Ícone do site Tribuna de Minas

‘Pai de santo’ é investigado por importunação e violação sexual

celular mao Valter Campanato Agencia Brasil
PUBLICIDADE

Um homem de 43 anos que se identifica como “pai de santo” é investigado pela Polícia Civil por importunação e violação sexual mediante fraudes praticadas com, pelo menos, cinco mulheres que frequentavam um suposto centro religioso em Juiz de Fora. O inquérito tramita na Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam). Segundo a titular, Alessandra Azalim, várias vítimas foram ouvidas, e diligências, realizadas. Na tarde dessa quarta-feira (27), o advogado Matheus Ferreira, que representa seis vítimas, ainda protocolou outra denúncia na Deam, de estupro de vulnerável, envolvendo o mesmo suspeito. O número de delitos sexuais, entretanto, pode ser maior, já que muitas pessoas ainda temem falar sobre o assunto e não procuram a polícia, como uma ex-filha de santo ouvida pela Tribuna. “Recebi várias ligações e vídeos dele se masturbando. Com outras aconteceu pior, mas estão com medo. Houve casos em que usou da religião para dar banhos e chegou a tocar nas pessoas”, conta a mulher, 33. “Somente saí do centro, que foi fechado.”

Conversas inicialmente inofensivas pelas redes sociais e pelo aplicativo WhatsApp seriam a isca lançada pelo suposto religioso para fisgar suas vítimas. Frequentadoras da mesma casa religiosa, elas acabavam sendo surpreendidas por fotos, vídeos, áudios e frases sexuais. “Não satisfeito, ele começou a me mandar mensagem no WhatsApp com um tom mais nojento, dizendo que se me pegasse ia acabar comigo a noite toda, extremamente vulgar”, relata à reportagem uma auxiliar administrativa, 33, que já havia sido assediada pessoalmente pelo homem, no final de 2022, em uma casa de show. “De repente, ele pegou no meu braço e começou a dar em cima de mim, dizendo que era homem pra mim, que iria me fazer feliz e tentou me beijar”, detalha sobre a situação vivenciada no mesmo ambiente onde a namorada dele estava.

PUBLICIDADE

A vítima conhecia o suspeito há cinco anos, considerava-o amigo, mas se sentiu traída e desrespeitada. “Nos conhecemos em uma outra casa religiosa. Ele foi uma pessoa que me ajudou muito na parte espiritual. Sempre foi muito respeitoso e, com isso, foi ganhando minha confiança. Passados alguns anos, eu, ele e outras três pessoas decidimos abrir, no segundo semestre de 2021, uma casa religiosa, no intuito de realizar atendimentos espirituais e prestar caridade para quem precisasse.” No entanto, o homem teria passado a usar “trabalhos” como desculpa para pegar fotos nuas de mulheres. “Banhos que ele dizia que deveriam ser dados por ele, sendo que homem não pode dar banho em mulher. Acabou com a nossa casa, difamou nossa religião. Nunca imaginei que alguém tão próximo pudesse agir de forma tão canalha.”

PUBLICIDADE

Assim como a declaração da auxiliar, o advogado garante que há depoimentos detalhados das vítimas e evidências concretas. “Por se tratar de crimes sexuais, que correm em segredo de Justiça, neste momento não podemos passar maiores informações, mas em breve, assim que concluído (o inquérito), a PC irá se manifestar sobre a apuração”, resumiu a Polícia Civil de Minas Gerais, por meio de nota.

Leia mais notícias sobre Juiz de Fora aqui.

PUBLICIDADE

Jovem denuncia estupro dentro de carro há seis anos

Além da série de possíveis crimes sexuais que vieram recentemente à tona envolvendo o “pai de santo”, uma jovem teria sido abusada sexualmente pelo homem em 2017, quando tinha 13 anos. Segundo a notícia-crime apresentada pelo advogado Matheus Ferreira, na época ela frequentava um “terreiro” na Zona Norte. Ao término do evento em um dia, o suspeito teria solicitado à família dela uma carona para casa. Os pais estavam nos bancos da frente, e a garota, atrás, no meio, entre o irmão dela e o religioso. “Durante a viagem, o autor começou a alisar o braço da vítima, como se estivesse fazendo um ‘carinho’, fato que, por si só, a vítima naquele momento não entendeu como criminoso.” Ainda conforme a denúncia, enquanto mantinha os braços sobre os ombros da vítima, ele conversava com os pais dela, até que “começou a passar a mão nos seios dela, que passou a repelir suas investidas, retirando seu braço. Mas o autor, a cada vez que tinha o braço retirado, voltava para a mesma posição, tocando os seios da vítima a todo instante”.

