Pelo menos 107 imóveis estão em processo de desapropriação, na Cidade Alta, por causa das obras da rodovia BR-440. A área de intervenção, determinada pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), abrange uma faixa de domínio de 30 metros a partir do traçado proposto para a estrada, na Avenida Pedro Henrique Krambeck. Neste espaço, estão lotes vagos, imóveis construídos e outros bens, como barracões, cercas ou canos de água enterrados, totalizando aproximadamente 51 mil metros quadrados. Os proprietários já receberam a carta informando sobre a desapropriação, sendo que, alguns deles, inclusive, foram visitados por técnicos responsáveis pela medição e avaliação. No entanto, o departamento não estipulou prazos para que a posse seja tomada.
A obra da BR-440 é polêmica e ocasionalmente contestada na Justiça por entidades contrárias à sua conclusão. Além dos questionamentos com relação a possíveis danos ambientais, há reclamações referentes aos impactos no trânsito na região do Bairro São Pedro. Isso porque a proposta atual é que a BR-440 tenha início na rodovia BR-040 e termine próximo ao Campo do Nova União, no trevo de acesso ao Bairro Jardim Casablanca, ou seja, dentro do perímetro urbano. Originalmente, na década de 90, havia a intenção de o novo acesso se prolongar até a BR-267, na Avenida Brasil. No entanto, não há qualquer sinalização neste sentido, e o edital do processo licitatório, vencido pela Empa S/A, não menciona a continuidade das obras.
A Prefeitura, inclusive, tem a ideia de pedir a municipalização do trecho a ser erguido. A construção está paralisada desde 2012, com investimento de R$ 58,1 milhões em cinco quilômetros. Um trecho significativo sequer recebeu asfalto, causando a frustração de moradores: eles convivem com o barro, em períodos chuvosos, e com poeira, durante a estiagem. Agora serão investidos mais R$ 45,9 milhões para melhorias e finalização do mesmo trecho, o que inclui a pavimentação e obras de artes especiais, como passarelas e um viaduto.
Ano passado, o Dnit informava o retorno das intervenções em abril de 2015, mas agora preferiu não se manifestar com relação ao reinício, informando que falta previsão orçamentária. A ideia inicial era que a empreiteira concluísse os trabalhos até novembro próximo, respeitando o prazo estipulado de 800 dias, cuja contagem teve início em 16 de setembro de 2014.
Reflexos e incertezas
Uma das pessoas afetadas com a desapropriação é o empresário Alibert Bechara, 34 anos, proprietário de uma oficina mecânica. Segundo ele, o proprietário do galpão foi informado do processo há cerca de um mês. “Fizeram algumas medidas, e a desapropriação vai chegar até aqui”, disse, mostrando que praticamente metade da oficina deixará de existir. “É impossível manter a estrutura neste espaço. Por isso, já estou construindo um galpão no Bairro Aeroporto. É uma pena, pois o ponto aqui é excelente.”
Morador há mais de 20 anos da Avenida Pedro Henrique Krambeck, o autônomo Ari Eduardo Souza e Silva, 53 anos, lamenta perder não só a propriedade, como também uma fonte de renda. Pela proximidade com a UFJF, ele aluga quartos para 11 estudantes universitárias. “Vieram aqui fazer a medição e disseram que o corte vai até a cozinha. Como vou viver com uma casa pela metade? Além disso, no meu lote tenho cinco moradias. Vivemos agora numa expectativa que tira o sono, achando que a qualquer momento algo pode acontecer, ou ainda demorar muito tempo. É a minha casa, mas também a minha fonte de renda. Não sabemos até agora como será a avaliação do imóvel e se o pagamento será correto, se terei o valor suficiente para sair e comprar em outro lugar.”
Outro morador, que pediu para não ser identificado, disse que teme o resultado do processo de desapropriação. “Sinceramente, não sei se vão pagar o que a minha casa vale. Dependendo do valor, não conseguirei outro imóvel com estas características em um ponto como este. Pretendo lutar na Justiça para adquirir um valor coerente, mas sei que, infelizmente, a corda sempre arrebenta para o ponto mais fraco.”
