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Frio intenso escancara vulnerabilidade de moradores em situação de rua

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Um rosto coberto por barbas grisalhas se aproxima de carros que passam por uma das principais vias de Juiz de Fora, quando o sinal vermelho os obriga a parar. Aos motoristas ele pergunta: “Tem alguma moeda aí?”. Talvez, somente com o sinal fechado para veículos, Carlos Eduardo, 57 anos, consegue a atenção de alguém. Ele é uma das muitas pessoas que vivem nas ruas de Juiz de Fora e todos os dias fica à espera de ajuda para amenizar o frio e a fome. “Pode ser roupa, marmita, cobertor. Aceito tudo, porque só tenho isso aqui que você ‘tá’ vendo”. Em volta dele, apenas um colchão, alguns panos que formam uma barraca, bonecos e poucas roupas. Sob a marquise na lateral de um banco privado em pleno Centro da cidade mora Carlos e, pelo menos, outras cinco pessoas em situação de rua.

O inverno escancara as desigualdades. Em Juiz de Fora, principalmente nas duas últimas semanas, as noites e madrugadas têm sido geladas. Temperatura na casa dos 10 graus com sensação térmica chegando a 1 grau. Há quem possa se refugiar debaixo de cobertores peludos e quentinhos. Porém, para quem mora na rua, não há como escapar do vento cortante dentro de “casas” construídas com pano e pedaços de pau e dormindo sobre lonas.

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Carlos, que é natural da Bahia, diz que tem filhos e preferiu não contar por que mora nas ruas. Ele recolhia material reciclável, mas desde o início da pandemia não consegue juntar muita coisa, e o dinheiro, que já era pouco, está ainda mais escasso. “Não tem mais nada de reciclável na rua, desapareceu. Já tentei outros empregos, mas nem água para tomar banho eu tenho. Quem vai querer um funcionário como eu?”, questionou. “Por isso, para sobreviver, eu preciso pedir”.

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Na região central da cidade, é fácil encontrar pessoas deitadas sob marquises, dormindo ao chão (Foto: Fernando Priamo)

Falta cobertor

Era manhã de quinta-feira, pouco antes das 11h, quando a reportagem abordou duas mulheres. Elas estavam deitadas e abraçadas no mesmo aglomerado onde mora Carlos, reclamavam do frio. No momento, os termômetros marcavam 15 graus, mas na sombra, a sensação era ainda mais baixa. “Não somos namoradas, não. Temos pouca coberta e para esquentar a gente fica assim. Ontem um moço passou e deu umas moedas”, conta Ana Maria, 42, mostrando a cachaça que comprou com a quantia. Pergunto se ela usa a bebida para espantar o frio. “Cachaça é assim: a gente bebe de dia, de tarde e de noite”.

Sem teto há cinco anos depois de uma briga de família, Maria Aparecida, 37, se vira em meio a trapos surrados e rasgados, além de caixas de papelão improvisando uma cabana. Ela era quem estava abraçada a Ana. Pergunto se elas sabem que estamos em meio a uma pandemia, em que tem sido recomendada a distância. E ela logo dispara. “Menina, ou eu morro desse vírus ou eu morro de frio. A vida na rua é assim, a gente vive daquilo que sobra dos outros. Tem dias que tem comida, outros a gente sente fome. Já estamos acostumados e contamos com a piedade de Deus.”

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Falta acolhimento

Em meio à luta contra o frio e às precárias condições da rua, muitas pessoas contam com ajuda para sobreviver, como a do Centro de Referência em Direitos Humanos (CRDH). A preocupação da entidade, além da fome e do frio, é com a falta de espaços adequados para higiene, essencial na prevenção à Covid-19. O último diagnóstico e mais recente, realizado em 2016, aponta que havia 879 pessoas vivendo na rua em Juiz de Fora. No entanto, o CRDH diz que faltam estudos atualizados e existe um vácuo assistencial, uma vez que, segundo entidade, o Município dispõe apenas de 250 vagas para acolhimento.

Para a coordenadora do Centro de Referência, Fabiana Rabelo, homens e mulheres estão dormindo nas ruas pois “não têm acolhimento suficiente” e faltam políticas públicas. Durante o frio, a preocupação aumenta. “Isso é muito grave, pois essas pessoas estão à margem da sociedade. São invisíveis para o poder público. Basta sair às ruas a noite e ver. Essa população tende a aumentar diante da nossa realidade de falta de recursos”, acredita.

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No início da pandemia, a instituição distribuiu um kit lanche para estes moradores uma vez que a principal carência foi a fome. “O que existem são grupos de igrejas que fazem trabalhos com entrega de alimentos e cobertores. Nós queremos garantir os direitos dessas pessoas e vamos continuar lutando para isso.

(Foto: Fernando Priamo)

Ampliação do serviço de abordagem

Desde a última quarta-feira (26), a Prefeitura ampliou o horário de funcionamento e atuação da Abordagem Social à população em situação de rua. A ampliação do horário seguiu Nota Técnica nº 2/2020 de 21/08/2020, do Ministério da Cidadania, que versa sobre atuação dos entes federativos no enfrentamento às situações decorrentes do frio intenso. Agora, a abordagem acontece de segunda a sexta-feira, das 7h às 23h, e, aos sábados, domingos e feriados, das 7h às 19h. O Serviço de Abordagem Social atua em diversos pontos da cidade, realizando rondas periódicas nas regiões com a intenção de orientar os moradores em situação de rua sobre os serviços sociais da PJF. São encaminhados às unidades apenas os moradores que aceitam este tipo de atendimento.

Sem demanda reprimida

A Secretaria de Desenvolvimento Social informou ainda que atende cerca de 330 pessoas para pernoite e destacou que não está com demanda reprimida. Durante a pandemia, foram abertos três locais de acolhimento. A Casa Cem, Casa Dilermando Cruz e Casa Santa Luzia. Além do Centro Pop, Casa de Passagem para Homens, Casa de Passagem para Mulheres e Casa da Cidadania. Em todos os serviços, segunda a secretaria, eles têm acesso à informação sobre o coronavírus e aos cuidados necessários, como higienização e alimentação. Todos esses serviços passaram a funcionar 24 horas e oferecem cinco refeições diárias: café da manhã, almoço, lanche, jantar e ceia.

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Baixas temperaturas na madrugada

Juiz de Fora continuará com baixas temperaturas ao longo dos próximos dias, principalmente durante as madrugadas. Apesar de a massa de ar polar estar se deslocando para o oceano e perdendo intensidade na região, neste final de semana, os termômetros oscilam entre 14 e 28 graus. Ou seja, será um final de semana mais ameno que o anterior, no entanto, ainda prevalece o tempo frio.
Na sexta, sábado e domingo, a tendência é de noites e madrugadas bastante frias e tardes quentes, com grande amplitude térmica. Nos próximos dias, o céu deverá ficar nublado a parcialmente nublado, sem previsão de chuva.

A partir de terça-feira, entretanto, as temperaturas voltam a cair, acompanhadas das rajadas de ventos fortes, que contribuem para uma sensação térmica ainda menor.

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