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Família de suspeito de estuprar as próprias filhas comenta caso

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(Foto: Fernando Priamo)

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“Eu pensava que era só amor de pai”, disse, com os olhos cheios de lágrimas, a mãe das meninas de 9 e 11 anos violentadas sexualmente pelo próprio pai e mantidas em cárcere privado. À reportagem, ela contou que o homem, com quem mantinha um relacionamento há cerca de 13 anos, cumpriu pena durante longo período e, por isso, acreditava que os ciúmes e a proximidade extrema eram uma forma de restabelecer o contato com as filhas, alegando que “não viu as crianças crescerem”.

“Era o que ele falava e, por não ter tido contato com elas, pensava que era só amor de pai. Por isso pensei que ele queria estar sempre ao lado delas, juntos. Eu senti dor, me senti inútil por não ter visto nada, desconfiado de nada.” O caso envolvendo as irmãs chocou a cidade esta semana e mobilizou a Polícia Militar a dar início a uma campanha a fim de recolher alimentos e produtos de primeira necessidade, que serão destinados à família, que vive de forma carente em uma residência na Zona Norte do município.

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Família vive em condições precárias na Zona Norte de Juiz de Fora. (Foto: Fernando Priamo)

O ponto final à violência sofrida pelas meninas se deu na última segunda-feira (19), quando a avó materna, 65, tomou conhecimento dos abusos e buscou auxílio na direção da escola onde as crianças estudam. “Domingo à noite elas falaram comigo: ‘vovó, o papai está molestando a gente. Ele falou que vai bater na gente se não contar que foi um coleguinha que nos estuprou”. Eu disse para elas ficarem calmas que eu iria dar um jeito. Deitamos, ele pegou as meninas e foi para a sala assistir televisão. No dia seguinte, eu perguntei a mais velha que tinha sido escolhida naquela noite, e ela disse ‘foi eu vovó’. Fui à padaria, trouxe o pão, deixei na mesa. Falei com a mãe dele ‘aconteceu’ e pedi que ele (o genro), abrisse o portão para eu sair novamente, dizendo que iria trabalhar. Na verdade, entrei no ônibus e fui até a escola. Lá, eu falei para o menino do portão o que tinha acontecido. Ele pediu que eu aguardasse a diretora e, quando ela chegou, a polícia já estava”, relatou a avó. Após uma rápida conversa com a mulher, os policiais seguiram até o imóvel da família. Na casa, encontraram a filha mais nova desacordada, por conta dos efeitos de remédios e pomadas anestésicas, dados com frequência pelo pai às meninas para inibir a dor depois dos estupros, além de medicamentos para adormecerem após o ato sexual.

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Pai proibia conversa entre os irmãos

Apesar da suspeita de que os abusos ocorreram por pelo menos dois anos, a avó materna revela nunca ter desconfiado de nada, mas, nos últimos tempos, estranhou o comportamento do genro que não permitia a permanência das filhas na escola, obrigava que elas usassem roupas largas, para não marcar o corpo e não permitia que conversassem com os irmãos. “Ele sempre dizia que menina deveria brincar com menina, e meninos apenas com meninos. Desta forma, evitava contato entre os irmãos e a descoberta do que acontecia aqui em casa”, ressalta, acrescentando que, mesmo morando na mesma casa, eles, sequer, conversavam. “Ultimamente ele tinha ciúme doentio delas. Mas era um pai presente e, para mim, pai não teria coragem de fazer isso”. “Minhas netas são preciosas, puras e guerreiras. Não entregaram o pai por medo de ele matar a mãe delas. Por isso corri atrás. Aconteceu com elas, mas não vai acontecer com minhas outras netas”, disse a avó, lembrando que o homem dizia que, se revelassem o ocorrido, iriam para um orfanato.

Já a mãe das crianças, apesar de não desconfiar do que acontecia a dois metros do quarto onde dormia com o bebê de 6 meses, ressaltou que as filhas sentiam dores frequentes e, pelo pai estar sempre próximo a elas, questionava. No entanto, o homem respondia apenas que deveriam procurar um médico. O fato de as crianças estarem sempre sonolentas e passarem a madrugada acordadas, chamou atenção. “Elas trocavam o dia pela noite. Por isso, não estranhava elas não irem para a aula até eu saber o que, de fato, acontecia. Ainda não acredito. Não esperava isso dele.” Desde segunda-feira, o homem está preso no Ceresp à disposição da Justiça.

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“Eu senti dor, me senti inútil por não ter visto nada, desconfiado de nada.”, diz mãe das meninas vítimas de violência sexual (Foto: Fernando Priamo)

“Eu não vou apanhar por mentira”

Depois de, aproximadamente, dois anos sendo abusadas, as meninas colocaram fim ao silêncio e à violência sexual que acontecia de forma alternada entre as irmãs, no quintal da casa de cinco cômodos, onde residiam com o pai, a mãe e outras filhas do casal, de 6 meses, 3 e 4 anos, e três meninos, de 5, 7 e 13 anos. Elas relataram para a avó o que acontecia debaixo do teto da família, depois que o homem disse que iria bater nas garotas caso não contassem que já havia mantido relações sexuais com os “namoradinhos na escola”. Segundo a avó, a mais velha disse: “Ele falou que, no dia seguinte, iria bater na gente. Então falei ‘eu não vou apanhar à toa e por mentira’.”
A mãe do suspeito também estava na residência da família e afirmou que o filho teria problemas psicológicos comprovados. No entanto, muito assustada, também disse que isso não justificaria as atrocidades praticadas contra as próprias filhas.