Em choque, a adolescente não conseguiu alertar seus responsáveis sobre o abuso ocorrido pelas costas deles. “Além do toque nos seios, a sua outra mão ficou alisando a perna da vítima, tudo isso de forma velada.” Hoje, aos 19 anos, e após saber das outras vítimas, a jovem teve coragem e decidiu denunciar o estupro de vulnerável.

PUBLICIDADE

Melhor amiga da namorada

“Espero que ele pague por tudo que fez. Tem tanta certeza de impunidade que continua fazendo o mesmo”, desabafa uma enfermeira, 34, que teve a árdua missão de relatar os supostos crimes sexuais à namorada do “pai de santo”, sua melhor amiga. “Contar que o namorado fez tanta coisa assim, e o pior: usou a fé das pessoas.” Ela mesma afirma ter sofrido dois episódios de importunação sexual pelo WhatsApp. “Mandou mensagem conversando, depois disse que estava pelado e se eu queria ver.” Assustada, ela preferiu acreditar que ele estivesse bêbado ou brincando, até porque pediu desculpas no dia seguinte. “Em março deste ano fui para Cabo Frio. Começou a mandar mensagem de madrugada. De manhã ligou por vídeo. Quando olhei, sem contexto algum, estava se masturbando. Desliguei e fiquei desnorteada, sem saber o que estava acontecendo, porque nunca havia faltado com respeito.”

Depois de desabafar com uma amiga, a profissional de saúde descobriu não ser a primeira vítima. “Foram aparecendo várias situações, de várias pessoas. E eu não me calei. Me senti com vergonha e entendo as pessoas que não denunciam, porque não é fácil se expor dessa forma. A gente se sente suja. Por muito tempo não consegui atender videochamada.” Com crise de ansiedade, ela precisou ser medicada. “Éramos todos amigos, a maioria casados. Ele brincou não só com a nossa fé, mas com a de várias pessoas.”

Constrangimento também no registro do BO

Uma vendedora autônoma, de 47 anos, chegou a frequentar dois centros religiosos onde o “pai de santo” atuou. “Quando ele abriu um local próprio, não me senti bem, não achei o ambiente legal, fui três vezes, no máximo, e nunca mais retornei. Mas meu filho era filho de santo dele, ficou internado, e ele mandava mensagem. Depois solicitou amizade no Facebook. Até que há duas semanas me mandou um ‘oi’, perguntando ‘se eu queria ver’.” Já no WhatsApp, ele insistiu na pergunta e, segundo ela, acrescentou: “Você quer ver duro ou mole?”. Em seguida, fez a chamada de vídeo se masturbando.

PUBLICIDADE

A vítima procurou a Polícia Militar para registrar a ocorrência e afirma ter sido constrangida. Depois de sair da Zona Norte para o posto de Santa Luzia, ainda foi direcionada ao São Pedro, na Cidade Alta. “Os policiais disseram que quando o assunto é esse, eu deveria bloquear (o contato). Se todas as mulheres passarem por isso e apenas bloquearem, como seria? Ele já tem cinco vítimas e está sob investigação. Quem me bloqueou foi ele. Não vou desistir e vou até o final”, dispara, apesar da sensação de impunidade. “É humilhante e vergonhoso. Um homem não pode fazer isso com mulher alguma.”

Outra vítima, 43, estava há dois anos no centro religioso. No dia 23 de abril, foi pega de surpresa com ligação por vídeo. “Não achei que faria isso comigo. De repente, começou a se masturbar.” Ela ficou decepcionada. “Ainda tentou ligar para minha filha, que tinha acabado de ter bebê. Espero Justiça, porque todos éramos amigos, e a falta de respeito foi muito grande. Tive crise de ansiedade, tomei remédio e passei por psicólogo.”

Reprise

PUBLICIDADE

Uma jovem, 23, também frequentou o centro religioso por dois anos junto com o namorado. “Era um lugar de muita energia boa, eu via muito axé. Não imaginávamos que tudo iria se transformar da forma que foi.” Até que um dia o “pai de santo” teria dito que ela precisava de um banho, nua. Nervosa, a vítima apenas usou a essência indicada por ele. Em outra ocasião, no entanto, ao fim da festa da namorada do suspeito, ele teria insistido no banho e dito que “queria passar a mão na bunda dela”. Mesmo sem retorno da investida, a teria tocado na presença do namorado, em frente ao elevador. “Quando se despediu de mim, me abraçou com um braço e, com o outro, apertou minha bunda.” No dia seguinte, o casal se desligou do centro. “Logo que isso aconteceu ficamos sabendo dos outros casos.” Ela diz ter se sentido invalidada. “Já fui molestada aos 12 anos por um membro de uma igreja cristã. E isso acontecer novamente comigo, depois de adulta, e eu não ter reação novamente me deixou muito triste.”

Sair da versão mobile