de açaí, e não parou um minuto sequer de fazer o fundo para o desenho que viria depois. “Nunca quis ser escravo dessas coisas. A arte me levou para um outro lado. Eu consigo ainda ter liberdade.”
Durante a pandemia, além de desenhar nas bulas, ele também pintou na garagem de sua casa e se aventurou na marcenaria. Orgulhoso, conta que, nesse tempo, foi conhecendo uma parte também artística em sua filha Isabel, de 10 anos. Dia desses, ele conta que acordou com ela tocando piano perfeitamente. Ela também desenha e, ao contrário dele no começo, não copia imagens, ela faz do zero e ainda passa para o computador. Mas não apresenta pretensão de ser artista, não gosta de mostrar aos outros. Lúcio fala que, talvez nisso, ela o tenha puxado.

“Na parede”

Além de Lúcio, Igor Moreira de Abreu, Carlos Eduardo Marques Ribeiro, Felipe Lourenço Rosa e Nathalia Medina de Azevedo foram contemplados pelo “Na parede”. Giovana Bellini, gerente de Estratégia e Inovação da Funalfa, diz que a escolha foi feita com base nos croquis que dialogassem com a cidade e faziam sentido com a proposta de valorização dos espaços de Juiz de Fora.

Além das pinturas, reparos nos espaços escolhidos também estão sendo feitos a partir do Programa Boniteza, da Secretaria de Governo da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF). Giovana ainda afirma que a arte urbana consegue conversar com a cidade. Ela também aponta que existe um grupo de trabalho na PJF voltado especificamente para pensar na valorização e difusão da arte de rua feita pelos artistas juiz-foranos. A proposta, de acordo com ela, é espalhar essas obras pela cidade e fazer com que o olhar para ela e a própria rotina da cidade mude, ou pelo menos, seja mais colorida.

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