Ícone do site Tribuna de Minas

Edifício mais antigo de JF enfrenta abandono há décadas

Edifício mais antigo de JF enfrenta abandono há décadas
PUBLICIDADE

Uma casa no número 360 da Rua Alencar Tristão, no Bairro Santa Terezinha, chama atenção de quem passa pela região não só por sua arquitetura colonial, que destoa das demais construções, mas também pelas condições precárias do imóvel. Essa mesma casa é conhecida como a primeira construção de Juiz de Fora. Erguida ao longo do século XVIII, com a abertura do Caminho Novo, a Fazenda da Tapera guarda resquícios de uma outra época e, pelo seu valor histórico e ambiental, foi tombada em 1990 como patrimônio público municipal. No entanto, toda a memória que o local carrega corre o risco de se perder devido à atual situação de abandono em que o casarão, de propriedade da Santa Casa de Misericórdia, se encontra.

As janelas quebradas, algumas sem vidros, a pintura danificada e as rachaduras visíveis afastam a imagem original da casa. A antiga Fazenda da Tapera, também chamada de Fazenda do Alcaide-Mor, foi erguida às margens do Caminho Novo da Estrada Real em estrutura de madeira vedada com pau-a-pique. A construção foi de propriedade de algumas famílias desde sua criação e, na década de 1950, foi doada à Santa Casa, sendo acordado que a instituição deveria “manter e conservar sem modificar ou transformar a sede doada, cuidando dela como patrimônio histórico da cidade de Juiz de Fora e da família Tostes e Tristão”, além de “manter um serviço de assistência às crianças desamparadas e aos velhos doentes” (Decreto, Nº 4335, 1990).

PUBLICIDADE

Levando isso em consideração, a Associação Feminina de Prevenção e Combate ao Câncer (Ascomcer), após acordo com a Santa Casa, funcionou por 20 anos na Fazenda da Tapera, oferecendo serviços a pacientes em situação de vulnerabilidade social. Aquela foi, entretanto, a última funcionalidade do local. Desde então, o equipamento segue sem manutenção e sem uso. Uma tentativa de mudar essa realidade foi anunciada em 2012 pela Santa Casa por meio de um projeto de conservação e restauração da edificação, elaborado pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Na época, a obra foi orçada em cerca de R$ 3,5 milhões, de acordo com artigo publicado pelo Conselho Internacional de Monumentos e Sítios. No entanto, a reforma não saiu do papel.

PUBLICIDADE
Estrutura metálica protege uma das edificações que fazem parte do conjunto arquitetônico da Fazenda da Tapera (Foto: Felipe Couri)

Um novo olhar para a Tapera

Uma das coordenadoras do projeto de restauração, a professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFJF Mônica Olender, lamenta que a ideia não tenha tido continuidade. “Para além da questão da preservação desse bem, que é importantíssimo para Juiz de Fora, o fato de ser o edifício mais antigo e ainda estar de pé já justifica qualquer ação de preservação desse elemento histórico. E, fora isso, ele não está agregado apenas por valores históricos, mas também por valores arquitetônicos, urbanísticos, estéticos, artísticos e sentimentais, pois não se pode esquecer desse viés, a Fazenda faz parte do cotidiano das pessoas.”

O projeto foi desenvolvido a partir de três pilares: conservação, restauro e intervenções contemporâneas. A professora explica que restaurar é recuperar algo que foi perdido, mas a proposta também visava agregar novos elementos para compor aquilo que já existia sem perder a autenticidade, ou seja, as marcas do tempo que estão impressas no edifício. Inicialmente, a proposta era usar o local para fundar o Centro de Conservação da Memória da UFJF. A ideia também propunha transformar a Fazenda em um espaço multiuso com exposições, oficinas e café. Porém, o termo de cessão de uso não foi estabelecido, e o Centro acabou sendo criado no antigo prédio do Diretório Central dos Estudantes (DCE), na Avenida Getúlio Vargas.

PUBLICIDADE

Pertencimento

Embora a Fazenda da Tapera não tenha dado vida ao centro de memória, o local ainda segue de pé com um grande potencial de abrigar novas histórias. Para a arquiteta, a construção gera um sentimento de pertencimento, identificação e conforto para os moradores do entorno, já que o casarão faz parte do cotidiano daquelas pessoas. Porém, mais do que isso, a Fazenda da Tapera está ali há séculos, diferentes gerações conviveram, criaram cotidianos e relações com aquele lugar, por isso, sua conservação é fundamental.
“A importância figura, principalmente, no sentido de considerar a preservação do patrimônio como algo que contribui para o bem-estar da população. Muita gente entende a preservação como uma questão que é romantizada inclusive, que é algo que se volta para o passado apenas e na perpetuação de algo que é material. Mas não é só isso. O patrimônio faz parte do dia a dia das pessoas. Então, não é uma questão só de se pensar no passado, mas de se pensar no presente, porque são elementos que estão aqui hoje, são elementos dos quais nós temos o direito de usufruir”, afirma Mônica.

PUBLICIDADE

‘É um espaço que merece a atenção do município’

A arquiteta aponta que ações imediatas para preservar o espaço como uma paisagem que compõe uma parte da cidade são extremamente necessárias. “Realmente é uma lástima não termos conseguido tocar esse projeto, porque ele não só teria promovido a recuperação deste edifício, que por si só nos diz a sua importância, mas também teria possibilitado uma área de ensino e aprendizagem maravilhosa, atendendo a UFJF, Juiz de Fora e a região. Então, eu espero que, em algum momento, nós ainda consigamos tocar essa ou qualquer outra ideia para frente, porque realmente é um espaço que merece a nossa atenção, que merece a atenção do município”, ressalta.

A preservação do patrimônio é um direito garantido pela Lei n° 25, de 1937, e cabe ao proprietário manter esse bem. Porém, Mônica explica que, se o proprietário não tiver condições de garantir que a edificação permaneça em bom estado, o Poder Público deve ser acionado e, a partir daí, se tornar copartícipe. Mas isso só é possível se realmente for comprovada a impossibilidade de manutenção do bem pelo proprietário. “Se ele não consegue manter, então ele precisa procurar maneiras de, a partir da participação de setores públicos, tentar conseguir a recuperação do bem.”

Santa Casa e PJF

PUBLICIDADE

A reportagem procurou a Santa Casa de Misericórdia, questionando a atual situação do imóvel, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição. Já a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) disse, por meio de nota enviada à Tribuna, que o principal responsável pela conservação da Fazenda é o hospital e que, no caso de omissão ou descaracterização do bem, o proprietário fica sujeito às penalidades previstas na Lei 10.777/2004, incluindo possibilidade de multa. A PJF não respondeu se houve alguma providência ou penalidade no caso da Fazenda da Tapera.

Sair da versão mobile