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A busca da esperança em tempos de pandemia

vela natal luzes esperanca by fernando priamo
Cada pessoa tem um jeito de encontrar uma saída, de “ligar” a esperança, de buscar uma solução, mas é preciso tentar (Foto: Fernando Priamo)
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É difícil pensar em um Feliz Natal, quando se sabe que há quase 185 mil vidas ceifadas no Brasil por conta do coronavírus. Na cidade, já são quase 500 vítimas fatais. Vemos a taxa de ocupação de leitos e o número de novos casos confirmados alcançarem novos recordes dia após dia, depois de testemunharmos a ocorrência de um platô nos números, durante os últimos meses. Além disso, a cidade perdeu mais de 5 mil postos de trabalho ao longo do ano. Também não há garantias de que uma vacina comece a ser disponibilizada para a população tão cedo. O véu de incertezas que cobre o mundo, deixa a visão turva, faz com que não consigamos enxergar luz no horizonte.

Semanas depois do primeiro caso relatado em Wuhan, na China, o mundo inteiro conheceu, aos poucos, os efeitos devastadores do vírus. O primeiro caso confirmado no Brasil foi o de um homem em São Paulo, que tinha voltado de viagem à Itália há pouco tempo, no dia 26 de fevereiro. Em Juiz de Fora, o primeiro caso foi registrado em 14 de março. Ainda nesse mês, as recomendações de distanciamento social, limpeza de superfícies e uso de máscaras se tornaram as principais medidas de prevenção à doença.

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Veio então o medo do contágio, o distanciamento social, a diminuição da renda, o corte dos postos de trabalho e o temor pela perda de membros da família e da comunidade. Em alguns países, as fronteiras foram fechadas e foi preciso adotar um confinamento mais rígido. Cada um desses agravantes deixou a população com um sentimento de terra arrasada. Diante de todo esse contexto, a Organização Mundial da Saúde (OMS) formalizou um alerta para não só se reforçar o combate ao coronavírus, mas também para aumentar o investimento em saúde mental.

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Por outro lado, nos últimos nove meses, em que boa parte da população se manteve em quarentena, algumas imagens foram fundamentais para uma centelha de esperança se mantivesse acesa. Como as de pacientes que saíram das unidades de saúde com uma placa afirmando que venceram a Covid-19; dos encontros on-line, que ajudaram a diminuir um pouco a saudade do convívio; as inúmeras campanhas e ações solidárias que se multiplicaram em todo mundo para atender as pessoas em situação de vulnerabilidade. Também marcaram as imagens de educadores e estudantes conseguindo vencer as barreiras e dificuldades do ensino remoto, e a dos pesquisadores que se apressam para dar andamento aos estudos que devem gerar vacinas em tempo inédito de desenvolvimento, como parte importante da solução.

Uma maneira de ‘ligar’ a esperança

Mais do que por meio de imagens, cada indivíduo tem uma maneira própria de ‘ligar’ a esperança. De acordo com o professor do Departamento de Psicologia da UFJF, Telmo Ronzani, é preciso incentivar o fortalecimento desse sentimento.” De alimentar uma esperança que se liga a situações que ajudem a enfrentar a adversidade. Ajude a ver e encontrar saídas e alternativas.”

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Nesse sentido, o infectologista e professor da Faculdade de Medicina da UFJF, Ronald Roland destaca que essa esperança precisa ser calcada em recomendações sobre dados reais. “Quando você tem a esperança de que pode conseguir contornar uma situação difícil, acho que criamos uma possibilidade de trabalhar mais, lutar mais, fazer um esforço físico, fazer um esforço intelectual, fazer alguma coisa para suportar melhor a ansiedade, a depressão. Ficar em casa e ter resignação e resiliência, porque sabemos que podemos superar isso.”

Exemplo disso é o esforço que escritores, músicos, artistas de todas as vertentes, tão impactados pela impossibilidade de contato físico com o público, objeto direto de seu trabalho, que perseveram na intenção de apontar pontos de luz, nos quais alguma esperança brilha. “Estamos reinventando a esperança. O próprio fato de estarmos procurando inspiração, procurando criar, procurando produzir já é algo a se inspirar. Há essa insistência, quase teimosia e a recusa em desistir, que também é um traço da esperança”, afirma a poeta e professora Laura Assis.

