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Exposição apresenta 100 anos da história da arte de Juiz de Fora

Arte Juiz de Fora
Arte Juiz de Fora
André Colombo assina a curadoria da mostra “Coleções conectadas” (Foto: Felipe Couri)
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Nesta quinta-feira (11), a Galeria RH Espaço Arte inaugura, a partir da mostra “Coleções conectadas”, um passeio por 100 anos da arte de Juiz de Fora. Com curadoria do historiador e pesquisador André Colombo e produção de Ione Ribeiro, as obras selecionadas ficarão expostas até o dia 27 deste mês. O espaço – localizado na Alameda Engenheiro Gentil Forn 1.805, segundo piso, Morro do Cristo – fica aberto de segunda a sexta-feira, das 13h às 19h, e, aos sábados, das 8h30 às 12h30. A entrada é gratuita.

André, natural de Rio Novo, chegou a Juiz de Fora para estudar, no começo dos anos 2000, com uma série de questionamentos e curiosidades sobre a arte da arte. Na bagagem, trazia obras de Sylvio Aragão, artista que tinha ligação com sua família. Aos poucos, começou a desenrolar os fios dessas histórias e, agora, depois de se debruçar em trabalhos de diversos artistas da cidade, faz como uma cartografia do que eles foram e representaram em seus momentos, mas, principalmente, para a cena atual. Nesses 100 anos demarcados pela “Coleções conectadas”, nota-se, inclusive, lacunas e contextos ainda pouco explorados.

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Essa viagem, como André conta, começa com os acadêmicos dos anos 1920. O primeiro deles é César Turatti. “Ele foi um dos primeiros professores de pintura de Juiz de Fora. Vários que chegaram aos anos 1970 e 1980 pintando, foram alunos dele entre 1920 e 1930. Turatti é o nosso mestre mais antigo e maior aqui. Ele forma os artistas que fundaram a Associação de Belas Artes Antônio Parreiras depois”, explica o curador.

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Mas, antes de chegar na associação, tem ainda dois estrangeiros que se apresentam fundamentais nessa história: Angelo Bigi e Katarina Zelentzeff. Enquanto Bigi é condecorado na cidade, Katarina foi, por um tempo, esquecida da história. E os motivos são alguns. Mas, o principal, segundo Turatti: ser uma mulher que vive de arte.

“Nessa época, por exemplo, a mulher nem podia frequentar a Parreiras. Ela, nas brechas, foi professora fora e só nos anos 50 que consegue, de fato, desfrutar da associação. Eu tive preocupação de achar as mulheres da história da pintura de Juiz de Fora. A Katarina, a Nivea Bracher e a Adriana Pereira estão presentes na mostra. Eu fiz isso porque o espaço da arte ainda é muito masculino. Mas não porque não tem mulheres artistas, mas porque elas não foram legitimadas pelos espaços.”

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A história contada em “Coleções conectadas” continua com os artistas da Antônio Parreiras que venceram o Salão Nacional de Belas Artes. Juiz de Fora, como conta André, é a cidade brasileira com o maior número de vencedores deste prêmio e que tiveram a oportunidade de ir para a Europa, por dois anos, estudar pintura. Foi o caso de Jaime Aguiar, Edson Motta, Inimá de Paula e Carlos Bracher. Este último só não participa da exposição porque o recorte escolhido foi apresentar pintores que já faleceram.

Mudanças

Depois, entra em cena um outro momento a partir de Frederico Bracher: “Um trio que vai ser referência para toda uma família que muda a história da pintura em Juiz de Fora, com o estabelecimento de um grande grupo de artistas”. Incialmente, esse grupo atua dentro da Antônio Parreiras. “Mas acontece uma ruptura. A associação se mantinha academicista. E esses artistas estavam em busca da modernidade. Nessa ruptura, surge o Grupo de 57. É um grupo que rompe com a arte acadêmica e vai tentar praticar uma pintura mais independente e dentro de uma percepção moderna de arte. Eles vão para o Castelinho dos Bracher e lá se estruturam para abrir a Galeria de Arte Celina, que foi muito importante para a cidade.”

