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Maurício Pereira e Tonho Penhasco apresentam, no Maquinaria, o disco ‘Micro’

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Maurício Pereira e Tonho Penhasco ministram a Oficina de Canções Instantâneas, a partir das 15h, na sexta (FOTO: Biel Basile)
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Maurício Pereira começa a entrevista falando da correria que envolve ser um músico independente. Não como lamento, pelo contrário. Aos 63 anos e com quase 40 de carreira, ele segue confiando na estrada: botando o pé nas vias e apostando nos encontros e no contato – reafirmando laços e fazendo outros. É assim que a vida do músico também faz sentido: na estrada e produzindo – seja novas canções, novos livros ou novos shows (ou nem tão novos assim). As máquinas se mantêm ligadas. No fim da entrevista, ele confessa que poderia ser maquinista, por exemplo, acompanhando a trajetória de sua família ligada às profissões ferroviárias. Tornou-se, no entanto, músico quase por acaso. “Acho que teria sido muito feliz sendo maquinista. Mas o acaso me botou cantautor”. Maquinista, de alguma forma – não a literal – ele é, sim. Constrói e inventa as máquinas-canções que levam a vários lugares: aos amores, às dores, aos gozos, às belezas – ele mesmo elencou esses assuntos, tão comuns em suas canções. Ele e o guitarrista-inventor Tonho Penhasco chegam a Juiz de Fora, nesta sexta-feira (13), no Maquinaria, a partir das 21h, apresentando o disco “Micro”, lançado em 2022. Antes, ele ministra a Oficina de Canções Instantâneas, a partir das 15h. Os ingressos para as duas atividades estão disponíveis no link.

A palavra sempre foi ofício e a canção, intuição. Formado em jornalismo, desde criança Maurício escrevia. “Eu sempre fui muito ligado ao texto”. Não toca instrumentos harmônicos, mas fazia canções ali na cabeça mesmo: um tanto de repertório conquistado desde o nascimento, costume com os campos melódicos e intimidade com as palavras. Depois de ser demitido de um jornal, aos 25 anos passa a encarar a música, realmente, como profissão, quando passou a integrar, ao lado do André Abujamra, a banda Os Mulheres Negras. Mas explicar bem o motivo de ter ido para a música, ele não consegue. “Talvez seja porque eu, nascido em 1959, criado em uma ditadura, em um país semi-analfabeto, sempre achei que o jeito de levar poesia, reflexão, filosofia e história para a população, era a canção popular. Ela e a novela das oito. A música e a novela têm essa possibilidade de fazer chegar filosofia para as multidões”.

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Anos e anos na estrada, depois de Os Mulheres Negras, Maurício apostou na carreira solo – sempre independente. E isso – apesar de dizer que não moldou sua forma de ser músico, porque ele sempre foi livre e, em várias instâncias, ser músico independente é também poder ser mais livre – o acostumou com as adaptações da estrada. Em 2018, ele lançou o álbum “Outono no sudeste”: banda completa. Primeira vez que Gustavo Ruiz, produtor e músico de São Paulo, produz um trabalho seu. Quando se lança um trabalho, no começo, rodar com ele, às vezes, é mais fácil quando se é, por exemplo, “bancado”, como ele diz, seja por um edital ou um financiamento. Mas nem sempre isso é comum. É necessário, então, adaptar o show de um álbum para seguir com pé na estrada. “Eu sempre tentei traduzir o que estava nos meus discos em um formato mais enxuto para cair na estrada, sem perder a qualidade. Eu sempre pensei em como endurecer sem perder a ternura, e eu acho que é até mais endurecer no sentido de estar duro de grana”, ri. E foi o que ele fez. Junto com seu companheiro recorrente Tonho Penhasco, montou um show em duo, mais fácil de se apresentar nos interiores.

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“Micro”, seu disco de 2022, é fruto dessas viagens que ele e Tonho fizeram: é “Outono no sudeste” mais enxuto e, não por isso, menos denso e poético. Eles não tinham pretensão de gravar isso. “Mas a pandemia mudou tudo”. Ele e Tonho, na impossibilidade do presencial, se ligavam diariamente. “Conversávamos sobre tudo.” Inclusive, sobre a possibilidade de registrar esse show e transformá-lo em um álbum. “Um disco que era um trabalho feito para quebrar o galho da produção barata na estrada ganhou corpo, então veio a ideia de gravar também porque eu queria registrar a leitura guitarrística do Tonho”. E, além da guitarra de Tonho, Maurício queria registrar sua voz com a guitarra dele. “Ele deixa muito espaço. E, por isso, eu comecei a cantar de um jeito diferente, a entender as letras de outro jeito, comecei a poder respirar. Então, a poesia deu um pulo”. O repertório não é inédito: ele traz à tona canções que já foram gravadas em outros trabalhos, mas com uma cara toda nova.

