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Fazenda Experimental busca reflorestar entorno da represa de Chapéu D’Uvas

Fazenda experimental ufjf
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Iniciativa contribui para a manutenção da qualidade da água do reservatório (Foto: Imprensa UFJF)

Principal fonte de abastecimento de água de Juiz de Fora, a Represa de Chapéu D’Uvas registra um longo histórico de degradação, causado, principalmente, pela especulação imobiliária e o crescimento desordenado das áreas no seu entorno. Situada às margens do manancial, a Fazenda Experimental da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) busca recuperar uma parte das áreas desmatadas através do reflorestamento com diferentes espécies nativas da Mata Atlântica. A área original da fazenda é de 250 hectares, mas apenas 50 são preservados. Até o momento, pesquisadores e estudantes da instituição plantaram 40 mil mudas nas margens da bacia, o que corresponde a 23 hectares. A iniciativa, que contribui para a manutenção da qualidade da água do reservatório, hoje responsável por 50% do abastecimento público de Juiz de Fora, é do projeto Raízes para o Futuro.

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O professor do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFJF, Fábio Roland, acompanhou toda a transformação da área desde a compra da fazenda pela universidade, que aconteceu em 2012. Fábio acredita que o projeto pode servir de modelo para outras iniciativas a ser elaboradas em outras áreas da bacia de Chapéu D’Uvas. Sobre a importância do projeto, o professor alerta que, se não ocorrer o reflorestamento da bacia hidrográfica, não haverá água para a região de Juiz de Fora nas próximas décadas. “É necessário que toda a bacia seja restaurada para que se tenha floresta na bacia hidrográfica de Chapéu D’Uvas e o reservatório tenha água em uma perspectiva muito mais duradoura. Não é água para 2023 ou 2024, mas é água para 2032, 2040. A região está secando e, se não tiver água, vai acabar”, afirma o pesquisador.

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Mudanças climáticas

A importância ambiental da fazenda vai além da região de Juiz de Fora. O trabalho de reflorestamento que vem sendo feito vai contribuir também, em certo grau, para a redução das mudanças climáticas. As árvores que ali estão sendo plantadas vão absorver o dióxido de carbono e converter em biomassa, o que ajuda no desenvolvimento das plantas e diminui o impacto dos gases de efeito estufa.

Por trás do plantio das mudas, várias pesquisas acadêmicas vêm sendo desenvolvidas. No momento, cerca de dez trabalhos de mestrado e doutorado estão em elaboração tendo como foco as potencialidades da Fazenda Experimental. Para o professor de ecologia do ICB André Megali, o projeto tem um viés ecológico mais profundo, que transpassa o reflorestamento, já que há estudos voltados também para a fauna e questões hídricas.

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“O projeto tem uma grande importância ecológica e acadêmica, mas também tem um potencial econômico relevante. A ideia é, no futuro, termos ali uma capacidade de produção de mudas para projetos de reflorestamento de Áreas de Proteção Permanente (APPs); pode ser trabalhada também a questão de agrofloresta em toda região. Assim, você consegue restaurar a área de mata com fins econômicos para produção e cultivo de frutas inativas e trazer algum benefício econômico para as pessoas que ali estão”, destaca André.

Raízes para o Futuro

O Raízes para o Futuro é uma iniciativa do Núcleo de Integração Acadêmica para Sustentabilidade Socioambiental (Niassa) do ICB, desenvolvido em parceria com a concessionária Via 040 e o projeto BEF-Atlantic, que faz parte de uma colaboração entre o Niassa e a Universidade Técnica de Munique (TUM). O trabalho de planejamento e plantio das mudas teve início em outubro de 2021 e foi finalizado em março deste ano.

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Atualmente, as mudas plantadas são monitoradas para avaliar o índice de sobrevivência das plantas, que, até o momento, foi alto. Além disso, estão sendo avaliados o fluxo de gases do efeito estufa (CO2 e CH4) do solo das áreas plantadas para a atmosfera e a qualidade do solo. De acordo com a equipe do Niassa, será realizado um novo monitoramento em março de 2023 para medir a taxa de estocagem de carbono nas mudas ao longo do período de um ano.

Foto: Imprensa UFJF

Diversidade e sustentabilidade

A técnica escolhida para reflorestar essa parte da Mata Atlântica é diferente das mais comumente implementadas no país. Os pesquisadores investiram na diversidade e conseguiram plantar 24 espécies nativas de Mata Atlântica que ocorrem na região da Represa de Chapéu D’Uvas. “A nossa expectativa é de que quanto mais diversa, quanto mais rica for uma floresta, mais rápida e mais eficientemente ela se recompõe, atraindo outros animais. Acreditamos que a funcionalidade da floresta retorne mais rápido”, aponta André.