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‘Precisamos cavar a esperança e cavar a providência’

O professor do Departamento de Ciências da Religião, Faustino Teixeira, cita a fala do personagem Riobaldo, do Grande Sertão Veredas, de Guimarães Rosa, para exemplificar o desafio de manter a esperança acesa. No trecho, Riobaldo explica que é preciso saber em que cavalo montar. Se for o da alegria, ele vai levar a pessoa para a alegria, da mesma forma, se a pessoa montar o cavalo da tristeza, vai chegar à tristeza. “Nesses momentos sombrios, temos que saber em que cavalo a gente vai montar. Mais do que fundamental para que não se apague essa luzinha interior que nos mantém animados e resilientes, é preciso saber escolher o cavalo da alegria.”

Faustino também se lembra de uma frase de um poeta muçulmano chamado Jalal ud-Din Rumi. Que diz: “Para mudar a paisagem, basta mudar o que sentes.” Que incentiva a não deixar que os sentimentos sejam prejudicados pela tristeza. “Temos que tentar lutar contra a adversidade e acreditar que é possível um caminho diferente, que ele é viável, e que temos que organizar as nossas forças interiores para vencer as barreiras e poder comunitariamente superar o desafio.”

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Para o professor, a esperança precisa ser irradiada, não pode ser vivida solitariamente. “Precisamos cavar a esperança e cavar a providência. Temos que ajudar as pessoas a assumir o compromisso, o cuidado e a atenção consigo e com os outros, para que essa realidade não se dissemine de tal forma que inviabilize qualquer potencialidade de esperança”, pontua Faustino.

Esse tipo de ação coordenada só é possível, conforme um dos idealizadores do Projeto Dom, Edmar Cassimiro, se as pessoas se dedicarem a entender melhor o que ocorre no entorno, buscando se integrar e fazer o melhor por todos. “Essa pandemia trouxe muitos ensinamentos. Especialmente a olhar para o próximo, entender como a vida tem importância. Às vezes, ficamos tão presos ao material, ao poder aquisitivo, que surge um vírus para ensinar que tudo isso pode acabar rapidamente.” Por isso, segundo Edmar, precisamos, acima de tudo, lançar um olhar mais cuidadoso para o próximo. “O pós-pandemia é um recomeço, uma adaptação, as coisas vão se transformar e precisamos estar preparados, unidos e fortes para quando esse tempo chegar.”

 

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“A ESPERANÇA é o que mantém a gente em pé. É o sentimento principal quando estamos passando por grandes adversidades, como a pandemia. A esperança mantém um horizonte na frente, para que tenhamos um caminho e alguma perspectiva para sair desse cenário. Em função disso, é importante o incentivo para continuar em frente, com uma esperança que não nos aliene, mas que nos ligue, justamente, ao que nos leva a enfrentar a adversidade. No caso da pandemia, a esperança é um sentimento que ajuda a pensar alternativas, algumas saídas, inclusive, nos leva a nos reorganizarmos como sociedade e como indivíduo. A esperança é o guia que vai nos nortear. Por isso, é muito importante que ela nos leve mais em direção a uma mudança, do que à resignação e do conformismo com a situação. É o que move em direção à utopia de um mundo melhor e para a solução dos problemas que a gente tem enfrentado ao longo desse ano, com a Covid.” Telmo Ronzani, professor do Departamento de Psicologia da UFJF

 

“A ESPERANÇA sofre um impacto. Estamos vivendo um momento de sombra e não de luz, sobretudo, o fato de as pessoas ficarem presas dentro de casa, sem poder sair. Muitas pessoas que não estão acostumadas a viver no mundo interno da família, internamente na casa. Isso suscita conflitos, tensões, o grau de nervosismo aumenta. Tudo isso incide no agravamento da situação pessoal, da situação comunitária, da situação coletiva. Uma das dimensões importantes nos momentos de crise é acender a luz da esperança. Ela é um recurso fundamental, de poder acreditar que a situação que você vive, apesar de dolorosa e difícil, é passageira. Acima de tudo, eu acredito que as pessoas que têm uma espiritualidade, ou uma experiência religiosa, ou espiritual forte, não necessariamente religiosa, mas tendo valores que são consolidados, ou são firmados em um tipo de vida determinada, têm maior potencial de resiliência para lidar com essa dor. Saber, de certa forma, dançar sobre os escombros e ser capaz de ver adiante, ver além desse mundo sombrio que nos temos nessa pandemia de Covid-19.” Faustino Teixeira, professor do Departamento de Ciências da Religião da UFJF

