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Amor e tragédia imortais

Orfeu (Pablo Abritta, à direita) vai até o submundo para salvar a amada Eurídice (Luana Caren) da danação. (Foto: Divulgação)
Orfeu (Pablo Abritta, à direita) vai até o submundo para salvar a amada Eurídice (Luana Caren) da danação. (Foto: Divulgação)
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Amor que não se mede? É aquele capaz de ir até as profundezas infernais para salvar a amada. E poucas histórias conseguem refletir isso de forma tão cristalina quanto “O mito de Orfeu e Eurídice”, que a Cia. Teatrando apresenta neste domingo, às 18h30, no Teatro Solar, dando início às comemorações dos dez anos do retorno às atividades teatrais do grupo.

Com texto e direção de Adryana Ryal, “O mito de Orfeu e Eurídice” parte da tragédia grega original para criar uma versão da história, em que elementos dos mitos gregos, do teatro contemporâneo e da ópera “Orphee et Eurydice” (1774), de Christoph Willibald Gluck, criam uma nova narrativa. Além de ser o músico mais talentoso da Grécia, Orfeu é apadrinhado por Apolo, Deus do Sol e das Artes, que apaixona-se e é correspondido pela mais bela das ninfas, Eurídice. Em um momento de descuido, ele deixa a amada sozinha, e o invejoso Aristeu, também caído de amores pela ninfa, aparece na história. Quando retorna, Orfeu descobre que Eurídice morreu e foi enviada para o submundo, e consegue ter a permissão dos deuses para chegar até Hades, onde lutará para trazer a amada de volta à vida.

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Segundo Adryana Rayal, dois fatores contribuíram para a criação da peça. Uma delas é a disposição da companhia em resgatar as histórias clássicas, entre romances e tragédias, assim como os grandes autores. E a tragédia de Orfeu e Eurídice foi a escolhida devido à paixão de seus integrantes pela tradição grega, mas aliada ao teatro contemporâneo. O projeto teve início em 2013, quando conseguiram ser aprovados na Lei Murilo Mendes, com as pesquisas sendo iniciadas no ano seguinte, junto à seleção de atores, músicos e composição de uma trilha sonora original, executada ao vivo. “Houve um processo de estudos sobre a política e a religião da Grécia Antiga com o professor Fábio Fortes, da UFJF. Essa parte foi muito importante, porque não há registros teatralizados de ‘Orfeu e Eurídice’. Foi tudo baseado nesses relatos dos mitos antigos, e continuamos a travar esse diálogo narrado escrevendo a partir dessas informações.”

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Ocupando lacunas

A principal diferença apontada pela diretora são as entrelinhas criadas pelo texto. “Você encontrará nos livros de mitologia passagens sobre a história dos dois, e nós demos asas às entrelinhas da história, como o encontro de Orfeu e Eurídice, como se apaixonaram, como Aristeu tentou seduzir a ninfa, a história de Caronte, responsável por transportar as almas em seu barco, Cérbero, que ao invés de ser um cão de três cabeças, passa a ter uma imagem humanizada, transformado num ser debochado, cínico. Até mesmo Hades é humanizado, mostrando que ele também amou um dia”, conta Adryana Rayal.

Além da pesquisa nas fontes mitológicas, “O mito de Orfeu e Eurídice” busca na ópera de Christoph Willibald Gluck e no teatro contemporâneo os ingredientes para não se ter mera reprodução do que já é conhecido. “Aproveitamos partes da ópera para criar uma versão teatralizada dela, mas não abrimos mão de a música ser clássica, antiga e ao vivo. A ópera é algo que já é trágico e comovente por si, e o teatro é uma forma de comunicação que adentra o tempo; acredito que não perdemos a raiz do tradicional, mas também não vamos apresentá-lo rígido, é preciso que o público seja afetado, provocado. Por isso pegamos a linguagem contemporânea, se usássemos a linguagem rebuscada seria mais difícil atrair o público.”

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Nesse aspecto contemporâneo, também faz parte a proximidade com o público. “O Orfeu é o homem simples que quer conquistar essa mulher. Ele vai perguntar ao espectador quem é ela, ‘quem é essa jovem?’. Queremos o espectador respondendo ali, na hora.”

A apresentação de domingo será a primeira em um palco italiano, ao contrário do que vinha sendo feito desde a estreia, no ano passado, em que a história era encenada em um palco grego. “Propomos que essa arena seja um local intimista, as pessoas já estavam sentadas ao nosso lado desde o primeiro espetáculo. Foi uma experiência que funcionou. O público, para nós, é divino, então por que não fazê-lo sentir-se divino, mexer com o imaginário do espectador. Quem não quer saber quem é Hades, Caronte?”, indaga Adryana.
A tragédia de Orfeu e Eurídice ainda encontra espaço no ideário romântico, acredita Adryana Ryal. “Quem não quer ouvir uma história de amor além da vida? Ela se perpetua além do espaço, mas isso tem se perdido. As pessoas estão perdendo seu lado humano, e Orfeu traz essa humanidade, essa paixão, de se recusar a perder a amada, desafiar os deuses, ir até Hades para salvá-la. Não se vê esse romantismo hoje, sendo que precisamos de mais romantismo, amizade, fantasia, imaginação. Hoje é tão fácil se matar por amor, brigar ao invés de reconciliar. Cobiçar o do outro é fácil, conquistar pra si é difícil. É preciso nos ligar ainda mais aos laços que nos unem”, acredita.

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Maratona de celebrações

Peça que estreou em maio de 2016, “O mito de Orfeu e Eurídice” inicia as comemorações dos dez anos de retorno às atividades da Cia. Teatrando, criada por 1990 por Sebastião Alvim ainda com o nome Grupo Teatrando. Depois da dispersão ocorrida em 2002, alguns dos antigos integrantes decidiram reativar o grupo, agora como uma Companhia, em 2007. “Decidimos iniciar as comemorações com ‘O mito…’ porque é um espetáculo que sempre teve casas lotadas na região, conquistou prêmios em festivais e que virá com novidades para o público”, explica.

Além da tragédia grega, a Cia. Teatrando apresenta no próximo domingo, também no Teatro Solar, o espetáculo infantil “Era uma vez… 1, 2, 3 – Teatrando ludicamente”, também premiado em festivais. Para maio, a previsão é realizar dois Cafés Culturais em local ainda a definir, em que serão discutidos o processo criativo da Companhia; em junho, mês em que se completa os dez anos de retorno, os planos são ainda maiores.

“Queremos fazer o Circuito Teatrando, com quatro espetáculos. A ideia é realizar novas apresentações de ‘O mito de Orfeu e Eurídice’ e ‘Era uma vez…’, além de reapresentarmos ‘O casulo de memórias resignadas’ e estrear o espetáculo ‘As sementes de aço’, com quatro atrizes e cuja temática é a guerra”, encerra.

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O MITO DE ORFEU E EURÍDICE

Com a Cia. Teatrando. Domingo, às 18h30, no Teatro Solar (Avenida Presidente Itamar Franco 2.104).

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