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Outras Ideias com Sandro da Silva, Cosme Nascimento e Polyana dos Santos

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O que você faria se ganhasse na Mega-Sena? Talvez a pergunta seja fácil demais. Planos, muitos planos. Dificultarei, então: E se não ganhasse? Vendendo pulseiras, colares, brincos, esculturas, bolsas e outros acessórios feitos à mão, três jovens artesãos decidiram não esperar, escolheram viver o sonho no presente. Poly Dreads, Pataxó do Sertão e Sandro assumiram um estilo de vida que os permite comercializar suas criações no Parque Halfeld e também nas mais belas praias do Nordeste. “Todo mundo quer ganhar na Mega para viver viajando, e a gente faz isso”, ri Polyana dos Santos, a Poly Dreads. “A vida do hippie é a melhor, é livre. O que a gente ganha dá para sobreviver, pagar as contas e viajar”, conta Pataxó, nascido Cosme José do Nascimento.

Diante de mim, uma comunidade que se insere no vaivém da vida veloz, sem dela comungar. Se chove, eles se escondem em marquises. Se faz sol, aproveitam para vender. Se não há dinheiro, adaptam-se com o que tem. É uma vida segura?, pergunto. “A vida não é segura”, responde, imediatamente, uma Poly tão lúcida quanto desapegada. “Nem tudo é dinheiro, Deus não deixa faltar nada para a gente”, completa. E não lhes faltam celulares, computadores, confortos contemporâneos. “Os malucos hoje em dia estão modernos”, brinca ela. Loucos? O que esse trio faz entender é justamente o contrário. Mostram que, na verdade, Machado de Assis estava certo ao escrever “O alienista”, apontando a fragilidade em se localizar a loucura. Não seria a sociedade maluca ao aguardar a fortuna para realizar seus sonhos?

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Poly: mãe dos dreads

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O futuro preservava uma trajetória linear para Polyana Cristina Ribeiro dos Santos, 31 anos: seria uma profissional estável, casaria e teria filhos. Ela estava no caminho, trabalhava, estudava filosofia, mas trancou, fez artes e resolveu não insistir. “Meu primeiro emprego foi na rodoviária, tirando fotos de quem estava desembarcando para fazer chaveiro. Quando aprendi a fazer artesanato, nunca mais quis saber disso”, conta a juiz-forana nascida no Monte Castelo. Filha de pais evangélicos, saiu de casa quando viu que suas escolhas geravam confronto. Foi para Ouro Preto, “sem ter dinheiro para a passagem” e passou um mês por lá. “Passei por uma época na qual abri mão de tudo. Não dormia em casa, mas de mocó (na gíria hippie, sem abrigo, na rua) no alto da Halfeld, no último bar. Fiquei uns anos morando na rua e viajando. Quando engravidei, mudei tudo, só não larguei o artesanato”, recorda-se, referindo-se aos dois filhos que tem com Pataxó, que conheceu em 2006 e com quem mora no mesmo bairro da família. No ano passado, depois de juntar uma grana, foi ao reencontro da família do marido, na Bahia, ao lado dos dois filhos e – surpreendentemente – da mãe. “Falamos para ela: se quiser ir, vai do nosso jeito”, conta. A auxiliar de escritório Carmen topou e, até, entrou no clima. “Ela chegou um dia a pegar minhas pulseiras e ir vender para comprar brinquedo para as crianças”, lembra Poly, que aprendeu a ser livre e, principalmente, a ser mãe.

Pataxó: sertanejo andante

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Nascido onde “o sol frita ovo”, no Morro do Chapéu, cidadezinha baiana, na Chapada Diamantina, Cosme José do Nascimento, 35, que formou com Poly uma nova família, despediu-se ainda na adolescência dos pais e dos 12 irmãos. “Saí para São Paulo para trabalhar no corte de cana, com um amigo do meu pai. Quando chegamos lá, perdemos tudo, e fiquei perdido. Fui morar em Piracicaba, conheci os malucos, mostrava meus trampos de couro, e eles me ensinaram a fazer os trampos com arame. Eles falaram: se vira com isso! E eu comecei, fui me criando, viajei para o Pantanal e não parei mais”, conta ele, que aprendeu a manusear o couro com a família que produzia sela para cavalos. Depois de rodar o país – “Já fui para tudo quanto é lugar. Amazonas, Alagoas, Mato Grosso, Sergipe, Natal, Jalapão. Esse Brasil é pequenininho para nós”, diz -, escolheu Minas. “Em 2006, fui para o Rio no show dos Rolling Stones e passei aqui primeiro. Falei: Quer saber?! Essa cidade é onde vou ficar”, lembra Pataxó, como é conhecido pela semelhança com os índios. Nos preparativos para passar o verão na paulista Maranduba, como sempre faz, ele quer mesmo é conhecer a Califórnia.

Sandro: o encantado

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Na primeira viagem que Sandro Roberto da Silva, 36, fez, Pataxó estava. Contrariando a família, segundo ele, de pessoas muito trabalhadoras, Sandro abandonou a formação em eletromecânica pelo CTU, o trabalho num escritório de advocacia e resolveu, há dez anos, viver da forma como faz, que só de contar lhe enche os olhos de um brilho incomum. “Comecei a conversar com os hippies no Parque Halfeld. Sempre gostei e, quando comecei a aprender o artesanato, me envolvi, larguei tudo e passei a viver disso”, recorda-se. A tal viagem, para Búzios, acabou durando quatro anos. “Conheci boa parte da Venezuela, Colômbia, Equador e Peru. Fui a praias do Caribe, de Santa Marta, de Cartagena, vi outras culturas”, diz ele, que também conheceu a esposa Jéssica, com quem tem um filho de 5 anos e uma menina de 3 meses. “No começo, o preconceito é muito grande. A galera acha que você está virando mendigo. A gente desapega, se liberta e pode viajar”, comenta ele, que veio há alguns meses visitar a mãe e fazer o parto da mulher, mas logo deve partir. “Hoje faltam só cinco estados para eu fechar o Brasil”, responde quando perguntado sobre seus próximos passos. Como fará? Não sabe. Não carece de projetos, nem muito dinheiro, me diz. “Ninguém precisa de muito para viver.”

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