Ícone do site Tribuna de Minas

Agentes denunciam situação precária de Centro Socioeducativo e uso de drogas na unidade

PUBLICIDADE

A rebelião ocorrida no Centro Socioeducativo Santa Lúcia, localizado no Bairro Santa Lúcia, Zona Norte, na noite desta terça-feira (23), foi o estopim para que agentes socioeducativos denunciassem a situação crítica que vive a unidade onde estão adolescentes que praticaram atos infracionais. Projetada para abrigar 56 jovens, o local conta atualmente com cerca de 95 oriundos de Juiz de Fora, cidades da região e do Sul de Minas. O déficit de agentes socioeducativos deixa em alerta a Associação do Sistema Socioeducativo e Prisional de Juiz de Fora (Assprijuf), que vislumbra o dobro do efetivo atual para que a instituição funcione de forma adequada. A entidade sindical ainda pontua que, além da carência de servidores, o descaso no planejamento das férias dos funcionários contribui ainda mais com o baixo efetivo.No mês de março, como estimou o sindicato, cerca de 30% da força de trabalho teriam entrado de férias, reduzindo de forma perigosa o número de servidores para a manutenção da rotina com segurança. A falta de atividades profissionalizantes dentro da unidade é outra grave denúncia, uma vez que seria motor para a eclosão de diversos conflitos, que são agravados pela constante entrada de drogas no estabelecimento.

A situação, classificada como um barril de pólvora, levou o Sindicato dos Servidores Públicos do Sistema Socioeducativo do Estado de Minas Gerais (Sindsisemg) a comunicar a situação oficialmente à Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo (Suase), reivindicando providências urgentes para a recomposição do quadro de agentes socioeducativos e da direção da unidade, tendo em vista as fugas recorrentes.

PUBLICIDADE

Um dos documentos enviado à Suase é datado de um dia antes da última rebelião, ocorrida no pavilhão 1, que culminou com a fuga de um adolescente infrator e com agressão contra três agentes. Na denúncia elaborada pela Sindsisemg, consta que servidores vêm cobrando uma posição do sindicato, uma vez que a situação estaria crítica e que diversos agentes já tinham se tornado reféns dos adolescentes que empreenderam fuga nos últimos meses. Ainda neste documento de 22 de maio, o órgão sindical anexou uma série de denúncias que já haviam sido feitas à Suase em fevereiro.

PUBLICIDADE

Com a fuga da última terça, já são 11 evasões em menos de dois meses. “A situação é caótica. Há um risco real de morte, tanto para nós, como para os acautelados. Pode acontecer uma coisa grave a qualquer momento. Os internos já perceberam quais são nossas fragilidade hoje. Estamos denunciando para evitar uma tragédia. Se nada for feito, se não mudar a gestão e a forma como trabalham, a tendência é piorar”, disse o membro da Assprijuf e funcionário da unidade, Aristides Consenday.

 

PUBLICIDADE

Dois agentes feridos no tumulto

Dois agentes precisaram de atendimento médico após a confusão do último dia 23, que ocorreu em uma sala de TV no pavilhão 1. No local estavam 11 internos e cinco agentes. Em dado momento, um dos adolescentes pediu para usar o banheiro no lado de fora do cômodo. Quando retornou, por volta das 22h, os acautelados renderam os agentes e começaram a agredi-los. Um dos internos agrediu com um soco no nariz um dos funcionários, de 35 anos, e outro, armado com cabo de vassoura, bateu em sua mão. Outro agente, 38, relatou que foi agredido com empurrões e um terceiro foi atingido por chutes. Como eles não podem usar nenhum tipo de arma, tiveram dificuldade para conter os adolescentes.

Para cessar o tumulto, a PM precisou entrar no local e realizar disparo de bala de borracha. Foi utilizada também granada de luz e som para tentar dispersar a confusão. Mesmo com a presença policial, um dos acautelados, 17, que havia cometido um homicídio, conseguiu fugir pulando um dos muros. Outro adolescente, também de 17 anos, tentou fugir, mas foi flagrado por agentes. “Eles se armam, usam qualquer objeto para tentar nos ferir. Como trabalhamos desarmados, não há muito o que ser feito. Ontem (terça), evitamos uma tragédia. Poderia ter sido muito pior. E mesmo com o quadro de defasagem de pessoal, a direção nos obriga a colocar em risco nossas vidas e a dos garotos e fazer este tipo de atividade recreativa, que poderiam deixar de ser feitas, pelo menos até o quadro ser reposto”, considera Aristides.

PUBLICIDADE

O agente Carlos Eduardo Baldioti também reclamou da falta de segurança para realizar algumas atividades “Os agentes estão com medo de trabalhar. A direção quer nos obrigar a manter uma rotina de atividades que é insustentável hoje. Como consequência, temos essas fugas em série. Todos estão em risco, inclusive a sociedade, já que infratores perigosos retornam às ruas.”

