Se no palco Gabriela Buarque conta com o aval dos aplausos após a execução de suas canções autorais, em seu dia a dia, o reconhecimento vem através da poesia e do teatro, que preenchem sua vida de arte. Por meio do poeta Manoel de Barros, a cantora e compositora carioca vem aprofundando seu mergulho nas palavras cantadas. Em um novo formato de apresentação, Gabriela reúne parte das dez faixas de seu primeiro disco solo, "Deixo-me acontecer", a estrofes assinadas pelo poeta cuiabano, declamadas por Carla Vergara.
"Tem ainda composições de Arnaldo Antunes, Caetano Veloso, Gilberto Gil e Chico César", completa Gabi, sobre o projeto intitulado "Música para Manoel", que conta também com Lula Washington no violão. A estreia, na última semana, aconteceu no Espaço Nirvana, no Rio, e, conforme a cantora, outras datas serão agendadas. Por enquanto, Juiz de Fora recebe a artista em outra performance, sua atuação nos vocais do grupo Mulheres de Chico, que volta ao Cultural neste sábado.
Gabi Buarque, que lançou "Deixo-me acontecer" por aqui ao lado de Roger Resende em agosto, promete voltar com o trabalho solo no dia 25 de novembro no Mezcla. Diretamente do Teatro Odisseia, na Lapa carioca, após uma apresentação do Mulheres de Chico, ela, que saiu vencedora do II Festival das Rádios Públicas do Brasil como melhor intérprete, conversou com a Tribuna sobre o processo de criação, seu apreço pela palavra e como manter o frescor para sobreviver frente a um mercado que exige, sobretudo, maturidade.
Tribuna – Você compõe letra e música, escreve, canta e interpreta outros compositores. Como é ser "pluri", num tempo em que muitos tendem ao "uni"?
Gabi Buarque – Não sei ser diferente. A arte está na minha vida desde que me conheço por gente. Primeiro por influência da minha mãe que é designer (também tenho formação em design pela UFRJ), depois pela música que veio nos tempos do colégio e, mais tarde, com a profissionalização pela Escola de Música Villa-Lobos e Escola Portátil de Música (choro). A escrita/poesia se desenvolveu a partir da leitura de "Água viva" (de Clarice Lispector). E o teatro, hoje, não consigo dissociar do meu canto, e acho que ele sempre esteve presente em mim. Cada canção que faço tem um pedaço do que sou, e por isso não poderia ser "uni".
– Diante de tantos downloads e outras piratarias, quais os maiores desafios para o mercado de autorais de samba hoje em dia?
– O mercado fonográfico se transformou sensivelmente nos últimos anos, da mesma forma que o artista. O desafio atual não é estourar nas paradas de sucesso e vender milhares de cópias de CD, isso é ilusório. Pela internet, a música autoral ganha espaço não só no Brasil, mas no mundo. A questão é: como levar essa mesma música para os meios de massa? Isso sim é um desafio, porque interfere numa série de conceitos de formação cultural e plateia. É a este lugar que quero chegar, sem que, para isso, tenha que pagar ou comprometer a qualidade do meu trabalho.
– Gravar ao lado de Cristina Buarque, irmã do Chico, além do fato de fazer parte do grupo Mulheres de Chico, faz com que muitos pensem que você seja da família…
– Sou prima de milésimo grau, isso existe? (risos). A família Buarque é uma só, mas com inúmeras ramificações. Faço parte de uma delas, assim como o Chico. Costumo dizer que ele ainda não me conhece.
– Como foi o contato com Roger Resende? O que viu no circuito cultural de JF que lhe chamou mais atenção?
– Conheci o Roger durante uma apresentação dele no Quintal e gostei muito do que ouvi. É um violonista muito sensível e tem um trabalho autoral igualmente bonito. A partir desse dia em que cantei com ele, começamos a nos falar por e-mail e a fechar um repertório para apresentar. Juiz de Fora tem uma cena cultural rica e, por isso, lançar um trabalho de samba, coco, maracatu (na cidade) tem tudo a ver.
– Algum plano por aqui?
– Além de um lançamento oficial com banda e repertório inédito, tenho vontade de levar para Juiz de Fora o projeto que escrevi com canções de Chico Buarque e poemas de Fernando Pessoa que apresentei no Teatro Sesi do Rio e Forte de Copacabana. Também participo de um projeto com poesias de Manoel de Barros e canções relacionadas à obra dele. Se pudesse levaria todos eles para Minas, essa terra que me acolheu tão bem! Roger me falou de um Encontro de Compositores, gostaria de conhecer.
MULHERES DE CHICO
Hoje, às 23h
Cultural
(Av. Deusdedit Salgado 3.955)
Abertura e fechamento com Roger Resende