Recontar suas histórias livremente

E nem é lá um costume para Maurício revisitar sua obra. “Não é sempre que eu regravo, mas, a partir do momento que, em uma música, eu tento fazer de novo, se eu achar que ela está precisando de uma segunda chance, aí, sim. Às vezes eu acho que eu poderia contar a história melhor”, confessa, reforçando que não é sempre que se chega no estúdio com tanta intimidade tanto com as músicas quanto com os músicos que vão acompanhar o trabalho. No caso de “Micro”, a intimidade era gigante: anos de estrada com Tonho e mais conhecimento de sua própria obra. “Além da mão do Gustavo Ruiz, que me produziu de novo, e que sabe me traduzir tão bem no estúdio”. Ele foi gravado do meio para o final da pandemia. “Uma casualidade fez com que esse trabalho de baixo orçamento virasse um”, ele faz uma pausa. “Preciso confessar: ‘Micro’ (o nome), é a maior conversa fiada. Eu acho que é o meu trabalho mais macro. Na prática ele é enorme”. Tão enorme que a junção entre a voz de Maurício e a guitarra de Tonho faz parecer uma orquestra inteira. “Porque, na mente da gente, o pensamento é muito sinfônico”, justifica.

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E o contraditório é que, por mais livre que seja essa parceria, os shows têm sido mais rigorosos – o que não é comum ver em um músico tão improvisador. “Eu sempre deixei para ver o que acontecia no show, ia com os arranjos prontos, tudo desenhando, e na hora via o que rolava. Mas tocando com o Tonho, como tem muitas possibilidades, eu resolvi mudar isso. Eu queria tocar como se o canto tivesse escrito. E o toque da guitarra tivesse sido escrito. O que, para mim, que sou do improviso, não tem desafio em bater acorde e pirar em cima, e nisso tem. Eu precisava um pouco desse rigor até para a gente se proteger do excesso de liberdade que o trabalho de dois caras muito criativos, muito livres para tocar, pode ter. É engraçado que, nesse disco de dois, que de vez em quando a gente improvisa, a ideia é estar escrito. A força dele vem da emoção que você faz na leitura daquilo. Mais do que na invenção. Quando precisa inventar, a gente inventa. Mas o trabalho é muito em cima do rigor.”

Livre, Maurício sempre foi. Isso, inclusive, para ele, justifica o fato de ele ser músico independente. “Muitas vezes você é independente porque tem um texto poético, uma quantidade de informação que não cabe no comércio do dia a dia.” E aponta que, por outro lado, o comércio exige que a música seja concisa e tenha uma formatação. “Coisa que a gente que é criado na liberdade não sabe fazer. Às vezes não é porque a gente é genial que faz música maluca. É porque é o único jeito que a gente sabe fazer. Eu sou independente porque o tipo de poesia que eu faço me bota no mundo independente.”

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A oficina

Esses atalhos, esse olhar para o cotidiano, essa forma de pensar a música de modo tão intuitivo é um pouco do que ele vai oferecer na sua oficina. “Minha tese é buscar, dentro das pessoas, todo o conhecimento de música, de canção, de frase de canção, de formato de canção, de formato da frase literária, de expressão de sentimento”, explica. Porque, para ele, as músicas já estão no interior porque a gente ouve música desde que nasceu. E Tonho vai estar ao lado dele, harmonizando e sugerindo uma melodia a partir das frases e dos contextos que aparecerem. Para exemplificar, ele fala a frase “Eu vi alguém atravessar a rua”, e prontamente, em seguida, canta essa mesma frase: dá vida às palavras que saem de sua boca salteando. A oficina dura entre duas e três horas. E são os próprios oficineiros, de certa forma, que guiam a dinâmica. “Ela tem uma estrutura. Mas é muito delicada. Muito vai ser da estrutura de quem for. Ainda mais Minas Gerais, que vocês tem uma tradição de canção popular.” E segue: “Minas é demais. Eu piso em minas e eu fico diferente. Eu já sou boi lá”, ri, mencionando sua música “Ser boi”, de “Pra marte”.

 

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