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Praças sem atrativos estão esvaziadas em Juiz de Fora

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Foto: Fernando Priamo
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Ano após ano, grande parte das 170 praças de Juiz de Fora vai se esvaziando em decorrência do abandono e da falta de atrativos. Diante da reclamação vinda de vários pontos da cidade, a Tribuna percorreu alguns logradouros onde encontrou mato alto, desníveis em pisos, parquinhos sem brinquedos, telas das quadras com danos, buracos, entre outros problemas.

A praça, de forma geral, sempre esteve presente na história das cidades como lugar democrático, com funções que variam ao longo do tempo. Isto é o que lembra a professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Centro de Ensino Superior (CES) Aline Cruz, que também é vice-presidente do núcleo regional do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) e doutoranda em Urbanismo pela UFRJ. “Elas já foram espaço de trocas de mercadorias, de demonstrações de poder, de eventos religiosos, esportivos, entre outros. A forma da praça, seu desenho e seus equipamentos de suporte precisam atender a este desejo de encontro. Seu programa de atividades e funções pode variar, mas são espaços que garantem o exercício da cidadania, representam o espírito da coletividade, além de serem elementos paisagísticos de forte caráter identitário de um lugar. Na contemporaneidade, continuam a oferecer esta oportunidade de apropriação por parte da população e ganham maior relevância com o crescimento urbano e adensamento populacional.”

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Para Aline, “as pessoas continuam querendo se encontrar, ver, serem vistas e participarem das trocas sociais características dos centros urbanos. Assim também os espaços de entretenimento privado, como shopping centeres, clubes, entre outros equipamentos, tampouco são responsáveis pela decadência de praças e parques. Me parece que são os suportes presentes/ausentes nesses lugares públicos é que precisam estar mais adaptados ao perfil do público que pretende atender.” Para a professora, isso fica evidente na forma como esses equipamentos se apresentam, já que a configuração das praças de Juiz de Fora, seus desenhos e atividades são muito semelhantes, quase um padrão, independente do local em que estejam e da comunidade a que servem. “Essa padronização ignora a diversidade do local e falha em compreender as necessidades de quem usa.”

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O desafio de fazer a população se apropriar

Na Praça da Baleia, no Bairu, Zona Leste, o aposentado Gilson Coelho vai apontando uma série de problemas com os quais tropeça, literalmente, todos os dias. Embora diga que está sempre na praça, cuidando do que pode, afirma que gostaria de ver as pessoas se envolvendo mais com o espaço. “Algumas pessoas, às vezes, trazem as crianças, mas não cuidam. Vemos muito lixo jogado. As lixeiras transbordando. Os donos de cães que usam o Parcão não limpam a sujeira que eles fazem. Há muitas coisas a se fazer, mas sei que brigar não adianta.”

Já no Bairro Industrial, na região Norte, a falta de atrativos também foi citada pelo crediarista Matheus Silva, morador do local, sobre a Praça Adalberto Landau. “Não tem nada aqui para fazer. Apenas no início da noite, quando alunos da Escola Estadual Professor José Freire saem da aula é que tem mais movimento. Eles costumam ficar um pouco na praça antes de ir embora.” Em nota enviada pela Empav, responsável pela manutenção das praças, é reforçada a importância de a comunidade cuidar dos espaços públicos, não degradando e nem sujando, pois são áreas de lazer em benefícios da própria comunidade. O Demlurb também ressalta que há medidas que precisam ser adotadas pela população para evitar os problemas identificados durante as visitas às praças. “É fundamental que os moradores depositem o lixo domiciliar em frente às suas residências, respeitando os horários e dias de coleta de cada bairro. A conscientização da comunidade é importante, inclusive, para a otimização de recursos financeiros e humanos, além de ser primordial para a conservação dos espaços públicos e de uso comum.”