Outro ponto apontado pelos agentes como crucial para a falta de segurança na unidade, é a estrutura defasada para abrigar tantos internos. “A enfermaria, por exemplo, é usada como cela. O local tem fácil acesso à área externa. As salas de aula também não abrigam mais a quantidade de acautelados que temos hoje. Então, para todos terem a assistência pedagógica, as salas são lotadas, e com poucos agentes para tomar conta”, disse um funcionário que não quis ser identificado.

O presidente da Assprijuf, Wanderson Pires, vê com preocupação o quadro vivido atualmente no Socioeducativo. ” Fomos impedidos de entrar durante as visitas com a Comissão de Segurança da Câmara Municipal. Vamos apurar mais a fundo esta situação. Só este número alto de evasões mostra que alguma coisa grave está ocorrendo.”

PUBLICIDADE

Entrada e o consumo de drogas e falta de medidas socioeducativas

O documento enviado à Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo (Suase) em fevereiro traz uma série de denúncias relativas ao Centro Socioeducativo. Uma delas aponta que frequentemente internos são flagrados entrando e consumindo drogas, porém, “quando a equipe de segurança atua e faz apreensões, não é dado pela gestão o encaminhamento legal cabível”, aponta o relatório, acrescentando que a única providência institucional tomada até o momento foi a elaboração de um documento, no qual solicita aval da Vara da Infância e da Juventude para realizar exame de raio x e ultrassom nos adolescentes no caso de suspeita de ingestão de drogas no retorno da visita sociofamiliar.

“Essa seria uma das providências, mas parou-se por aí. As equipes não são orientadas na atuação desta irregularidade e não há intervenções efetivas, tanto correcionais quanto pedagógicas junto aos adolescentes sobre o consumo de drogas”, assinala o relatório. Para os agentes, tal posicionamento contribui para que os casos se repitam, já que os garotos sabem que não serão punidos. O documento, de sete páginas, traz ainda diversos pontos que mostram insatisfação dos agentes com a direção.

Conforme agentes que trabalham na unidade, faz cerca de um ano que os internos não contam com nenhuma atividade socioeducativa, como cursos profissionalizantes. Segundo eles, na gestão anterior, havia diversas parcerias com empresas e outros órgãos que possibilitavam os acautelados a se profissionalizarem e terem acesso a cursos, por exemplo. “Hoje eles ficam ociosos a maior parte do tempo, não estão sendo cumpridos os eixos socioeducativos e estão sendo prejudicados. Só assistem às aulas pela manhã. É uma situação grave, que mostra que eles não estão sendo recuperados”, disse um agente.

PUBLICIDADE

A Suase ressalta que está enviando esforços para garantir a recomposição de quadros do sistema socioeducativo. A quinta turma de aprovados no concurso para o posto de agente de segurança socioeducativo da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp) tomou posse na última terça-feira, 23, e tem a previsão de seis agentes para a região de Juiz de Fora. Desde o início do processo, já são 25 novos profissionais. Por meio de nota, a Suase informou ainda que está acompanhando os eventos de segurança e avaliando todas as variáveis possíveis para estabilização do quadro.

 

Onda de fugas nos últimos meses

No último sábado (20), dois adolescentes, ambos de 17 anos, renderam funcionários e conseguiram fugir do local. De acordo com informações da Polícia Militar, a fuga aconteceu quando dois agentes, de 23 e 36 anos, foram até uma das celas para entregar um artesanato a um dos garotos que fugiram. A entrega teria sido um pedido de outro interno.
Em 1º de maio, três adolescentes acautelados fugiram. De acordo com informações da PM, eles teriam pulado o muro da unidade, por volta das 16h30. O trio teria fugido sentido a Avenida JK, na mesma região. Um dos adolescentes, 17, foi capturado momentos depois da fuga. Os outros dois foram pegos no final da noite, enquanto foram vistos pulando o muro de uma escola no Bairro Nova Era. Os três jovens eram de Cataguases.

Já no dia 3 de abril, cinco jovens, com idades entre 15 e 18 anos, conseguiram escapar. Segundo a Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp), os acautelados voltavam para o alojamento depois de uma atividade na quadra poliesportiva, quando correram em direção à portaria armados com pedaços de madeira e materiais perfurantes. Os agentes socioeducativos que faziam a escolta dos jovens não conseguiram contê-los. Antes dessa recente onda de fugas, a última ocorrência desse tipo divulgada à imprensa foi em setembro de 2016, quando um adolescente, 17, conseguiu escapar.

 

 

 

 

Sair da versão mobile