O pesquisador explica que normalmente os trabalhos de reflorestamento de compensação ambiental são feitos com poucas espécies que são mais fáceis de encontrar comercialmente. “Grandes áreas precisam de muitas mudas e simplesmente você não encontra fornecedores que produzam uma grande variedade.” No caso do projeto Raízes para o Futuro, a equipe chegou a comprar e germinar sementes para produzir as mudas, também coletou sementes na própria região e encontrou alguns fornecedores em diferentes locais que tinham espécies diversificadas de mudas para vender. Com o reflorestamento, os pesquisadores já notaram o retorno da fauna da região, como certas aves e a presença do lobo-guará. A aparição desses animais ajuda a trazer sementes de outras regiões, o que contribui para uma regeneração natural da região.

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Para que um projeto como esse saia do papel é necessário contar com a ajuda de muitas pessoas. Durante todo o processo, além dos profissionais da Via 040, que ficaram responsáveis pela preparação do solo, alunos da graduação, mestrado e doutorado do ICB colaboraram com o plantio. Esse é o caso da bióloga Lorena Fernandes, que participou do planejamento, da escolha das espécies e do gerenciamento das atividades de campo. “Estudos como esse, quando integrados a outros realizados em várias partes do mundo, geram informação e transferência de conhecimento para tomadas de ação política e de gestão florestal”, analisa.

Do nascer ao pôr do sol

Por volta das 8h, os trabalhos de campo se iniciam e se estendem até o fim do dia. Quando as mudas foram plantadas, as tarefas eram distribuídas da seguinte maneira: todos os dias, uma equipe marcava com bambus as posições de cada muda a ser plantada, depois outro grupo ficava responsável pela limpeza do capim e pelo coroamento para colocação das plantas, em seguida outra equipe levava as mudas e as plantava nos locais planejados anteriormente. “Com o projeto, estamos capacitando pessoas e, num futuro próximo, pretendemos levar o conhecimento gerado à comunidade local, para que possam restaurar também as APPs de suas propriedades e melhorar a qualidade ambiental da região”, planeja Lorena.

A mistura de diferentes sementes nativas da região virou tema da tese de doutorado da Lorena no Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade e Conservação da Natureza da UFJF. O objetivo da pesquisadora é avaliar o papel da diversidade de espécies arbóreas na produtividade de uma floresta em restauração. O projeto é orientado por André Megali e busca verificar se a produtividade da comunidade restaurada será maior caso utilize uma maior diversidade de espécies no plantio.

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Benefícios da restauração florestal

Um dos biomas brasileiros com maior diversidade de espécies, a Mata Atlântica está presente em cerca de 15% do território nacional, passando por 17 estados. No entanto, a floresta já perdeu 90% de sua área original, segundo dados da Fundação SOS Mata Atlântica. Ações que buscam a restauração florestal são, cada vez mais, urgentes. Além da garantia e melhoria da qualidade de água da represa, outros benefícios do reflorestamento são a diminuição da degradação e erosão do solo nas pastagens, a redução do assoreamento e erosão das margens da represa, a melhoria da qualidade do habitat e o aumento da biodiversidade da fauna e flora.

O professor do Departamento de Botânica do ICB Fabrício Carvalho estima que a Fazenda Experimental é a primeira estrutura de uma universidade brasileira com um potencial para diversas ações, tanto de pesquisa quanto de extensão, ligadas à sustentabilidade ambiental. Fabrício também reforça que o Niassa foi criado alinhado à maioria dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda da Organização das Nações Unidas (ONU) 2030. O professor atualmente coordena a implementação de outra técnica de restauração florestal na fazenda, chamada de “nucleação”. Se funcionar como esperado, esse conjunto de técnicas pode ser mais viável financeiramente, o que vai permitir um avanço maior e mais acelerado do projeto.

Foto: Imprensa UFJF

O amanhã agora

O projeto da UFJF pretende, no futuro, oferecer atividades voltadas para a educação ambiental da população. A ideia é levar escolas de Juiz de Fora e região para visitar a Fazenda Experimental e ensinar ecologia por meio do que está sendo plantado. “Nós queremos criar projetos de extensão, no qual as pessoas venham para a fazenda e possam conhecer o plantio e o viveiro de produção de mudas”, planeja André. A iniciativa também quer oferecer cursos de capacitação para produção de mudas. “Assim a pessoa vai receber um treinamento e pode fazer sua própria produção de mudas na sua propriedade.”

Para quem tiver interesse em colaborar com o projeto Raízes para o Futuro, seja como voluntário, atuando em diversas áreas, ou contribuir financeiramente, é só entrar em contato pelo site ou pelo instagram do BEF-Atlantic.

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