
O autor juiz-forano Ulisses Belleigoli lança “Soluço”, seu terceiro livro de poesia, na quinta-feira (7). O evento ocorre às 19h no bar Reza Forte, localizado no Jardim Glória. Em uma modalidade diferente, ele irá de mesa em mesa lendo poemas escolhidos pelos próprios leitores.
“Soluço” integra o 18º lançamento literário dos escritor, que também é jornalista e psicanalista. Ulisses já passou por eventos relevantes da literatura nacional, como a Feira do Livro, realizada em Pacaembu (SP) e a Festa Literária Internacional de Paraty (FLIP), no Rio de Janeiro. Seis de suas obras foram publicadas por meio da Lei Murilo Mendes de incentivo à cultura.
Tribuna: Como nasceu “Soluço”? Qual foi o estalo inicial que o levou a reunir esses poemas?
Ulisses Belleigoli: “Soluço” nasceu justamente do olhar para um grupo de poemas que pareciam ter algo em comum. Mexendo em meus textos mais recentes, identifiquei que havia ali uma temática, um grupo de sentimentos que diziam a mim mesmo coisas importantes. Quando percebi isso, começou a nascer um projeto de publicação. Quanto à escolha do nome, o soluço é uma reação que precisa, ou pelo menos permite-se, ser lida. Não pode ser tomada como óbvia. Soluçamos quando estamos empanturrados, quando estamos famintos, quando estamos chorando.
O livro é dividido em duas partes: “Fastio” e “Fome”. Como você pensou essa estrutura e o que ela revela sobre o seu eu-lírico?
O livro já nasceu assim dividido, pois eu fui separando os poemas que já estavam escritos nessas seções. O nome das partes foi tirado de um dos poemas (“Plurais”). Os outros, à medida que foram sendo escritos, já tinham endereço certo. Acho que brincar com esses possíveis opostos foi uma tradução do que eu venho experimentando neste último ano, que é a recuperação de um desejo de ambiguidade, uma marca muito presente lá no meu primeiro livro, publicado em 2006. Apesar da diferença de tom entre as duas seções, há uma relação entre desilusão e entusiasmo; e ambos estão ligados à nossa relação com o desejo – mas, aqui, acho que é o psicanalista falando. Acho que, talvez, a metáfora da comida possa ser mais precisa nessa resposta: é muito fácil transitar da ideia de fastio para a de fome, e vice-versa.
O formato do lançamento é bem inusitado, já que você vai passar de mesa em mesa lendo poemas escolhidos pelos leitores. O que o levou a propor essa dinâmica mais intimista?
Eu já fiz muitos lançamentos na vida. E, depois de um tempo, comecei a me perguntar: como eu e meus leitores podemos aproveitar melhor esse momento? E aí, cada livro, cada época, cada espaço responde de maneira diferente. Como estaremos em um bar, eu pensei em deixar o bar ser o bar, com todos as suas delícias, e tentar esgueirar as palavras ali no meio. Afinal, no bar nascem muitas das ideias mais poéticas e mais revolucionárias da vida contemporânea, não é? Por que não brincar com isso? E, assim, aproveito eu também o momento, conversando com os convidados/leitores , ao invés de ficar atrás de uma mesa sozinho autografando.
Que tipo de leitura você espera provocar com “Soluço”?
O “Soluço” já vem provocando muitas leituras. Ele é um livro que gera incômodos insólitos e comichões gostosinhos. Como ele foi lançado em São Paulo, já tenho colhido, via mensagens dos leitores e postagens nas redes sociais, algumas impressões. É claro, cada leitor é afetado de um jeito. Mas tem alguns poemas que não têm passado despercebidos pelos leitores, como o “Cidadela infame”, que é um ‘eXculacho’ no Rio de Janeiro, uma cidade geralmente louvada e cantada por sua beleza, e o “Sobre as derrotas”, que parece comunicar de maneira muito simples algo muito abrangente.
Você já passou por eventos importantes, como a Flip e a Feira do Livro no Pacaembu. Como é trazer esse lançamento para Juiz de Fora, sua cidade?
Esse livro fala, entre outras coisas, sobre as cidades. E Juiz de Fora é um dos amores da minha vida. Estou morando em São Paulo há mais de dois anos, e a saudade ainda não se aquietou. Então, sempre que tenho a oportunidade de estar aqui, a alegria se instala. Lançar um livro em Juiz de Fora é sempre um bálsamo pra mim. Há 20 anos faço isso, e continua sendo muito bom. Para quem for ler um livro, uma brincadeira: a cidade de Juiz de Fora aparecia no livro, no poema “Paraísos”, mas depois, por razões poéticas, foi trocada, vejam só, pelo nome da cidade de Porto Seguro. Juiz de Fora é isso para mim.
