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IA x jornalismo: questões éticas ganham vulto em 2024

chatGPT IA jornalismo Pexels
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Desde o lançamento do ChatGPT, em novembro de 2022, a inteligência artificial (IA) virou pauta tanto em mesas de bar quanto em congressos acadêmicos internacionais. A ferramenta da Open AI se popularizou e fez com que outras grandes empresas de tecnologia corressem atrás do investimento em plataformas do tipo, ao mesmo tempo em que outros grandes nomes da tecnologia pediram pausa no treinamento de IA por conta de seus riscos. Por ser uma ferramenta que lida especialmente com texto, o ChatGPT acendeu debates sobre o futuro de diferentes profissões, em especial, do jornalismo. Se 2023 foi um ano de descoberta da IA, 2024 deve reforçar ainda mais as discussões sobre questões éticas envolvendo os usos da ferramenta pelo jornalismo, como previsto por especialistas ouvidos pela Tribuna.

Pedro Burgos, coordenador do Master em Jornalismo de Dados do Insper: “não adianta torcer para que o mundo volte a ser como era, porque não vai” (Foto: Arquivo pessoal)

De acordo com o coordenador do Master em Jornalismo de Dados do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), Pedro Burgos, inicialmente, houve um certo receio por parte de diferentes setores com a popularização da inteligência artificial a partir de ferramentas como o ChatGPT, considerando que, de certo modo, tais plataformas teriam capacidades semelhantes às dos seres humanos para exercer certas funções. Entretanto, a utilização da IA no dia a dia de diferentes profissões pode se tornar cada vez mais real, desde que alguns desafios como conhecimento técnico e uso de prompts (comandos) adequados sejam superados.

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“Eu acho que, passada essa reação inicial, que é mais instintiva, as pessoas começaram a tentar achar formas de colocar isso dentro das rotinas, por exemplo, em uma redação, porque eu acho que as pessoas viram que é uma tecnologia que veio para ficar, então não adianta simplesmente ignorar e torcer para que o mundo volte a ser como era, porque não vai.”

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Negação, estranheza, acomodação

Para o jornalismo, o uso da IA ainda é um processo que está em construção, conforme o especialista, e ainda são necessárias definições do que pode ou não pode ser feito pela ferramenta. Burgos, que atuou como instrutor assistente do curso “Como usar o ChatGPT e outras ferramentas de IA generativa na sua redação”, promovido pelo Centro Knight para Jornalismo nas Américas, acredita que a IA poderia ser vista como uma “calculadora de texto”, para contribuir no trabalho de jornalistas ou outros profissionais ao desempenhar funções complexas. Além disso, como lembrado pelo especialista, em caso de conteúdos gerados totalmente pela inteligência artificial, é necessário dar o devido crédito.

“Eu acho que [2024] vai ser um ano em que as pessoas vão experimentar mais. Passamos por um processo que primeiro foi de negação, depois de estranheza, e eu acho que agora é, em alguma medida, de acomodação. Eu acho que vamos naturalizar o uso dessas coisas, mas ao mesmo tempo vamos ter uma discussão mais sofisticada sobre os problemas ou sobre todas as questões éticas envolvidas”, aponta Burgos.

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‘O jornalismo tem uma responsabilidade social’

Na percepção do professor da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal de Juiz de Fora (Facom-UFJF) Carlos Pernisa Júnior, o uso da inteligência artificial pelas redações ainda é tímido, mas é possível que a ferramenta ganhe uma funcionalidade para, por exemplo, produção de materiais burocráticos e execução de tarefas repetitivas.

“Um tempo atrás, havia o jargão ‘pé de boi’, que era a pessoa que fazia quase sempre a mesma matéria, variando pouca coisa, como em relato de um acidente ou da prisão de alguém, sem muitas consequências. Isso segue um certo modelo, e já temos isso na imprensa, com a ideia do lide. Isso é mais ou menos fácil de uma inteligência artificial reproduzir”, explica. “Porém, uma grande reportagem não tem um espaço para esse tipo de uso. A reportagem requer outras coisas que a inteligência artificial não consegue fazer, principalmente porque dependemos de apuração, e a inteligência artificial é péssima de apuração.”

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Isso porque as ferramentas de IA abertas ao uso público usam o banco de dados da internet para pesquisa, desta forma, estão sujeitas a encontrar e repassar informações falsas sem identificar exatamente do que se tratam. Além disso, textos feitos por essas ferramentas e publicados na íntegra podem levar a acusações de plágios, conforme destacado pelo professor da UFJF. Dessa forma, mais do que como usar a IA, é necessário que, no próximo ano, surjam mais discussões sobre a ética por trás da ferramenta.

“Na área do jornalismo, temos uma responsabilidade social de estarmos atentos a isso. Não é sair publicando qualquer coisa e achar, porque foi produzido por um dispositivo qualquer que é associado a uma inteligência artificial, que isso tem credibilidade ou condição de ser publicado”, Pernisa. “O que eu gostaria de ter para o ano que vem era uma discussão ética sobre isso.”

Tendências para 2024

Para Miguel Fernandes, Chief Artificial Intelligence Officer do Grupo Exame, o uso da inteligência artificial pelas redações ainda está em um processo de aprendizagem (Foto: Leandro Fonseca/Exame)

Para o Chief Artificial Intelligence Officer do Grupo Exame, Miguel Fernandes, o uso da inteligência artificial pelas redações ainda está em um processo de aprendizagem. Na Exame, por exemplo, a IA é utilizada especialmente no editorial de inteligência artificial e tecnologia, mas ainda não foi adotada como ferramenta oficial de trabalho. A decisão pelo seu uso parte dos próprios jornalistas, mas muitos ainda demonstram resistência. Mas, como destacado por Fernandes, há pontos em que o ChatGPT, por exemplo, não pode substituir o trabalho dos profissionais, como a própria apuração e o estilo de escrita.

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“O ChatGPT está se consolidando como uma ferramenta auxiliar, não para criar a versão final de textos ou imagens, mas para facilitar pesquisas, ajudar na combinação de ideias, expandir o repertório, realizar correções ortográficas e gramaticais, e até ajustar o tom do texto, por exemplo. Pode transformar um texto em versões para diferentes canais de distribuição, como Instagram, LinkedIn ou outras redes sociais. Contudo, ele não substitui a criação original da notícia nem o trabalho essencial do jornalista.”

Conforme o especialista, é possível que a abordagem da IA pelo jornalismo seja ampliada, e “aqueles que começarem a usar essas ferramentas primeiro, incorporando-as no dia a dia, sairão na frente”. Para 2024, Fernandes acredita que haja ainda mais consolidação e disseminação das ferramentas de IA pelo jornalismo, indo além, inclusive, de produções textuais.

“Imagino que começarão a surgir mais narrativas audiovisuais, com o jornalismo não se limitando apenas ao texto da notícia, mas expandindo-se para a transmídia e multimídia, misturando conteúdo em texto, áudio, vídeo e imagem, tudo isso possibilitado e gerado com ferramentas de inteligência artificial. Isso também visa tornar o conteúdo mais atraente para o público final. Essas são as tendências gerais para o próximo ano, na minha opinião”, aponta.

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