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JF tem maior média de mortes por Covid-19 na onda amarela

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Em 17 de março, a Prefeitura de Juiz de Fora decretou a adoção de uma série de medidas preventivas e de enfrentamento ao coronavírus, como a suspensão de atividades de diversos setores comerciais e a obrigatoriedade do uso de máscaras nas ruas, em razão da pandemia de Covid-19. Desde então, a cidade vê o número de casos da doença aumentar, assim como a quantidade de óbitos, que, na quarta-feira (26), chegou a 157, quase cinco meses desde a primeira morte causada pelo coronavírus em Juiz de Fora, ocorrida em 29 de março. Concomitantemente, a cidade vivencia também o maior afrouxamento das medidas restritivas, fator que, segundo autoridades em saúde, pode contribuir para a maior ocorrência de casos de casos de coronavírus por resultar na maior circulação de pessoas. A fim de verificar a média de falecimentos a cada flexibilização, a Tribuna levantou o quantitativo de óbitos ocorridos por etapa, e verificou que o período proporcionalmente mais fatal ocorreu após Juiz de Fora migrar para a onda amarela do novo programa Minas Consciente, em 8 de agosto. De lá pra cá, a média de mortes diárias é de 1,5, a maior em todas as quatro fases (ver gráfico).

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A primeira fase teve início com o decreto municipal publicado em março e seguiu até 18 de maio. Neste período, as medidas restritivas orientavam o máximo isolamento social da população e permitiam o funcionamento apenas de setores considerados essenciais. Ao longo desses dois primeiros meses de restrição, foram registradas 27 mortes em decorrência da Covid-19 na cidade, com uma média diária de 0,43 mortes.

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Após esse período, a cidade aderiu ao programa Minas Consciente e deu os primeiros passos em direção à retomada econômica gradual proposta pelo Governo estadual, entrando na onda verde. Nesta fase de flexibilização, a permissão de funcionamento continuou limitada às atividades essenciais, mas a lista elaborada pelo Estado era mais ampla e abrangia mais serviços. A onda verde permaneceu em vigor por dois meses (18 de maio a 18 de julho), quando a cidade registrou o maior quantitativo de vidas perdidas para a doença: 72, uma média de 1,18 por dia.

Outros 28 falecimentos ocorridos por complicações associadas ao coronavírus foram registrados no período entre 18 de julho e 8 de agosto, quando o município integrou a onda branca do Minas Consciente. Nesta fase foi permitida a reabertura de comércios de artigos esportivos e de jogos eletrônicos, de floriculturas e de imobiliárias e de serviços de consultoria, entre outros. A média de mortes diárias subiu para 1,3 por dia neste intervalo.

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Já em 8 de agosto, a cidade avançou para a onda amarela da nova versão do Minas Consciente, após uma reformulação. Foi permitido o funcionamento de livrarias, papelarias e salões de beleza, além daqueles setores que já estavam funcionando. Desde então, a PJF já atestou mais 30 falecimentos causados pela Covid-19, resultando em uma média de 1,5 mortes diárias nestes 20 dias.

Movimento na região central na tarde do dia 8 de maio, quando o Município ainda não tinha aderido ao Minas Consciente (Foto: Fernando Priamo)

Para especialistas, aumento de vítimas fatais pode estar ligado a flexibilizações

Desde a morte de um idoso de 71 anos, no dia 29 de março, outras 156 mortes causadas pela Covid-19 foram registradas, além de 4.692 casos confirmados e 16.738 suspeitas até esta quinta-feira (27). Embora haja tendência de estabilização da curva de contágio, como apontam os especialistas ouvidos pela Tribuna, a cidade continua atestando óbitos, quase que diários, ao longo do último mês. A maioria das vítimas fatais é idosa.

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Para o infectologista Marcos Moura, o aumento o número de mortes à medida que as medidas de flexibilização avançam estão associados. “No início da pandemia, a Covid-19 se manifestou em pessoas de uma classe social mais abastada, que viajou, esteve fora do país. Essa pessoas conseguem mais facilmente fazer isolamento social, e ter um controle muito mais fácil do vírus. Quando o vírus chega nos bairros periféricos, nas pessoas que não conseguem fazer isolamento porque precisam trabalhar ou retornar ao trabalho devido à flexibilização, o vírus se espalha muito mais fácil”. Dessa forma, analisa Moura, o risco de pessoas mais jovens se contaminarem e levarem o vírus para uma população domiciliada com comorbidades e, principalmente, idosa, aumenta muito. E é justamente neste público que a doença tem mais chances de evoluir para óbito.