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Fazer as pessoas se apropriarem das praças é algo desafiador, na opinião da professora Aline Cruz. “A apropriação se dá na medida em que as pessoas se afeiçoam pelo lugar, se sentem donas dele. E isso não acontece de forma automática, mas precisa ser estimulado nos processos de tomadas de decisão com a participação da população, seu engajamento na definição de como melhor aproveitar esses espaços.” Segundo ela, esse processo diz mais a respeito das pessoas do que do próprio espaço físico. “Acho que as praças precisam refletir no seu espaço as mudanças culturais da sociedade a que serve. A capacidade de adaptação a diferentes atividades, por exemplo, é uma característica das praças secas medievais muito pertinente na contemporaneidade, onde há uma sobreposição de usos e públicos e onde as demandas se alternam com grande velocidade.”

Adoção de praças

O Município já tem leis que fomentam o uso das praças pela iniciativa privada. Em fevereiro deste ano, a Prefeitura sancionou mudanças nas regras aprovadas pela Câmara. A nova política define como objeto o incentivo à utilização das áreas por parte da população e de associações desportivas, de lazer e culturais, e à possibilidade que grupos organizados da população elaborem projetos dos espaços em questão. A exploração dos espaços poderá acontecer de duas maneiras: a adoção não onerosa e a adoção onerosa com exploração comercial. Neste caso, o adotante tem algumas contrapartidas.

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Cumprir a função do lazer público

Juiz de Fora tem 170 praças e 250 logradouros, como canteiros, que dependem de manutenção, feita por programação semanal. De acordo com a Empav, esse trabalho é realizado diariamente, buscando atender todas as regiões. “No verão, devido à combinação de chuva e sol, o mato cresce mais rápido (a cada 15 dias mais ou menos), o que dificulta o atendimento imediato de todos os lugares. Mas a Empav não tem medido esforços para atender o mais rápido possível as localidades, dentro da capacidade operacional das equipes. Um técnico da Empav fará uma vistoria nos locais citados na reportagem. Onde houver necessidade de revitalização, que é uma intervenção maior, a mesma será feita conforme disponibilidade orçamentária/financeira.”

A professora Aline Cruz salienta que essas 170 praças são nomeadas como tal, mas não cumprem, necessariamente, a função de lazer público destinado ao cidadão. “No Brasil chama-se praça os espaços ajardinados e gramados, independente da função que desempenhem. Esta caracterização de cada espaço é fundamental para o planejamento de sua manutenção. Há também casos em que os mobiliários, piso e vegetação não têm uma especificação correta e, portanto, demandam manutenção maior que o necessário.” Ela ainda sugere ações envolvendo população, corpo técnico capacitado e vontade política para que seja possível melhorar a qualidade nesses espaços. “Usar a tecnologia para ouvir a população e monitorar a necessidade de manutenção de algumas áreas, definindo prioridades; fazer diagnósticos corretos para melhor embasar os projetos que venham a alterar as características físicas das praças e estimular o poder público a compreender a importância das praças para a qualidade de vida da população.”

 

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Praça Prefeito Olavo Costa, Bairu

 

NA praça da baleia, no Bairu, galho caído é mais um sinal do abandono (Foto: Marcelo Ribeiro)

Na Praça Prefeito Olavo Costa, conhecida como Praça da Baleia, há uma árvore cujas raízes romperam o piso, abriram, cobriram e se espalharam por boa parte. Fora esse ponto, há muitos outros irregulares ou com desníveis. “Quem quer correr ou caminhar tem que passar pela rua”, salienta o aposentado Gilson Coelho. Vendo alguns problemas, ele mesmo fez algumas intervenções. Quando a equipe da Tribuna chegou ao local, havia um galho caído e outro por cair. Ele isolou a área com uma fita, para que ninguém se machucasse. “Também mexi nos aparelhos da academia ao ar livre, porque tinha algumas peças que poderiam ajudar. Mas tem danos que eu não consigo dar jeito. Também quebraram o portãozinho do parque das crianças, mas, por mais que eu peça à Prefeitura, eles não mandam alguém para ver.” As lixeiras estavam transbordando muito lixo, que também se acumulava em pontos do chão. O cheiro era forte e havia grande quantidade de moscas em volta delas. Em nota, o Demlurb informa que o responsável pela varrição foi até as praças e realizou a limpeza, na terça-feira (19).

