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Entrevista: Chico Chico fala sobre seu disco ‘Pomares’

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Chico Chico, filho de Cássia Eller, estreia no palco do Sensorial Centro de Cultura neste sábado (Foto: Dudu Mafra/ Divulgação)
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Parece mesmo que a capa tem a cor do disco, e até do cantor e compositor que afirma que “Pomares” não é só dele. Chico Chico, o Francisco Ribeiro Eller, não consegue explicar bem como as coisas foram acontecendo. Elas simplesmente acontecem. É piegas pensar nisso, de acordo com ele. Mas ser compositor e músico é trabalho que precisa de prática, por mais abstrata que sejam as situações. Tudo que Chico Chico sugere parece ser um ciclo. Foi coincidência ter várias crianças ao seu redor na capa do disco. Mas elas também indicam essa crença de começo, meio e fim: são, como ele falou, a semente. Começo de tudo. O cantor, filho de Cássia Eller e Maria Eugênia Vieira Martins, faz show em Juiz de Fora neste sábado (16), na inauguração do novo espaço do Sensorial Centro de Cultura, que abre às 20h.
Depois de ter lançado alguns álbuns em parceria, o primeiro com a 2×0 Vargem Alta, depois com João Mantuano e, mais recentemente, com Fran Gil (filho de Preta Gil), “Pomares” é o primeiro disco feito por inteiro com composições de Chico Chico. Lançado em 2021, o álbum faz um passeio pelos ritmos brasileiros e apresenta letras profundas. Nelas também se faz presente toda a percepção do ciclo da vida, além da natureza – sendo um dos mais rurais de sua discografia, majoritariamente urbana. Em entrevista por telefone à Tribuna, ele diz não saber bem como vai ser o show. Só garante ser um pouco de cada coisa e vir com a banda inteira.

Tribuna – A capa é uma forma de ser atraído pelo disco. Você, nela, está cheio de crianças do lado. E ela tem muito do álbum. Como foi pensar nela?
Chico Chico – Engraçado, porque foi sem querer, na verdade. A gente estava tirando fotos de divulgação e acabou que pintou esse momento, que a molecada se interessou pelo aparato de luz. E a gente acabou que juntou todo mundo e fez a capa. E rolou porque, na hora, a gente “sacou” que era isso que a gente queria, sem saber que era isso que a gente queria. E as crianças representam muito. Só o nome do disco, “Pomares”, já faz muito sentido com a criançada. Pomar é uma coisa que dá frutos, eles também.

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Você escreveu “Abacateiro real” olhando para uma outra árvore, né?! Como funciona seu processo de composição?
Eu não sei se é a partir do nada. É também do nada. Mas tem muitas formas. Às vezes eu tenho um assunto e tenho que sentar para fazer. Às vezes você tem um estalo. Se você não senta e faz meio que não rola, né?! Não acontece, não tem jeito, como qualquer coisa na vida. O abacateiro, por exemplo, eu usei mais pela sonoridade. A árvore que eu estava olhando eu nem lembro qual era. Era bem majestosa no sítio. E, talvez, por eu não saber o nome e as sílabas de abacateiro serem perfeitas para a métrica que eu estava procurando na canção, acabou sendo alguma viagem assim.

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“Amarelo amargo”, por exemplo, eu acho triste a letra. Mas a melodia, não. É um baião.
Sim. Mas nem todo baião é alegre, né?! Por exemplo: “Fica mal com Deus quem não sabe dar” (ele canta). O Gonzagão tem muitas coisas tristes. Não comparando. Mas não sei se algum estilo revela de fato alegria ou tristeza por si só. Eu acho que tudo cabe. Mas, realmente, “Amarelo amargo” é uma música em tom maior com uma letra que não necessariamente é alegre. E ter pontos melancólicos e pontos alegres é uma jogada. “Maxwell’s Silver Hammer”, dos Beatles, é toda bonitinha, alegre, em tom maior também. Mas é sobre um assassino em série a letra. Dependendo da profundidade que você quer dar, do que você quer dizer no discurso, vale muito a pena você casar uma letra triste em uma melodia em tom maior, ou o contrário. Porque essas coisas ganham ênfase. E, quando inverte, isso pode acontecer de maneira interessante porque a pessoa ouve com atenção e tem como um estalo.

E você, até dizendo essas coisas, mostra que tem muitas referências musicais. Como elas aparecem para você nas músicas?
É inevitável mostrar minhas referências. Mas isso, por exemplo, é uma coisa que eu não penso quando vou compor, diferente do que a gente estava falando sobre letra e melodia. Quando você vai fazer uma coisa eu não penso: “isso eu tirei dali”. Você meio que sabe que tudo o que você escutou e passou na sua vida está ali. Apesar de não ser tão facilmente mapeável. Vai saindo da gente tudo o que a gente já viveu. É meio piegas, mas é isso mesmo. O processo de composição, na verdade, é menos piegas do que as pessoas imaginam. Eu acho que as pessoas pensam que a composição é só inspiração. É também, mas você tem que sentar e fazer. Se você não colocar no papel o que está pensando, você não está criando nada. E isso é o meu trabalho.

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“Pomares” é o seu primeiro disco solo. Quando você pensou que era hora de ter um disco feito só com composições suas?
Assim, eu sinto que todos os outros discos também são muito meus, apesar de não serem só. Meu disco com o João Mantuano é muito nosso, porque ali era uma banda. É muito nosso mesmo. E é engraçado, porque ele não é meu, mas é muito mais meu em alguns aspectos. Porque, por exemplo, os arranjos são todos nossos. Eu toco em todas as faixas. O disco “Pomares” as músicas são todas minhas, mas a gente abre mão de certas coisas. Eu não toco em todas as faixas. Eu sempre quis lançar um disco meu. Mas não só isso: eu sempre quis lançar discos, independente de qualquer coisa. É meu trabalho e eu sempre quero continuar fazendo. Não acho o “Pomares” mais meu que os outros. Não sei nem explicar direito. A maior parte das vezes a última coisa que você faz é aquilo que você mais quer. Eu tenho essa impressão. Desde o início, a ideia do disco era ser completamente autoral. E isso aconteceu. O que é ótimo, porque a gente é cheio de música. Se a gente não tocar nossas músicas, quem vai tocar? Ele não é completamente meu e, no meu caso, nunca vai ser. O que eu posso fazer são as músicas. O resto tem que ser de galera mesmo.

“Ninguém”, com o Fran Gil, está viralizando no TikTok. O que você acha disso?
Eu acho uma doideira. Eu não entendo muito disso não, para falar a verdade. Mas o negócio é que as pessoas não estão consumindo exatamente a música. É mais um outro lance, que a música fica em segundo plano. Não sei se necessariamente é ruim. O que me incomoda mais são os 15 segundos. O que me preocupa é você começar a esperar esse imediatismo. Como já existe um pouco o papo de o músico ter que lançar música todo mês. Eu não quero isso, bicho. Eu trabalho com uma coisa que necessita ser lapidada, de aprimoramento e uma certa reflexão sobre o que você está fazendo. Eu não pretendo fazer coisas descartáveis. A gente procura consistência de um trabalho que você confie, não em você atender uma demanda de mercado. Mas, enfim, tempos modernos.

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