O infectologista acredita também que, embora a maior quantidade de óbitos tenha sido registrada anteriormente, as mortes devem continuar ocorrendo. “A ideia é que depois de uma ascensão da curva a gente tenha uma manutenção da mortalidade. (…) No primeiro momento, levou pessoas mais velhas à mortalidade. Depois que teve o isolamento, os mais velhos ficam isentos, aí você tem uma queda da mortalidade. O problema da reabertura é os jovens levarem a doença para casa, e aí volta uma infecção em idosos”, pontua.

‘Termômetro’

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O também infectologista Rodrigo Daniel de Souza avalia que o período em que Juiz de Fora registrou o maior número de vidas perdidas ao longo da pandemia, entre 18 de maio a 18 de julho, coincide com o pico da curva de casos da Covid-19. “Aparentemente a gente teve um pico, e está mantendo um platô com tendência à redução. Essa semana será importante para a gente perceber o que aconteceu (a partir da adesão de Juiz de Fora à onda amarela), porque houve uma liberação maior, o movimento aumentou nas ruas, e a gente pode ter um pequeno comprometimento dessa curva com essa maior exposição. Normalmente a gente demora 14 dias para perceber os reflexos”, lembra.

O médico ainda cita o número de pacientes hospitalizados em leitos de terapia intensiva Covid como um importante termômetro do cenários de óbitos. “Em julho, quando teve essa concentração de óbitos, houve dias em que a rede de saúde registrou 84 pacientes internados em leitos UTI Covid. No início de agosto, no entanto, houve um dia em que baixou para 51. Depois houve um pequeno aumento, e agora parece estar se estabilizando. Esse número de paciente em UTI Covid, para mim, é um grande termômetro da epidemia.”

Na avaliação da gerente do Departamento de Vigilância Epidemiológica e Ambiental da Secretaria de Saúde, Cecília Kosmann, embora em uma pandemia sejam esperadas mortes, e a taxa de mortalidade seja maior em grupos de risco, a cidade ainda está abaixo do previsto por projeções. “Em comparação com as projeções que são feitas regularmente pelo grupo de modelagem epidemiológica da UFJF, a nossa taxa está abaixo do esperado. Um desses estudos apontou que até 25 de junho o município teria 346 óbitos confirmados. Hoje (quinta-feira) estamos com menos da metade dessa previsão. Existe uma mortalidade, mas graças a esforços da população, por meio do isolamento, e também da Prefeitura, esse número está bem abaixo das projeções. E, também nenhum desses óbitos aconteceu por falta de leito de enfermaria ou UTI”, destaca.

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Movimento na região central na tarde do dia 22 de junho, quando Juiz de Fora estava na onda verde do Minas Consciente (Foto: Fernando Priamo)

Idosos podem ser contaminados no ambiente familiar

De um total de 157 mortes confirmadas pela Prefeitura até a última quarta, 129 eram idosos, equivalente a 82%, sendo 58 homens e 71 mulheres. Destes, 106 tinham alguma comorbidade, caracterizada por doença anterior que pode levar ao agravamento da Covid-19. O médico Marcos Moura explica que no público idoso, as doenças tendem a evoluir de forma mais grave, assim como uma internação pode ser mais agressiva, e o paciente têm riscos de desenvolver infecções associadas à internação. Por esse motivo, a idade é colocada como um fator de risco para a evolução do coronavírus, assim como as comorbidades. Associadas, elas podem contribuir para que a pessoa não resista à evolução da Covid-19 e morra.