 

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Praça José S. Sobrinho, Costa Carvalho

 

Na quadra, as telas estão danificadas e o chão, esburacado, forma poças (Foto: Marcelo Ribeiro)

O local onde havia um parquinho para crianças está sem brinquedos. A área que é envolta por um pequeno muro está tomada por mato alto e há vários sinais de permanência de pessoas, como roupas, sapatos, preservativo, entre outros objetos jogados. Na quadra, as telas estão danificadas e o chão, esburacado, forma poças.

 

Quadra na Rua Olga Burnier, Aracy

 

Quadra na Rua Olga Burnier, no Bairro Aracy, está suja, com mato no entorno e sem condições de uso (Foto: Marcelo Ribeiro)

Havia mato alto pela quadra. O local estava cheio de caramujos, como contou a dona de casa Maria da Conceição de Souza. “Quando a quadra está limpa, ela é muito utilizada. Os meninos vêm brincar, jogar bola, as pessoas traziam seus cachorros para passear, tinham algumas pessoas que também faziam caminhadas. Mas elas se afastaram, por causa do mato e dos caramujos. A demora fez com que o pintor industrial Amauri de Paula Braz e seu irmão se mobilizassem para limpar o espaço. “Foram três dias de serviço para dar conta de tudo”, ressalta ele.

Sem o mato e sem os caramujos, foi possível perceber os danos que estavam escondidos. Há muitos pontos em que o piso está quebrado. A mureta que margeia a quadra é baixa e não há alambrados. “Os meninos têm que tomar muito cuidado, mas, mesmo assim, as bolas caem nas casas dos vizinhos, vão para as ruas e, dependendo de onde elas caem, não tem como pegar. Como fica em um lugar alto, se eles se aventuram, podem acabar correndo muitos riscos”, frisa Amauri. Ele imagina que, se o espaço recebesse outros equipamentos, como as academias a céu aberto, poderia agregar mais usuários.

 

Praça da Rua Tupinambás,Vila Ozanan

 

Banco quebrado é um dos problemas da praça da Rua Tupinambás, na Vila Ozanan (Foto: Marcelo Ribeiro)

O mato alto, que havia na praça da Rua Tupinambás, foi cortado. Mas de acordo com os moradores do entorno, depois de dez dias que as equipes da Prefeitura passaram para fazer a manutenção, parte do mato retirado continuava empilhado em um canto. “Parece que não coube no caminhão que veio buscar os resíduos. Mas o problema é que parte da população também não coopera, aproveita o mato e descarta outras coisas. Jogam sofá e até objetos mais pesados”, mostra o aposentado Marco Antônio Ribeiro.

“Há muita falta de educação. O caminhão do Demlurb passa três vezes por semana, não tem necessidade de descartar fora do dia. Muitas vezes, nós que moramos mais perto é que temos que fazer a limpeza, porque incomoda muito e pode atrair doenças”, conta o mecânico Carlos Alberto da Silva Vasco. Ele também ressalta que outros equipamentos da praça também precisam de atenção. “Os arames da quadra estão soltos. A marcação do chão está muito apagada, precisamos de uma pintura e de cuidado básico, porque há bastante tempo ela está abandonada.” Assim como na Praça da Baleia, o Demlurb informou em nota que fez a varrição e a limpeza dessa praça;

 

Praça Adalberto Landau, Bairro Industrial

 

Balanço do parquinho já não existe na Praça Adalberto Landau, no Bairro Industrial (Foto: Fernando Priamo)

Onde um dia existiu um balanço, há agora só o esqueleto da estrutura e, nela, um crânio de um animal. A mensagem deixada é simbólica porque mostra que a deterioração de algumas estruturas está diretamente relacionada à forma como as pessoas enxergam os espaços públicos. Há sujeira espalhada por boa parte da extensão do equipamento, além disso, os brinquedos, de madeira, também estão muito danificados. Lixeiras quebradas, a tela que envolve a quadra toda cheia de danos. Enquanto a equipe da Tribuna estava na Praça Adalberto Landau, um técnico fazia um reparo em uma das lâmpadas. “A iluminação ficou cerca de duas semanas sem funcionar”, diz o crediarista Matheus Silva, morador do Bairro Industrial. Ele destaca que a falta de atrativos pode influenciar nessa situação.

 

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