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Esse movimento que se concretiza em 1957, no entanto, já apresentava, a partir das obras, alguns indícios de mudanças. Já nos anos 1950, por exemplo, Sylvio Aragão produzia uma pintura que não era acadêmica e tinha flerte com o modernismo. Ele, inclusive, participou da primeira Bienal de Arte Moderna. “Era uma figura mais solta e livre, mesmo antes do movimento do Grupo de 57 se instaurar.” Outra figura importante, também desta época, foi Renato de Almeida. Ambos, mesmo dentro da Antônio Parreiras, romperam com o academicismo.

A fase modernista fica ainda mais forte com Roberto Gil, artista que, naquele momento, se apresenta ainda como um líder. “Por ser o mais velho do movimento de 57, é o artista que vai influenciar muito o grupo dos Bracher. Eles começam a pintar praticamente todos juntos, mas o Roberto Gil já tinha uma carreira de escritor, crítico, com uma formação mais sólida, ligação também com poesia e música, que já tinha uma bagagem, e os mais jovens eram todos artistas iniciantes e que herdam muito dele em termos de linguagem”, conta André.

Dessa leva, estão representados em “Coleções conectadas” nomes como Renato Sthelling, Heitor de Alencar, Dnar Rocha e Nívea Bracher. É possível identificar, nesse contexto, uma série de semelhanças que ficam ainda mais nítidas quando as obras são coladas de forma aproximada. Um desses exemplos é o contorno preto mais forte, presente na maioria das obras desses artistas e que se torna uma característica reconhecida da história da arte de Juiz de Fora. Até então, todas essas obras tinham as vanguardas europeias como referência.

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Exposição promove um passeio pela arte juiz-forana, começando nos anos 1920 até os contemporâneos (Foto: Felipe Couri)

Outro momento da arte de Juiz de Fora

Já em um outro espaço, os contemporâneos são apresentados e há, nitidamente, uma ruptura de estilo. Agora, a referência, como aponta André, é da arte americana, abstrata e geométrica. Nomes como Ruy Merheb, Leonino Leão, Arlindo Daibert e Adriana Pereira ocupam esse espaço. “São artistas que influenciaram muito e deixam seus discípulos na cidade.” Ruy, por exemplo, fez parte do Grupo de 57 mas ocupa outra sala porque rompe com aquele modernismo e avança para a arte abstrata. “Junto com ele, Arlindo Daibert, que vai fazer relação forte das artes plásticas com as letras, imagens e palavras, o texto. Ele é o representante de um grupo grande de artistas que estão produzindo até hoje”, acredita o curador.

Questionamentos que se instauram

A exposição foi pensada de forma cronológica exatamente para dar conta dessas rupturas e essas mudanças: “A parte acadêmica, a modernização do Grupo de 57 e, depois, a chegada da arte contemporânea. O objetivo foi mostrar esse panorama”. Mas fazer isso é também conseguir observar, de forma clara, as lacunas. “Essa exposição, principalmente a partir das ausências, provocou outras (exposições) necessárias. Pensar as presenças e também quem está entre nós. Tem muita coisa para se trabalhar.”

E André cita uma série de artistas que não foram expostos por um outro motivo: por se tratar de uma exposição feita a partir de coleções privadas, algumas obras não foram encontradas ou não estavam disponíveis. E é por isso que mais possibilidades surgem.

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André ainda pensa nos artistas de hoje e na falta de espaço que se instaura. Em 20 anos, como cita, cerca de cinco galerias foram fechadas. “É por isso que a gente abre espaço para os novos mas também mostra que existe uma história da arte na cidade que precisa ser reconhecida. Fazer essa conexão é um trabalho longo. A galeria não pode ser mais um recurso de exclusão, mas, sim, discutir as exclusões”, finaliza.

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