Estudo para desapropriação custou R$ 650 mil
Além do montante já utilizado na construção da rodovia BR-440, o documento entregue pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) à Defensoria Pública Federal informa que foram investidos em torno de R$ 650 mil “referentes às parcelas de elaboração dos projetos básicos, executivo e de desapropriação”. Ou seja, não está incluído, neste valor, o necessário para as desapropriações. Procurado pela reportagem, o departamento informou que não há previsão para o início das desapropriações e nem o reinício das obras, pois falta incluir o recurso necessário no orçamento. Ainda não se sabe quando isso será feito.
Na tarde da última quarta-feira, houve uma audiência de conciliação na Justiça Federal a respeito dos impactos da rodovia BR-440. Entre os assuntos debatidos por representantes da empreiteira, Dnit e Ministério Público Federal estava a tomada de posse daquelas propriedades. Conforme o presidente da Associação dos Moradores Impactados pela Construção da BR-440 (Amic), Luiz Santos, que acompanhou o encontro, foi proposto um acordo para que as desapropriações e as obras não ocorram enquanto não sejam definidas algumas questões. Entre elas, a mitigação dos impactos ambientais causados pela primeira fase da obra, a necessidade de preservar a Represa de São Pedro e a ausência de licenciamento ambiental para os trabalhos que estão para recomeçar. “O representante do Dnit pediu um tempo para avaliar as questões e, por isso, uma nova audiência foi marcada para 13 de julho. Até lá, não haverá obras e, caso alguma intervenção aconteça, esta deverá ser previamente comunicada ao juiz da 3ª Vara da Justiça Federal.”
A ideia é que se firme um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) na audiência de julho, inserindo questões acordadas entre as partes. A Amic, conforme Luiz, sugeriu ao Ministério Público que o termo englobe a situação dos imóveis desapropriados. “A associação pediu que, se houver desapropriação, que os moradores interessados sejam realocados na mesma região. Uma realocação coletiva é sempre mais barata, e implicaria à União adquirir uma área e construir casas no mesmo padrão. Ainda não temos uma resposta se a nossa sugestão será inserida na proposta.
Dnit
Sobre as 107 propriedades atingidas foi confirmado que todos os donos já estão cientes do processo que, atualmente, encontra-se em análise “para a correta identificação das áreas e dos expropriados”. Entretanto, conforme o Dnit, podem surgir outras áreas a serem desapropriadas durante esta fase.
Questionado sobre o valor de R$ 650 mil, o Dnit não se manifestou. No entanto, salientou que os trabalhos de desapropriação realizados anteriormente pela Prefeitura estão sendo considerados neste atual projeto. “Aquelas áreas desapropriadas pela Prefeitura deverão ser repassadas ao Dnit por meio de doação.”
Abusos de carros e motos em via inacabada
Duas pessoas já morreram nas obras inacabadas da rodovia BR-440. O último óbito, registrado em novembro de 2013, ocorreu no trecho entre o acesso ao Bairro Spinaville e a Represa São Pedro, quando um homem de 31 anos foi atropelado na via. O trecho é ainda hoje comumente usado como área de lazer por moradores do entorno. Nos fim de semana, principalmente, observa-se grande movimentação de crianças em bicicletas ou jovens e adultos que usam a pista para práticas esportivas. Depois desta última morte, a Prefeitura havia inserido defensas metálicas para impedir a entrada de automóveis no espaço, mas recentemente as proteções foram retiradas.
O empresário Marco Antônio de Oliveira, 48, tem o hábito de levar o filho para andar de bicicleta no local aos sábado. Segundo ele, há cerca de dois meses, após uma corrida, as defensas foram colocadas ao lado da pista, permitindo a passagem dos carros. “Geralmente há meninos empinando motos por lá. Ficam andando de baixo para cima, perto da represa. Muitos passam em alta velocidade, embora alguns respeitem. O mesmo acontece com os carros.” Segundo ele, primeiro uma pequena parte da defensa metálica foi removida, permitindo apenas o acesso das motos, mas agora o espaço aberto é suficiente para a entrada de veículos.
A Tribuna esteve no local na tarde de quarta-feira, antes do feriado, e constatou o problema. Foi possível chegar de carro até o fim da pista, ao lado do lago da Represa de São Pedro, onde estavam mais dois automóveis e uma moto. Segundo a Settra, uma equipe vai ao local verificar a proteção e adotar as correções necessárias.