O mineiro Filipe Alvim sequer tinha sua guitarra stratocaster azul clarinha quando começou a compor, e os poucos acordes que vinham em sua cabeça fazem com que seja ainda mais notável sua produção musical que já esbarra no terceiro disco, desde o lançamento de “Zero” em 2013 e “Beijos” em 2016. Para antecipar o “Tudo pode acontecer” (inclusive nada, brincam os integrantes), o selo Pug Records e a plataforma database.fm disponibilizaram esta semana o single “Chiclete”, feito em parceria com a compositora curitibana Samira Winter, radicada em Los Angeles, nos Estados Unidos.
O que Filipe tem de sobra são boas ideias de letras e um hype intrínseco aos clipes, músicas e performances ao vivo que estão cada vez mais enlouquecidas. Everton Lorié e Pedro Tavares revezam-se entre o baixo e as guitarras solos (uma telecaster vermelha). Everton também faz os sintetizadores que agora são imprescindíveis na estética oitentista, eletrizante e dançante do novo trabalho. Filipe gosta de estar com os braços livres para remexer enquanto canta sem se preocupar tanto em atingir as notas perfeitas, mas faz as bases nas guitarras de quase todas as músicas, com exceção do single “Chiclete”, quando assume o baixo para os sintetizadores preencherem toda a ambiência ruidosa do single. Completando o quarteto, Thales Scoton e sua bateria afinadíssima “groova” de forma precisa, dando ritmo e movimento às músicas do compositor indie “hitmaker”.
“Chiclete” foi a escolhida para single numa tentativa infalível de fazê-la grudar na cabeça das pessoas, não por acaso o nome da música revela essa intenção de maneira explícita. Se a melodia gruda como chiclete é o que vamos descobrir até o lançamento de “Tudo pode acontecer”, previsto para julho de 2018. No entanto, não perdem tempo e prometem um show com o novo álbum sendo tocado na íntegra na tarde deste domingo, 6, na Agência, em Juiz de Fora.
A banda de Filipe Alvim tem se esforçado ao máximo para sair pelo Brasil, há pouco tempo estiveram no Rio de Janeiro e na semana que vem já pegam voo para Goiânia, onde farão uma apresentação dia 9 no estimado Festival Bananada, que reúne Lee Ranaldo (guitarra/voz Sonic Youth), além de Gilberto Gil, Nação Zumbi e uma lista infinita de grandes nomes da nova música brasileira, do MPB ao rock’n’roll e tudo misturado. Aproveitando a ida ao Centro-oeste, integram a line-up do Trú Festival em Brasília, que rola dia 12 de maio. Depois o quarteto para em São Paulo, a cidade onde a cena brasileira indie rola 12 horas por dia (de meia-noite às 6h) para duas apresentações, uma no Estúdio Mameloki e outra no Breve Pompeia, nos dias 18 e 20, junto à Virada Cultural Paulista, que acontece neste mesmo fim de semana.
A capa é uma foto da instagrammer @juliavrgn
Conexões extrabrasileiras
O que Filipe quer é estar em constante troca com artistas que admira, está aí o porquê da colaboração de Samira Winter e de outros nomes que serão revelados junto ao lançamento. Fique atento se você gosta de Boogarins. “Acabei fazendo isso de forma natural e porque planejava um disco coletivo, cheio de pessoas envolvidas, é isso que me move, essa ligação de pessoas talentosas de lugares diferentes, com vidas distintas.”
Filipe e Samira se conheceram por conta da música. Ela, que é fã de My Bloody Valentine, banda de rock alternativo irlandesa, estava à procura de sons lo-fi e achou o primeiro EP do juiz-forano. Filipe acompanha toda a trajetória da artista e sempre dá play em seus discos nas discotecagens mp3 das festas que participa. “Eu amo videoclipe e acho que quando vi o de ‘Vida sem sentido’, eu pensei: ‘meu, isso é muito bom!’, procurei e escutei bastante os álbuns e me identifiquei demais porque curto muito indie rock, músicas em português, melodias bonitas e essa vibe meio ‘lazy’ praieira, sonhadora”, conta Samira.
A letra de “Chiclete” foi cocriada com Samira, que enviou 30 segundos de uma ideia para Filipe dar continuidade. Ela fala de uma bola de chiclete que já perdeu o gosto e a cor, que nem brilha mais rosa, e aí vem o refrão afirmando que já “não dá mais para ficar em cima do muro”, sobre a necessidade de nos posicionarmos neste contexto político atual e enquanto autores de nossas próprias vidas. “O indivíduo, tanto quanto a massa, precisa ‘sair do lugar’ e ‘tomar atitudes'”.
“Tentando traçar alguma lógica fanfarrona, o indivíduo blasé é a goma de mascar que não estoura mais, que está no patamar da indiferença, enquanto o refrão clama para uma movimentação. A canção está na voz de Filipe e Samira, que entra na parte B da música com um vocal tão doce quanto a dublagem da personagem mais fofa de um mangá japonês. O single foi gravado e mixado no quarto do produtor musical Guerrinha (Gabriel Guerra), no Rio de Janeiro, e masterizado pelo Bráulio Almeida, também na capital carioca, dando um clima tropical e quentinho aos arranjos dançantes, que não mais estão presos somente à essência lo-fi do canadense Mac Demarco e seus desdobramentos.
“Ficou muito a vibe que precisava ser, com a produção do Guerrinha, eu fico feliz porque às vezes temos uma ideia, mas não é necessariamente para a nossa banda, e eu sei que antigamente os músicos faziam muito mais essa troca. O Cazuza escrevia um poema, mandava para a Rita Lee, e ela fazia uma canção. Caetano, Gil, todos compunham e davam uma música para o outro, era bem fluido. Seria cada vez mais legal uma comunidade musical onde a gente pudesse compartilhar mais as ideias e interpretar as músicas uns dos outros”, observa Samira feliz em ter dado certo a parceria com Filipe.
Filipe Alvim
Neste domingo (6), às 17h, na Agência (Rua Delfim Moreira 232)