Laura Conceição passou a madrugada de segunda para terça-feira viajando. Ela estava em São Paulo fazendo pré-lançamento de seu segundo disco, “Espelho”, que vai estar disponível nas plataformas digitais a partir desta sexta-feira (5). Desde 2017, quando representou Minas Gerais no Slam BR – Campeonato Brasileiro de Poesia Falada, ela faz essa ponte entre as cidades, principalmente por causa desses eventos. “Mas, quando eu vou a São Paulo para uma coisa específica, sempre aparece uma outra coisa, como se fosse uma máquina de cultura. A parada não para”, agradece. Ela não quer que pare mesmo. “Espelho”, inclusive, foi pensado, de acordo com ela, de uma maneira que faça sua música rodar ainda mais, porque é assim que a arte faz sentido: sendo espalhada, refletida como espelho.
A música por inteiro sempre fez parte da vida de Laura. Seu pai é músico. Sua mãe era professora de literatura. Esse encontro, além de gerá-la, foi a semente necessária plantada para que dela surgisse também uma simbiose indissociável: a união entre música e poesia. Ela, nova, lia música e cantava poesia. “Mas eu sempre tive uma dificuldade de entender, na infância, como eu ia trabalhar a música. E eu me encontrei através da poesia, do hip hop e do rap, que mistura poesia e ritmo. Quando eu entendi que eu ia para a musicalidade através do meu verso, da palavra, foi quando eu me encontrei na música”, afirma. Neste segundo disco, Laura consegue, então, mostrar como essa junção sempre esteve ali, por mais que os passos precisassem caminhar por outros caminhos para chegar a esse resultado.
Caminho através do espelho
“Espelho”, para Laura, é um lugar onde ela consegue se afirmar fazendo parte da Música Popular Brasileira, sem amarras e livre de categorização. É onde ela faz o que, simplesmente, a cabeça manda. O disco saiu assim. Diferente do primeiro, “Tempos efêmeros”, ela fez as letras em cima dos beats. E isso, para ela, foi o que possibilitou o disco ser mais dançante e rítmico, propondo um passeio por entre tantos gêneros e influências. “A minha essência é a poesia. E aí eu preciso estudar, entender e praticar formas diversas de expor essa poesia. E o álbum traz isso. A principal inspiração desse álbum é a música popular brasileira. Pouca gente entende o rap como música popular brasileira, mas ele é também, totalmente.” A produção, assinada por Everbeatz e Álvaro Borges, foi também lugar de afeto, sendo, como ela diz, possível entender que era esse o seu caminho.
Mas para ela mesma entender que era, realmente, isso, foi necessário uma pausa, tempo para olhar no espelho e para se ouvir. “‘Espelho’ tem a ver com a minha essência. Eu acho que nesse momento onde eu parei eu me encontrei comigo mesma e decidi me escutar e me libertar de alguma caixa que às vezes as pessoas me colocavam. Do tipo: ‘Você faz um tipo de música apenas’. Não. Eu faço isso também, mas quero fazer outras coisas, porque tudo envolve poesia. A minha ideia foi essa. Foi o que veio pra mim”, explica. Para ela, o disco só desaguou nesse ambiente porque toda a equipe acreditou no processo, fez parte de cada passo. “E eu estava confortável ali. Não dá para trabalhar com arte sem estar à vontade.”
As músicas foram compostas a partir da pandemia, são mais recentes. “Por isso eu acho que eu estou muito conectada com o álbum, porque me representa agora, de prontidão”, afirma. As letras falam de sua intimidade nesse contexto de se reconhecer, mas, por ser um momento comum, ele fala, também, sobre o coletivo. “O que me inspira é tudo o que vai acontecendo comigo, porque é o cotidiano de diversas formas. As coisas vão acontecendo, eu vou escrevendo, e tudo vai virando poesia. Sempre vira.” As letras ainda mostram suas referências e mostram, exatamente, esse lugar onde ela quer estar: na música que ela chama de antropofágica, de mistura. Caetano Brasil, saxofonista e clarinetista, participa da música “Jazz brasileiro”, que não necessariamente é um jazz, para também mostrar essa fusão dos ritmos. Outra participação é de Luisa Moreira, em “Caos”, lançada já como single. A porta de entrada, no entanto, é com “Grão de areia”, música conhecida na capoeira que apresenta essa vontade de crescer, reconhecendo o espaço que ocupa.
Laura do slam
Mesmo mostrando tudo isso, Laura ainda é, e vai continuar sendo, a Laura do slam. “E tenho muito orgulho disso. Mas também quero mostrar que o slam, a poesia falada, a poesia marginal, a poesia cotidiana pode e deve estar atrelada a diversos ritmos musicais. Tudo pode andar junto e a gente está fazendo esse caminho e vendo onde isso vai dar.” Nesta sexta-feira, dia em que lança seu disco, ela participa do show de Caetano Brasil, que lança seu “Pixinverso – Infinito Pixinguinha”, que tem participação de Laura. Já no sábado (6), no Festival Mulheres no Volante, ela faz o pré-lançamento de “Espelho”, em uma apresentação ainda com músicas de “Tempos efêmeros”. O lançamento oficial do show acontece dia 12, no Beco.