 

“É fundamental, diante de qualquer dificuldade, ou obstáculo, as pessoas preservarem essa ideia de que se pode vencer, que se pode mitigar efeitos negativos de qualquer situação. Acho que isso é fundamental para que a gente possa superar qualquer problema, principalmente os de maior dificuldade. Temos que ter uma esperança fundamentada, embasada em fatos concretos, para que a gente possa se movimentar. Estamos em um momento de profunda reflexão de valores, que faz com que nós, respeitando a individualidade de cada um, possamos entender a necessidade de procurar ter na sociedade uma proposta de trabalho com um fim comum mais definido. Hoje temos que pensar mais do que em nós, mais do que somente o grupo que a gente frequenta, mais do que na cidade, no estado e no país. Precisamos pensar no planeta como um todo. A grande ESPERANÇA que tenho é que essa transformação ocorra, que a gente entenda o valor do trabalho de cada um, e que, com isso, possamos trabalhar um pouco mais na esperança que tudo isso ocorra e que a gente não deposite nossa esperança exclusivamente na vacina, porque ela vai ter um papel, mas vai ser no médio prazo.” Ronald Kleinsorge Roland, médico infectologista e professor da UFJF

 

“É difícil, mas cada um está encontrando a ESPERANÇA em algum lugar. Seja no outro, seja na própria arte. Tivemos que criar novas possibilidades ou recorrer a coisas que estavam meio esquecidas. Às vezes, com a ajuda da tecnologia, às vezes voltando mais para si mesmos. Fomos testando e tentando. Parece que estamos passando por uma provação que não acaba, mas há certa insistência em insistir que amanhã vai ser melhor. Tenho visto a esperança no meu cotidiano, em alguns laços que se fortaleceram entre as pessoas que estão escrevendo ou estão tentando produzir algum tipo de arte nesse período, apesar de tudo. Existe uma tentativa de resistir pelas vias da criação e da produção artística. Tenho visto também entre os meus alunos, mesmo a distância, uma tentativa de estar perto, de se aproximar, de estar em contato com o outro, mesmo pela tela, por uma conexão ruim, um áudio que não dá para ouvir direito. Tentamos refazer o significado da esperança de acordo com o contexto que estamos passando. Estamos vivendo algo que a gente nunca imaginou. O que pensávamos ser a esperança há um ano, hoje é algo completamente diferente. Estamos reinventado esse sentido.” Laura Assis, poeta e professora

 

 

“É algo profundo mesmo. Parte da real visualização do quanto nós periféricos, nós negros, da classe pobre, estamos à mercê do que temos de direito vindo do Poder Público. Nossas necessidades são sempre as últimas a ser vistas. Quando começamos a ver o número crescente de casos de Covid-19, nós, enquanto projeto social, voltado para a sociedade, corremos para que isso não nos afetasse tão fortemente, quanto o que estava ocorrendo em outros países. Quando a doença chegou forte no Brasil, começamos a ver os casos e ficamos preocupados com a paralisação geral das escolas, dos serviços de convivência e dos projetos sociais. Nós voltamos todo o nosso olhar para a solidariedade. Enxergamos que precisávamos descruzar os braços e fazer algo em prol de quem está sempre às margens. ESPERANÇA, então, é acreditar, sempre estar com foco. Ter um propósito é o que nos segura. Acho que é dar as mãos. Um se apoiar no outro e crescer juntos. Não pensar só no indivíduo. Esperança é passar por um período tão complicado e saber que vai superar, porque uma hora tudo vai passar e aí precisamos ter muita fé e muita garra para segurar a onda.”  Edmar Cassimiro, um dos idealizadores do Projeto DOM

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