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Passarela da Estação Central passa por processo de intervenção

Estação Central
Estação Central
Processo de intervenção na passarela da Estação Central foi autorizado pelo Iphan, pelo Iepha e pelo Comppac (Foto: Fernando Priamo)
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Antes de tudo, é preciso separar as coisas. O prédio da Estação Central servia à Estrada de Ferro Dom Pedro II, que circulava por São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro – na época, em 1875, quando foi inaugurada, a capital ainda era carioca. Por outro lado, o atual Museu Ferroviário diz respeito à Estrada de Ferro Leopoldina, nascida no contexto da expansão do café na Zona da Mata Mineira. Fato é que os dois prédios, com suas semelhanças e pelo contexto histórico ligado à ferrovia, além da localização, pertencem ao complexo arquitetônico da Praça da Estação, cujo nome original é Praça Doutor João Penido, e está vinculada, sobretudo, ao que se depara logo de cara: o prédio da estação, local onde, atualmente, funciona o Associação de Belas Artes Antônio Parreira. Logo ali existe um caminho, uma passagem a outra margem, que leva a outra estação. A passarela, ou passagem de nível, criada para facilitar a circulação em meio ao trânsito de trens, anos mais tarde, em 1928, sofria uma situação de desamparo que, entre outras coisas, dificultava exatamente sua função: o ir e vir. Agora, quem passa por ela percebe seu novo estado: restaurada.

Um prédio ou complexo, no caso do da Praça da Estação, é testemunha de muita coisa. Acaba virando, além disso, um ponto de referência e encontro. “A vida se repete na estação”, já dizia a música de Milton Nascimento com Fernando Brant. Quando inaugurada, ainda no século 19, o contexto era outro. Por causa dela, foi surgindo um polo econômico no entorno que, de certa forma, se mantém hoje. Muitos comícios foram feitos lá, assim como a passeata das “Diretas já”, o movimento contra a ditadura militar, além das histórias pessoais que se repetem. Ser tombado, ou seja, preservar um patrimônio por vias legais, é reconhecer, também, sua importância cultural e histórica.

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Existem três instâncias que atuam diretamente na preservação do patrimônio da Praça da Estação: o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha-MG) e o Município de Juiz de Fora, pela Funalfa, através do Departamento de Memória e Patrimônio Cultural e do Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Cultural (Comppac). Ser ou não tombado nessas instâncias depende da importância e da influência que o bem tem em níveis municipal, estadual e federal. Como a ferrovia foi relevante no Brasil, faz sentido ter sido no Estado e na cidade, o que justifica o reconhecimento pelas três. Mas, ao mesmo tempo, Ana Lewer, arquiteta do Departamento de Memória e Patrimônio Cultural, ressalta: “Isso não é uma regra, porque a gente sabe que o patrimônio cultural é um campo de conflito, então, muitas vezes, nós temos questões políticas, por exemplo, que podem interferir nesse reconhecimento”.

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Processo de tombamento pela comunidade

Para que um bem seja tombado, como Ana explica, qualquer pessoa pode abrir uma solicitação nesses níveis, geralmente a começar pela Prefeitura. “Perante a constituição entende-se que a comunidade é o principal agente capaz de entender aquilo que é importante ou não para a própria comunidade”, esclarece. Para que isso seja feito, o cidadão precisa enviar um protocolo apresentando o bem, com informações gerais e a justificativa de abertura do processo. O próprio departamento pode auxiliar nesse processo. Em seguida, a Funalfa analisa, avisa aos proprietários que está aberta a análise, caso não sejam eles os que pediram o tombamento, e inicia-se uma pesquisa robusta que busca as características e a história daquele bem. Faz-se um dossiê que um relator do conselho analisa por completo. Ele tem a função de resumir as informações e passar para o restante do conselho, que faz uma votação contrária ou a favor do tombamento. Como em Juiz de Fora o conselho é consultivo, cabe ao prefeito analisar e decretar ou não o tombamento. De acordo com Ana, o processo é parecido nas outras instâncias, o que muda, majoritariamente, é a inserção de outros órgãos no processo.

