Quando atendeu a reportagem da Tribuna por telefone, a paciente Rosângela de Fátima Fuzário, de 47 anos, moradora de Matias Barbosa, lavava roupas e organizava a casa, atividades que eram impraticáveis para ela há alguns meses. Hipertensa há 26 anos, ela conta que viveu uma vida com limitações. “Eu não conseguia, por exemplo, subir um morro, ou mesmo ir até a casa da minha vizinha caminhando. Sentia muita falta de ar, uma dor insuportável no peito, além de pressão na cabeça. Mal conseguia varrer a casa”, lembra Rosângela, cuja pressão atingia níveis de 29 por 18, mesmo com uso de medicamentos. Entretanto, desde que passou por um procedimento, há cerca de três meses, a realidade dela é outra. “Me sinto viva”, celebra. Inédita em Juiz de Fora, a denervação renal com cateter é um procedimento que busca tratar pacientes com pressão alta resistente ao tratamento feito com usos de medicamentos. O intuito é bloquear os estímulos do sistema nervoso simpático sobre o rim, um dos responsáveis pela regulação dos níveis de pressão arterial.
De acordo com o médico Gustavo de Moraes Ramalho, cardiologista intervencionista responsável pelo Serviço de Hemodinâmica do Hospital Maternidade Terezinha de Jesus, onde ocorreu a intervenção, cerca de 40% dos brasileiros têm hipertensão arterial sistêmica, ou seja, pressão alta. “Desse total, a maioria dos casos é controlada com medicação e com medidas não farmacológicas, como redução de peso, da ingestão de sal e de determinados medicamentos que podem aumentar a pressão arterial. Só que existe um percentual, em torno de 1% a 3% dos pacientes, em que não se consegue controlar a pressão com uso da medicação, a chamado hipertensão arterial refratária ao tratamento clínico”, explica. Esse era o caso de Rosângela.
Paciente do Sistema Único de Saúde, ela vivia com hipertensão arterial descontrolada há mais de 20 anos e, após passar pelo procedimento, ela afirma que se recupera bem e comemora os novos índices da pressão. Na data em que conversou com a Tribuna, na última terça-feira (21), a aferição da pressão dela era de 14 por 8. “Essa cirurgia me beneficiou em 100%. Se precisasse, eu faria tudo de novo, porque vale muito a pena, me sinto uma nova pessoa. Era horrível viver sentindo que a qualquer momento eu poderia ter um infarto ou um derrame”, diz.
Como a hipertensão de Rosângela era descontrolada, mesmo com uso de fármacos, foi necessário investigar as causas secundárias causadoras da pressão alta. De acordo com a paciente, antes da intervenção, ela fazia uso de 25 medicamentos, quantidade que foi reduzida a cinco após a intervenção. “No caso desta paciente, a gente identificou uma alteração na artéria renal. Frente a esse diagnóstico, foi indicada, inicialmente, a angioplastia da artéria renal. Ela fez o procedimento, e a gente esperava que os níveis tensionais dela fossem melhorar, mas não aconteceu. Como não tinham outras saídas para melhorar os níveis tensionais da paciente, indicamos para ela a denervação renal”, explica a cardiologista Sonielle Albertino, médica que também acompanha Rosângela desde 2020.
Denervação renal
Conforme o cardiologista Gustavo de Moraes Ramalho, o procedimento denervação renal consiste em inserir um cateter, por meio da virilha do paciente, até as artérias renais. “Nós posicionamos um cateter eletrodo com quatro pontos distintos, ligado a um gerador de radiofrequência. Nós disparamos o gerador de radiofrequência, ou seja, a gente queima os nervos renais por radiofrequência. Por ser assim, não há lesão na artéria renal, pois as ondas atravessam as células da artéria renal e atingem os nervos simpáticos renais”, explica.
Segundo o médico, a hipertensão refratária tem relação com uma hiperfunção do sistema simpático – responsável, dentre outras coisas, por aumentar a pressão arterial. “O sistema simpático gera uma redução do calibre de todas as artérias. Se eu reduzo o calibre das artérias, a pressão aumenta. A denervação arterial tem o intuito de queimar essa rede simpática envolta do rim, propiciando um bloqueio dessa atividade simpática e uma dilatação das artérias, fazendo com que possamos ter um controle maior sobre a hipertensão”.
Procedimento ainda não é ofertado pelo SUS
O cardiologista Gustavo de Moraes Ramalho explica que a denervação renal ainda não está no rol de procedimentos previstos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar e ainda não é ofertada pelo Sistema Único de Saúde (SUS). De acordo com o médico, mais de 80 cirurgias deste tipo já foram realizadas no Brasil, feitas por meio de negociações, parcerias, de forma particular ou por meio de mandados judiciais.
Em Juiz de Fora, a cirurgia foi realizada pelo grupo de cardiologia Interv. “Nós conseguimos sensibilizar a indústria, que nos doou um cateter para que a gente ofertasse esse tratamento à paciente”, conta o cardiologista Gustavo de Moraes Ramalho. Nesta quarta-feira (22), outros dois pacientes passaram pelo mesmo procedimento na cidade.