Para uma geração que se comunica com imediatismo a poucos toques, gratuitamente, com qualquer pessoa, em qualquer lugar do mundo, a possibilidade de tomar papel e caneta (ok, talvez digitar no computador), e escrever uma carta para alguém que não a receba no mesmo momento soa mesmo como uma realidade longínqua. “Eles ficaram muito deslumbrados, perguntaram muito. Para eles, o correio era só um lugar de entregar encomendas e contas (risos). Perguntaram se os selos ainda existem e qual é a função deles, quanto tempo demorava para uma carta chegar e como as pessoas aguentavam esperar… É uma realidade muito distante da deles, que já nasceram em um mundo muito tecnológico”, diz a professora Adriana Morais, que viu no projeto “Cartas a JF”, da Tribuna, uma oportunidade de ensinar sobre o gênero textual para seus alunos e alunas do sétimo e oitavo ano da Escola Municipal Professora Thereza Falci, do Bairro Santa Lúcia. “Além da oportunidade de conhecer a carta como meio de comunicação, queria que eles tivessem a experiência de escrever uma pela primeira vez, e a chance de fazer isso pelo projeto da Tribuna, homenageando Juiz de Fora”, ressalta Adriana.
Na Biblioteca Municipal Murilo Mendes, a Escola de Escritores, iniciativa voltada para crianças de 6 a 11 anos em média, também enxergou a proposta da Tribuna como uma oportunidade não apenas para que a meninada se familiarizasse com as cartas, mas também que pudesse enxergar Juiz de Fora sob um prisma mais reflexivo e, melhor ainda, escrever à própria cidade contando sobre a experiência. “Sempre trabalho cartas com eles e já estava preparando a aula com base no livro ‘Correspondência’, do Bartolomeu Campos de Queirós. Quando soubemos do ‘Cartas a JF’, nos antecipamos, e foi interessante vê-los falar sobre ‘antigamente’, quando as avós ou mães escreviam cartas por exemplo”, explica a coordenadora de projetos de incentivo à leitura Margareth Assis Marinho. “E quando falamos sobre a proposta, expliquei que quando saudamos alguém em seu aniversário, falamos sempre do que ela tem de melhor. Então, claro que, quando debatemos Juiz de Fora, os problemas da cidade vieram à tona, mas logo fizemos um exercício de ver o que a cidade tem de melhor, pelos olhos deles mesmos, e aí saíram coisas lindas, desde inusitadas como as capivaras do Paraibuna até a simplicidade na beleza do Calçadão, e sempre um desejo de ajudar a cidade a ser melhor. Foram cartas coletivas, montadas com frases que fui escrevendo em cada turma”, conta Margareth, que realizou a atividade em todos os quatro grupos de pequenos escritores.
Esperança além dos problemas
Segundo Adriana, também foi preciso um trabalho de analisar a cidade entre os estudantes da Escola Municipal Professora Thereza Falci, para que pudessem enxergar além dos problemas do cotidiano. “Eles escutam adultos falando e veem muitas coisas em seus trajetos também: buracos, lugares considerados perigosos, violência… Eu acolhi a fala deles e depois fiz um trabalho de observarmos, em nós mesmos, nossos defeitos e qualidades, eu inclusive. E eles foram falando. Depois, partimos para a cidade, e vi que eles se abriram mais para ver os pontos positivos de Juiz de Fora, as coisas que os fazem felizes por estarem aqui, foi um exercício muito produtivo, muitas me emocionaram e mostraram um senso de pertencimento deles. Foi engraçado que uma dizia “você me viu nascer”, e outra, ao contrário, “você não me viu nascer”, mas ambas expressavam gratidão pela vida que têm aqui e mostravam-se como parte da cidade, e foi algo totalmente espontâneo, não orientei. Mas mexeu muito comigo”, conta a professora.
Para Margareth, o mais tocante foi observar a esperança na nova geração de juiz-foranos – tenham nascidos aqui ou não -, declarada como felicitação de aniversário nos 169 anos que a cidade completa em 2019. “Eles falavam ‘somos crianças, e quando a gente for adulto, vamos trabalhar e a cidade vai ser melhor ainda’, ‘vamos cuidar muito de você e vamos começar agora e juntos’… E também desejando que viessem muitos e muitos séculos de vida, como se a gente fosse viver isso, foi tão carregada de esperança essa fala, tão bonita e verdadeira”, destaca ela, que também se declara para Juiz de Fora. “É uma cidade muito boa de se viver, de se criar os filhos, e acho o máximo a cidade ser este polo estudantil, pulsar educação, isso mantém a cidade viva e jovem. Juiz de Fora respira juventude e alegria de viver, apesar dos 169 anos!”.
A professora Adriana Morais, que também se impressionou com o resultado da atividade com as turmas, de estudantes entre 12 e 13 anos, revela que a iniciativa também a fez refletir sobre a sua própria relação com a cidade. “Uma que achei muito interessante foi a que tratou Juiz de Fora como uma pessoa, uma senhora. E fiquei pensando que aqui também vivi do choro ao riso. Do choro de sair criança de Cataguases, onde nasci e vivia até então, ao riso de ter conquistado uma vida, uma profissão, amigos e muitos momentos felizes ao longo da minha vida aqui nessa cidade.” Confira:
- Cartas escritas pelos alunos da Escola Municipal Professora Thereza Falci
- Cartas escritas pelos alunos do Projeto Escola de Escritores da Biblioteca Municipal Murilo Mendes