Em nível nacional, a preservação veio através de um lei de 2007 que definiu que todo o complexo que pertenceu à Rede Ferroviária Federal ficaria sob responsabilidade do Iphan. No Estado, o processo foi concluído em 2005, quando o Iepha fez o tombamento do conjunto arquitetônico da Central do Brasil e da Estrada de Ferro Leopoldina. No Município, por sua vez, o tombamento data de 1999.

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(Foto: Fernando Priamo)

Os cuidados necessários

Para Ana, é importante lembrar que o tombamento não significa que o prédio em questão foi desapropriado. “Quando a gente tomba um bem especificamente falando, isso não implica na sua desapropriação: ele continua sendo daquele proprietário, seja ele particular ou público. A obrigação de fazer as manutenções continua sendo de responsabilidade do proprietário, porém compartilhada, porque ele assume um valor comunitário quando é tombado.” Dessa forma, assim como qualquer outro imóvel, um patrimônio material e imóvel precisa de passar por manutenções, sobretudo se tratando de prédios mais antigos. No entanto, esse processo exige cuidados especiais, já que as principais características devem ser mantidas. “Todo processo de intervenção em um patrimônio cultural precisa ter um cuidado. Inclusive na área, a gente nem usa o termo revitalização porque no meio acadêmico esse termo é visto como dar vida a uma área que não possui, e, na verdade, a gente sabe que essas áreas, mesmo que estejam sendo ocupadas de forma precária e subutilizadas, elas possuem vida e funcionamento.”

No caso da Praça da Estação, Ana ainda pontua que ela possui características Neoclássicas. Mesmo que a passarela tenha sido construída anos depois, ela segue essa configuração. Quem fez a intervenção foi a empresa MRS Logística que, como tem uma concessão de parte do trecho da linha férrea, tem também uma parte do complexo da estação. “Por ela utilizar esse trecho, ela também se torna responsável pela utilização e manutenção desses bens”, diz Ana. Para, então, que fosse feita a intervenção, a empresa precisou contratar um escritório especializado em patrimônios para construir o projeto, que envolve tudo o que precisa de reparo e como ele será feito. Logo depois, foi necessário encaminhar esse projeto às três instâncias, que, no caso, aprovaram. Em seguida, uma outra empresa foi contratada para realizar as obras.

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Esse processo foi iniciado em 2019, com a aprovação da União, do Estado e do Município. Em 2021, as obras começaram e foram concluídas em fevereiro de 2022. Carla Costa, coordenadora de Relações Institucionais da MRS em Minas Gerais, entende a importância dessa revitalização em dois pontos: “O primeiro é recuperar um monumento importante para a memória ferroviária local, e que coincide com a história de Juiz de Fora. O segundo ponto é a segurança ferroviária. A passarela, recuperada e revitalizada, é mais uma opção de travessia em segurança da linha férrea em uma região com alto fluxo de pedestres”.

(Foto: Fernando Priamo)

Para não esquecer

Vários outros prédios tombados de Juiz de Fora aguardam esse tipo de intervenção. Como já falou Ana: isso é dever, sobretudo, dos proprietários, mas ela também pontua que outros órgãos podem ajudar. “Existem várias maneiras de isso acontecer, inclusive da própria prefeitura incentivar outras políticas públicas para fazer esse auxílio da preservação. O conselho pode atuar no sentido de fomentar esse pensamento, de propor novas políticas públicas que vão auxiliar. Atualmente, a gente tem o Fundo Municipal de Patrimônio Cultural que pode receber aportes destinados aos patrimônios. Tem também não só os bens materiais, que precisam desse apoio, como também as práticas e os bens imateriais, que, para poderem perpetuar, também precisam ser fomentados.”

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