O imóvel em que funcionava o Cine Rex, no Bairro Mariano Procópio, está sendo demolido. No espaço, na Rua Doutor Duarte de Abreu 58, funcionou o cinema de bairro mais longevo de Juiz de Fora, entre 1925 e 1979 — foco de memórias de centenas de juiz-foranos que frequentavam o local. A autorização da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) para a demolição, concedida pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Cultural (Compacc) e com alvará da Secretaria de Desenvolvimento Urbano com Participação Popular (Sedupp), foi feita em uma reunião no dia 7 de abril, em que essa pauta não constava no chamamento divulgado no Ato de Governo. De acordo com informações da Funalfa, não havia pedido pelo tombamento do imóvel e ainda não se sabe o que será feito no local.
Durante o funcionamento do Cine Rex, ele foi regido pela Companhia Central de Diversões. De acordo com relatos coletados pelo projeto Cinemas de Rua de Juiz de Fora, que faz parte do Grupo de Pesquisa Comunicação, Cidade e Memória da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), em 2023, a proposta do local era atender o público popular, que não precisava mais ir até o Centro para assistir às produções cinematográficas. Na época, era feita uma exibição de filmes por dia, com poucos horários.
A professora e doutora Christina Musse, que fica à frente dessas discussões no grupo, entende que, para além da importância local, é impossível pensar o século 20 sem as salas de cinema. “Elas eram responsáveis pela sociabilidade entre as pessoas, era um ritual social e revelavam um aspecto da nossa subjetividade. As imagens a que assistimos e os sons que ouvimos dentro das salas de cinema mudaram a forma com que víamos o mundo”, destaca.
O espaço foi desativado em 1979, mas o prédio continuou existindo e recebendo alguns bailes. A trajetória do Cine Rex faz parte de um caminho em comum que esses espaços acabaram sofrendo: “Essas salas já estão fechadas há muito tempo porque a maneira como assistimos aos filmes mudou, e acho até que isso é irreversível. O que sempre me incomoda muito é que não há uma identificação desses lugares por meio de placas ou um debate maior sobre como preservar esses espaços. São décadas de história”, diz Christina.
Os responsáveis da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) explicaram que a pauta referente à demolição foi incluída durante a reunião do Comppac a pedido dos membros, o que é previsto e pode ocorrer conforme a dinâmica dos encontros, e por esse motivo o tema não constava no chamamento prévio. As decisões do Comppac não são publicadas nos Atos do Governo, constando exclusivamente nas atas das reuniões, que não foram assinadas e publicadas para o público.
O fim dos cinemas de rua
Outros cinemas de rua em bairros de Juiz de Fora, como é o caso do Cine Benfica, Cine Brasil ou Cine Paraíso, fecharam suas portas bem antes da chegada dos anos 2000 — os dois primeiros, inclusive, antes mesmo do Cine Rex, enquanto o último ainda foi alvo de tentativas de reabertura ao longo dos anos 1980. O que a professora enxerga, portanto, é uma falta de interesse público na preservação desses espaços. “Esses cinemas fazem parte de um patrimônio da cidade pelo qual as pessoas ainda se interessam e discutem na academia. Se exibissem filmes, em sessões menores, também seria uma forma de se ter a experiência do que foi esse hábito tão importante do século passado”, diz.
Com a chegada do polo audiovisual na cidade, ela enxerga que isso só poderia ser feito por iniciativa do poder público ou de uma empresa privada com esse interesse. “Acho difícil que esse cenário seja mudado. Mas a minha esperança é de que, como já foi discutido em outras administrações, sejam reativadas ao menos algumas sessões no Cine-Theatro Central”, fala sobre o espaço que, apesar de tombado, já não funciona como cinema.