“Em idoso, uma pneumonia, por exemplo, que em um jovem pode passar despercebida, pode ser muito grave. Uma diarreia pode ser grave, e com a Covid-19 não é diferente. Então, os idosos estão expostos, apesar de ser um grupo domiciliado, que não tem muitos contatos, não trabalha. Mas é um grupo que pode ser contaminado por familiares. A contaminação intradomiciliar é alta e efetiva porque as pessoas fragilizam as medidas de higiene e segurança entre familiares. E aí há um risco de aumentar a contaminação. (…) Quando há internação de pessoa idosa, é preciso maior cuidado. E mesmo com doença branda, a gente sabe que ele pode evoluir de maneira muito rápida para uma fase ruim da doença, e as doenças respiratórias são sempre graves em idosos”, explica Marcos Moura.

Nesse sentido, o médico Rodrigo Daniel aponta que o ideal seria que, neste momento, se mantivesse o isolamento social horizontal, ou seja, que as pessoas idosas ou com fatores de risco para a evolução da Covid-19 fossem resguardadas. “Já que nem todo mundo pode ficar em casa por questões de trabalho, o ideal seria que, pelo menos, as pessoas que têm maior risco fossem preservadas, já que correm o risco de ficar em uma situação grave. Agora, as pessoas que estão saindo para trabalho, indo às ruas, teriam que ter o cuidado de não levar a doença para a pessoa que ficou em casa”, opina.

Letalidade

Os especialistas ouvidos pela Tribuna apontam ainda que a taxa de letalidade da doença está associada ao número de diagnósticos realizados e que, portanto, não seria possível uma leitura exata do índice de mortalidade na cidade. Isso porque essa taxa é calculada dividindo o número de mortes pelo número de casos confirmados, e como em Juiz de Fora a capacidade diagnóstica ainda é baixa, como pontuam os especialistas, o índice não é fiel à realidade. “A gente não tem nem 1% da população de Juiz de Fora confirmada como caso positivo. Enquanto a gente não tiver uma testagem maior, haverá essa dúvida (do real índice de letalidade)”, observa Marcos Moura.

“Em termos práticos, seria muito fácil reduzir a taxa de mortalidade, bastaria aumentar o número de testes. Isso talvez nos desse um dado mais real de que a doença não seja tão letal quanto aparenta, causando uma melhor impressão, mostrando que a taxa de letalidade caiu. Só que isso não reduz o número de mortes. O que reduz o número de óbitos é o cuidado na assistência”, pontua Rodrigo Daniel.

Movimento na região central na tarde do dia 5 de agosto, quando JF estava na onda branca do Minas Consciente (Foto: Fernando Priamo)

Maioria dos infectados é população economicamente ativa

Apesar de a maioria das mortes ser de pessoas idosas, ao longo do últimos 20 dias, pelo menos oito adultos faleceram vítimas da Covid-19. Entretanto, todos tinham histórico de outras doenças, conforme pontua Cecília Kosmann, gerente do Departamento de Vigilância Epidemiológica e Ambiental da Secretaria de Saúde. Para ela, apesar de ainda não ser possível afirmar, a maior flexibilização das medidas restritivas pode ter relação com aumento de casos graves em pessoas mais jovens. “O maior número de casos confirmados é na população economicamente ativa, porque são pessoas que se expõem mais. E como essas pessoas também podem ter comorbidade, o risco de a doença evoluir de forma grave é muito alto”. A gerente ainda lembra que 90% dos pacientes que morreram tinham comorbidades. Destes, 66,5% tinham duas ou mais doenças associadas. Nesse sentido, ela também pontua o fato de a doença evoluir de forma grave em pessoas com enfermidades prévias.

Pico

Sobre a possibilidade de Juiz de Fora já ter enfrentado o pico de contágio, de acordo com Cecília, ainda não é possível afirmar que a cidade já passou deste ponto. Há uma queda em relação ao número de casos confirmados diariamente, lembra a gerente, que também pontua ser necessário “pelo menos três semanas de números constantes” para que seja seguro afirmar uma diminuição de casos.

Sobre o cenário da cidade após a adesão à onda amarela, Cecília também afirma ser precipitada uma análise precisa no momento. “A gente ainda não consegue ver o impacto após a adesão à onda amarela, porque temos um curto período desde que ela começou a valer. Nessas primeiras semanas, os números, de um modo geral, estão constantes. De um modo geral, o Brasil e Minas atingiram um platô de óbitos em relação a ocorrência diárias. Em Juiz de Fora existe uma variação semanal, mas ela ainda é muito pequena, e precisaríamos de mais uma ou duas semanas para analisar e fazer uma melhor inferência.”

