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Murilo Mendes será tema da 7ª edição do Acesso Arte Contemporânea

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“Onde nossas certezas viraram incertezas de nossas certezas…”, obras de Petrillo que fazem parte da mostra, foram inspiradas no poema “A flecha”, de Murilo Mendes (Foto: Divulgação)
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A artista e curadora Marilou Winograd, 65 anos, visitou o Museu de Arte Murilo Mendes (Mamm) há dois anos. Era acompanhada pelo artista visual Petrillo, 45. Quando descia as escadas, Marilou se deparou com o aforismo “Sentado à beira do tempo/Olhando o meu esqueleto/Que me olha recém-nascido/Tenso espírito do mundo, vai destruir e construir/Até retornar ao princípio/O motor do mundo avança.” Com os olhos marejados, ela então parou. “Foi um apaixonamento. Fiquei realmente emocionada”, relembra. Tão emocionada que Marilou se virou para Petrillo e disse que queria fazer algo sobre Murilo Mendes (1901-1975). “Uma semana depois, estávamos com o projeto estruturado.” Tal projeto é uma interseção entre a obra de Murilo Mendes e 57 artistas visuais de Juiz de Fora, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, São Paulo, Curitiba, Porto Alegre e Lisboa. Entra em cartaz nesta quarta-feira, no Centro Cultural Correios, no Rio de Janeiro.

O primeiro verso do aforismo, inclusive, dá nome à exposição, a sétima do projeto Acesso Arte Contemporânea – edições anteriores já abordaram, por exemplo, obras de artistas como Marcel Duchamp, Man Ray e Flávio de Carvalho. “Cada artista escolheu um poema, um verso, um aforismo ou um pensamento de Murilo Mendes para contextualizar a própria obra visual, ou seja, trabalhar em cima do material escolhido. Não é descrevê-lo, mas conceituar o porquê da escolha”, explica Marilou. Além da artista, a curadoria está a cargo de Gilda Santiago e Aline Toledo. A mostra reunirá 64 obras bi e tridimensionais entre pinturas, desenhos, gravuras, fotos, colagens, esculturas, objetos, vídeos e performances. O texto crítico é do escritor e ensaísta Silviano Santiago.

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A mostra reúne artistas contemporâneos, alguns já com trajetória internacional, carreira estabelecida, pontua Marilou. Outros estão apenas começando. “Queremos sempre abordar todo o leque. Não compartimentar.” O critério é reforçado por Petrillo, curador convidado para os artistas mineiros. “Privilegiamos artistas da nova safra”, detalha o artista visual e professor. “Alguns artistas já são ‘velhos de guerra’, mas há muitos da nova geração, como Francisco Brandão, Lucas Soares e Pedro Hugo Vilanova. É interessante termos tanto a diversidade etária quanto estilística.” Dentre os 57 artistas reunidos pela mostra “Sentado à beira do tempo – A poética de Murilo Mendes”, nove são de Juiz de Fora. Além de Francisco, Lucas e Pedro Hugo, participarão o próprio Petrillo, Fabrício Carvalho, Fernanda Cruzick, Júlia Vitral, Nina Melo e Ricardo Cristofaro – este último, superintendente do Mamm.

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As obras dos artistas, a obra de Murilo

A curadoria foi longa, segundo Marilou. A intenção foi fazer um convite aos artistas para saírem da zona de conforto ao trabalhar a partir dos conceitos de outros pensadores. “O público, primeiramente, vai conhecer quem era Murilo Mendes. De repente, o público carioca em geral pode não conhecer a figura. Depois, conhecer partes e trechos da obra do Murilo. Cada obra terá na etiqueta a poesia, o verso ou o aforismo escolhido e o texto do artista justificando a opção por aquela obra.” A mostra privilegiou artistas que tivessem interesse na poesia. Pessoas cuja obra tivesse uma questão lírica ou até mesmo política relacionada a Murilo. “Ou que não tivessem questão alguma, mas aceitassem sair de sua produção para entrar em outro olhar para contextualizar sua obra de outra forma.” A curadora, inclusive, participará da mostra enquanto artista. “Estamos ampliando tanto o universo das artes visuais quanto o universo do Murilo Mendes, que, inclusive, era um grande crítico de arte.”

O título da exposição, “Sentado à beira do tempo”, verso da poesia “A flecha”, dialoga com a pandemia, afirma Marilou. “O planeta inteiro está sentado à beira do tempo vendo os esqueletos. Enquanto isso, o motor do mundo destrói e reconstrói até voltar ao começo.” Mas, como ela mesma acrescenta, o projeto foi deflagrado quando ainda não havia qualquer pandemia. “Tinha a ver com a sobrevivência como um todo, de que somos todos sobreviventes. Mas, ao mesmo tempo, aprender a ser nossos contemporâneos, o que é um processo de construção constante. O título foi escolhido pré-pandemia, mas tem tudo a ver. Isso é maluco.” Murilo Mendes é justamente um dos expoentes do surrealismo do movimento modernista.

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Aberta ao público
Diferente de Juiz de Fora, exposições presenciais estão permitidas no Rio de Janeiro. A abertura de “Sentado à beira do tempo” no Centro Cultural Correios (Rua Visconde de Itaboraí 20 – Centro) será nesta quarta-feira (5), às 16h. Mas a mostra se estenderá até 20 de junho, das terças-feiras aos domingos, de meio-dia a 19h. A ideia inicialmente era inaugurá-la em Juiz de Fora, justamente no Mamm, como revela Marilou. “A nossa data era março de 2020 (quando as primeiras medidas de restrição sanitária entraram em vigor). Mas ainda está agendada. Somos a primeira exposição marcada após a reabertura do Mamm. Provavelmente, ficará apenas para o segundo semestre. Tínhamos apresentado a proposta em 2019 para o superintendente do Mamm, Ricardo Cristofaro, aliás. Ele adorou, porque havia artistas de todo o país.” Após a reabertura dos espaços culturais no Rio, o Centro Cultural Correios ofereceu o local para sediar a mostra.

A flecha

O motor do mundo avança:

Tenso espírito do mundo,
Vai destruir e construir
Até retornar ao princípio.

Eis-me sentado à beira do tempo
Olhando o meu esqueleto
Que me olha recém-nascido.

Belas mulheres que amei
Ensaiam o vestido de terra
Para o sono familiar
Na pedra que não se move.
O motor do mundo avança.

Murilo Mendes

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