Juiz de Fora registrou nesta quarta-feira (28) mais um episódio de atropelamento de pessoa idosa. O acidente se soma a outros atropelamentos que ocorreram nos últimos dias e chama a atenção para a vulnerabilidade dessa faixa etária da população em questões envolvendo a mobilidade urbana. Especialistas ouvidos pela Tribuna falam sobre os desafios que os idosos enfrentam para se deslocar pela cidade e apontam a necessidade de repensar o planejamento urbano.
Na visão do mestre em engenharia de transportes e observador certificado do Observatório Nacional de Segurança Viária José Luiz Britto Bastos, não há uma preparação em termos de mobilidade urbana para lidar com o envelhecimento da população. Esse ponto se aplica ao trânsito, mas também à movimentação do idoso pela cidade, de uma forma geral. Como exemplificado pelo especialista, a tecnologia já tem apresentando algumas soluções para lidar com parte da questão. “Existem hoje alguns dispositivos que já funcionam, por exemplo, em Curitiba, em que você pode aumentar o tempo de passagem para o idoso. Ele apresenta o seu cartão magnético em um leitor, aquele leitor vai ler a idade dele e aumentar em alguns segundos o tempo de travessia”, relata.
Outra medida que contribuiria para a redução de acidentes envolvendo pedestres, de uma maneira geral, para o especialista, seria a redução da velocidade nas vias urbanas, em um movimento chamado de “Zonas 30”. “Nas áreas urbanas, a velocidade não ultrapassa 30 km/h porque, nesse caso, uma pessoa que é atropelada tem uma possibilidade de vir a falecer de apenas 10%. Se for a 50 ou 60 km/h, a situação se inverte, e há 90% de chance de vir a falecer.”
Em Juiz de Fora, o aspecto se soma também à imprudência de motoristas, na visão do especialista. “O trânsito de Juiz de Fora é muito agitado, e os condutores, de um modo geral, não têm muito respeito pela sinalização. Todo cuidado é pouco nesse sentido”, diz. “É preciso que haja uma redução de velocidade, conscientização da população e dos condutores, principalmente, educação para o trânsito para que respeitem as velocidades e respeitem as pessoas e os pedestres, de modo geral.”
Idosa atropelada no Centro
O acidente registrado nesta quarta-feira envolveu uma idosa de 69 anos. A vítima foi atropelada por um ônibus da linha 521 – Teixeiras na Avenida Itamar Franco, esquina com a Avenida Rio Branco, no Centro de Juiz de Fora. De acordo com o Samu, que foi acionado para o atendimento, a idosa foi encaminhada para a Santa Casa de Juiz de Fora consciente e com dores nas pernas. Conforme o relato de uma moradora que passava pelo local, a vítima estava atravessando a rua quando o ônibus a atingiu.
Em nota, o Consórcio Via JF lamentou o ocorrido e informou se solidarizar com a vítima. Conforme o grupo, “a idosa teria arriscado atravessar quando o sinal estava vermelho para pedestre, sendo atingida pela lateral do ônibus, que fazia a curva da Avenida Rio Branco para acessar a Itamar Franco.” Como apontado no texto, o motorista teria feito a curva acentuada e buzinado.
‘Mais do que viver muito, precisamos viver melhor’
Conforme o gerontólogo José Anísio (Pitico), colunista da Tribuna, ao envelhecer, as capacidades funcionais das pessoas vão se reduzindo. Isso faz com que determinadas atividades se tornem mais difíceis, somando-se a outras questões paralelas. “A grosso modo, uma pessoa idosa usa de oito a 12 medicações. Essas medicações comunicam-se entre si no nosso organismo e provocam desequilíbrio, tontura, quedas, audição diminuída. Isso não tem como mudar, o que tem que mudar é a cidade no seu planejamento de serviços urbanos para pessoas diferenciadas como nós todos, que vamos envelhecer.”
Em termos de mobilidade, o especialista acredita que o tempo dos semáforos para pedestres poderia ser maior, além de haver um trabalho mais significativo de educação de trânsito entre os condutores. Para Pitico, é preciso levar em consideração todas as diferenças que não se aplicam somente às pessoas idosas, mas também às pessoas com deficiência, por exemplo. “Nós vemos algumas calçadas rebaixadas, mas a presença de calçadas esburacadas é ainda muito grande, e uma queda pode levar à morte de uma pessoa idosa”, comenta, em referência a outro episódio que ocorreu no início da semana em Juiz de Fora, quando uma idosa de 64 anos caiu dentro de um ônibus após uma freada brusca e faleceu.
Envelhecimento da população
Como lembrado pelo especialista, estamos vivendo um fenômeno de envelhecimento da população. “Há uma longevidade e essa longevidade não vem acompanhada de respostas favoráveis positivas. Estamos vivendo muito em cronologia física, mas mais do que viver muito, precisamos viver melhor.” De acordo com o Fundo de População das Nações Unidas (Unfpa), o Brasil se encontra em uma categoria de envelhecimento moderado, quando as taxas de fecundidade e mortalidade estão em queda. Nessa etapa, há uma proporção importante de jovens, porém, a população idosa começa a aumentar. A projeção do Unfpa é que, em cerca de 20 anos, a população brasileira será considerada envelhecida.
Medidas para trânsito mais seguro
A Tribuna questionou a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) e o Consórcio Via JF sobre medidas para promoção de um trânsito mais seguro para as pessoas idosas. A Administração municipal destacou, em nota, que realiza campanhas educativas voltadas para público idoso por meio da Secretaria de Mobilidade Urbana. No último movimento do Maio Amarelo, por exemplo, houve ação junto ao JF Prev voltada exclusivamente para este público.
“Além disso, a SMU e o Centro de Convivência do Idoso, da Secretaria de Assistência Social (SAS), fazem parte da Comissão Municipal de Segurança e Educação no Trânsito (Comset) e são desenvolvidas ações em conjunto visando à redução de acidentes”, informa a PJF.
Também em nota, o Consórcio Via JF destacou os desafios dessa faixa da população para se deslocar, tema que é pauta interna para o grupo. “Garantimos a acessibilidade nos veículos com espaços reservados para idosos, além de rampas de acesso e sinalização adequada com orientação. Além disso, os nossos motoristas e cobradores recebem orientações constantes para atender às necessidades específicas dos idosos, como auxílio no embarque e desembarque e como atender às necessidades e dúvidas dos mesmos durante o trajeto.”
Ainda segundo o Consórcio Via JF, a mobilidade urbana pensada para essa faixa da população deve ir além do transporte público. “É necessário garantir que as calçadas sejam adequadas, com rampas de acesso e sem obstáculos, para que seja possível caminhar sem riscos de quedas”, aponta.