“Soluço” é o seu terceiro livro de poesia, mas o 18º da carreira. O que esse livro tem de diferente dos anteriores? Já tem novos projetos em vista?
Ele representa uma passagem. O “Soluço”, para mim, é um portal. Eu passei por ele como que numa transformação. Estou em um momento inédito da minha vida e acho que isso escorre pelas páginas. Para os leitores, não sei bem qual será a diferença visível com relação às outras obras. Não sei se isso será importante para eles. Mas agora eu estou curioso. Além disso, eu estou trabalhando em dois projetos de prosa: um livro de contos e o segundo volume da tetralogia “Escritos para Etraz-Quaassa”. Ambos devem sair em 2026. Nesse tempo, volta e meia, um poema pula no meu colo. Vão se somando. As minhas publicações de poesia sempre surgem assim, no meio dos outros projetos, furando fila. Ah, tenho um projeto muito legal na área de literatura, que está saindo pela Varanda Editora, que é um clube de leitura no qual homens vão ler apenas autoras mulheres. Ele já começa agora em agosto.
Você se define como “natural da prosa, mas fluente em poesia”. Como é transitar entre esses dois modos de escrita? Há um que exige mais?
A prosa é meu lugar mais experimentado, onde eu sinto também que nasceu e se nutriu o escritor. Os projetos que me ocupam durante anos são os romances, os contos, as histórias. A poesia, contudo, habita minha vida de leitor desde sempre. Eu amo ler poesia, amo dizê-las em voz alta. Depois que comecei a escrever poemas, nunca mais parei. Mas, até neles, vejo a marca da prosa, até mesmo uma tendência narrativa. Decerto, os poemas exigem mais de mim, porque eles sempre chegam sem avisar e, depois de esboçados e escritos, continuam me provocando por muito tempo, mesmo depois de publicados.
Quais autores o influenciam hoje? E quais os novos nomes da literatura contemporânea você tem lido?
Na poesia, minhas principais influências são bem brasileiras e mineiras: Marília Garcia, Ana Martins Marques, Laura Assis e Adélia Prado. Acho que, talvez, todos nós estejamos muito influenciados por esses grandes nomes da poesia nacional, né? Na prosa, neste momento, tenho lido muita ficção científica: Orson Scott Card, Ursula K. Le Guin e, recentemente, amei o romance de estreia de uma autora juiz-forana, a Ana Clara Loureiro, chamado “Órion” – uma ficção científica que me impactou em muitos níveis – talvez até haja vestígios dessa leitura em “Soluço”. Também tenho lido, e sido influenciado por, muitas obras escritas por autores do universo LGBTQIAPN+, como João Silvério Trevisan, Cidinha da Silva, Marina Monteiro, Akwaeke Emezi, Amara Moira, Vinicius Grossos, entre outros. E eu estou sempre – sempre mesmo! – lendo meus colegas de Juiz de Fora, que são muito bons. Acho importante dizer isso, pois muita gente acha que a literatura de ponta está só no grande mercado, e algumas das coisas mais lindas que eu já li na vida foram escritas por conterrâneos. Então, bem na minha cabeceira, neste exato momento, tenho agora o João Pedro Rattes Scaldini, a Prisca Augustoni – que é sim nossa conterrânea, apesar de Suíça – e a Monica Hortegas. Mas em termos de influência, acho que minhas principais aqui na cidade são a Maria Bitarello, o Tarcízio Dalpra Jr., Felipe Moratori e a Laura Assis.
Como você percebe a recepção da poesia hoje, num tempo tão apressado e saturado de informações?
Eu acho que a poesia é menos lida no contexto do mercado editorial, mas é inegável que tem leitores apaixonados. Nos eventos de poesia, é lindo ver como as pessoas se relacionam com os poemas e como se deixam afetar por eles. Que há algo da economia, na brevidade do poema, que é paradoxalmente oposta à correria e à algaravia dos nossos dias. Essa própria unidade, que é o poema, é muito misteriosa. Se você perguntar quantas pessoas leem regularmente poesia, vai encontrar muito poucas. Mas quase todo mundo tem um poema preferido. Isso é lindo demais, principalmente para quem os escreve. Alguém pode desconhecer toda minha obra, mas ter um poema meu pregado sobre a cabeceira. É a magia das palavras rearranjadas, que pedem lugar; e há quem o dê. Os poemas encontram seus amantes.
*Estagiária sob supervisão da editora Gracielle Nocelli
Serviço
Lançamento do livro “Soluço”
Data: 7 de agosto (quinta-feira)
Horário : 19h – 23h
Local: Reza Forte (Rua Dr. João Pinheiro, 356 – Jardim Glória)
Entrada franca