Apesar disso, a gerente afirma que, embora em uma pandemia sejam esperadas mortes, e a taxa de mortalidade seja maior em grupos de risco, a cidade ainda está abaixo do previsto por projeções. “Em comparação com as projeções que são feitas regularmente pelo grupo de modelagem epidemiológica da Universidade Federal de Juiz de Fora, a nossa taxa está abaixo do esperado. Um desses estudos apontou que até 25 de junho, o município teria 346 óbitos confirmados. Nesta quinta estamos com menos da metade dessa previsão. Existe uma mortalidade, mas graças aos esforços da população, por meio do isolamento, e também da Prefeitura, esse número está bem abaixo das projeções. E nenhum desses óbitos aconteceu por falta de leito de enfermaria ou UTI”, destaca.

Monitoramento deverá ser ampliado, diz PJF

Conforme os especialistas ouvidos pela Tribuna, os principais problemas são o baixo percentual de testagem na população e a falta de um método de rastreio dos casos confirmados. Sobre o tema, a Secretaria de Saúde explicou que o Departamento de Vigilância Epidemiológica e Ambiental é o responsável por receber todos os laudos referentes a exames de Covid-19 e monitorar o estado de saúde do paciente e seus contatos. No caso de pacientes que falecem, a pasta informou que o contato e monitoramento de familiares são realizados a partir da internação.

Além disso, em nota, a Secretaria de Saúde informou que trabalha em uma parceria com uma instituição de ensino superior da cidade para viabilizar a ampliação do monitoramento. A previsão é de que, a partir de setembro, cerca de cem estudantes do curso de Medicina passem integrar as equipes que já desempenham essa função. Segundo a pasta, atualmente, o monitoramento é realizado preferencialmente via telefone, conforme protocolo estabelecido pelas autoridades de saúde.

Movimento na região central na última segunda-feira, 24 de agosto, cerca de três semanas após JF migrar para a onda amarela da nova versão do Minas Consciente (Foto: Fernando Priamo)

Sem ampliação de UTIs, mortes por desassistência poderiam ter acontecido

Antes do início da pandemia, Juiz de Fora contava com 108 leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTIs) públicas. Hoje, o número de equipamentos de leitos de terapia intensiva vinculados ao Sistema Único de Saúde (SUS) é de 183, ou seja, houve um aumento de quase 70%. Na avaliação dos especialistas ouvidos pela Tribuna, essa ampliação da rede de assistência aos pacientes acometidos ou com sintomas da doença impacta na taxa de letalidade. “O que evita a morte por Covid-19 é ter uma boa assistência e, em Juiz de Fora, ainda há um suporte de leitos para esses pacientes. Caso a área destinada a leitos Covid hoje fosse destinada à população em geral, ou mesmo a pacientes acidentados que, normalmente, são associados a leitos de terapia intensiva, isso poderia influenciar na taxa de letalidade. A cada dia que o paciente perde para ter acesso a um leito adequado, ou à assistência adequada, tanto de enfermaria quanto de UTI, pode contribuir para a evolução da doença”, argumenta Marcos Moura.

O infectologista Rodrigo Daniel lembra, ainda, que em Juiz de Fora não houve mortes por Covid-19 devido à falta de assistência. “Até o momento, o sistema de saúde tem conseguido comportar a demanda. A principal utilidade do isolamento é conseguir garantir acesso ao sistema de saúde e evitar o colapso da rede. E, se o número de leitos de UTI não tivesse sido ampliado, a gente com certeza teria tido mortes por desassistência”, analisa. “Agora, análises mais críticas sobre a mortalidade, se alguma das mortes poderia ter sido evitada ou não, já demandaria uma análise de prontuários, das condutas tomadas, se alguma foi mal traçada ou postergada. Mas como em Juiz de Fora os locais que oferecem leitos exclusivos para Covid são locais em que há qualidade na assistência das UTIs, provavelmente um paciente não veio a falecer nessas unidades por uma deficiência no cuidado.”

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