Meninas deixaram de frequentar a escola há um mês

A infrequência escolar das irmãs de 9 e 11 anos foi o primeiro sinal de alerta de que algo estava acontecendo, como contou à Tribuna a diretora da escola pública onde elas estão matriculadas. “Começamos a desconfiar depois da greve dos caminhoneiros (em maio), porque retornaram para a escola tampando muito os corpos. Ou colocavam umas blusas de frio embaixo do uniforme ou usavam uns vestidos compridões por cima, que percebíamos não serem delas.” A suspeita, no entanto, foi abafada pela seguida greve da rede estadual e pelo recesso escolar de julho. Em agosto, a situação pareceu ainda mais grave, porque as alunas começaram a faltar pelo menos uma vez na semana, ao mesmo tempo em que o pai não queria que as filhas permanecessem em período integral, das 7h15 às 16h45, como sempre fizeram.

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“Elas estavam faltando demais. Em um primeiro momento, a gente leva carta em casa. Mas a funcionária foi mal atendida pelo pai. Achei esquisito e comecei a desconfiar. Fiz um ofício para o Conselho Tutelar e fui lá entregar pessoalmente”, disse a diretora, acrescentando que o homem passou a ir diversas vezes à instituição de ensino para buscar as meninas fora dos horários, principalmente à tarde, quando elas realizavam atividades extracurriculares, como aulas de dança, oficinas e cultivos na horta. “Elas almoçavam na escola, mas teve vez de ele buscá-las às 11h30”, mesmo com a situação clara de necessidade pela qual a família passava.

As crianças cursam o terceiro e o quinto ano do ensino fundamental e, conforme a diretora, são muito inteligentes. Um dos irmãos delas, 7, também estuda no segundo ano do mesmo colégio. “O pai falava que se alguma coisa acontecesse com elas seria culpa minha. Não quis assinar para desistir do período integral, mas vinha buscá-las antes do horário. Eu expliquei que estudar era direito delas. Quando faltavam, falavam que estavam doentes ou davam outra desculpa. Depois do recesso de outubro, não vieram mais, só a de 9 anos que veio um dia. Liguei novamente para o Conselho Tutelar e avisei que haviam voltado a faltar.” A infrequência era acompanhada pelo irmão.

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“Aconteceu”

Após a semana do feriado de 12 de outubro, as vítimas deixaram de vez de ir ao colégio, pois estariam sendo mantidas em cárcere privado dentro de casa. “A avó (materna) falou comigo que o pai não queria mais que elas andassem sem que tampassem os corpos, e eu cheguei a perguntar se ele não estaria abusando delas.” A familiar, no entanto, não acreditava naquela atrocidade até na última segunda (19), quando chegou aos prantos à escola em busca de ajuda. “Ela conversou com a secretária, que me ligou em casa. Bastou a avó dizer ao telefone ‘aconteceu’ para eu entender tudo. Imediatamente liguei para o 190 e acionei a patrulha escolar”, lembrou a mulher.

“Fiquei muito abalada, não sei nem dizer. Elas são doces demais, educadas, quietas. É muito triste”, lamentou a docente. “A mãe quase não vinha aqui. Depois do que aconteceu, as crianças também não voltaram mais.” Junto com professores, a diretora já tinha o hábito de ajudar a família com mantimentos e materiais de higiene, mas “aos poucos”. “Já teve vez de o pai vender uma panela cheia de feijão dentro.” Na visão dela, as autoridades deveriam trabalhar mais na prevenção.

Conselho Tutelar acompanha família e aciona Cras

O Conselho Tutelar Norte está acompanhando a família desde agosto e, ao contrário do que informou a Polícia Militar em seu boletim de ocorrência, garantiu que compareceu à delegacia na última segunda-feira (19), quando o pai foi preso em flagrante por abusar sexualmente das filhas. “Estamos até fazendo contato com o coronel Alexandre Nocelli (comandante da 4ª Região da PM), porque fomos lá sim. Nos ligaram por volta das 15h, quando a polícia já estava conduzindo o pai, mas estávamos em atendimento de emergência na sede, referente a um caso ocorrido no fim de semana. Posteriormente, fomos em duas conselheiras e chegamos à delegacia quando a PM já tinha encerrado o registro da ocorrência, mas conversamos com o delegado”, esclareceu a conselheira Marisângela Domingos.

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Segundo ela, o Conselho acompanha a família desde 22 de agosto, após denúncia de sujeira na residência, situação de abandono e infrequência escolar das crianças. “Mas nunca chegaram denúncias de abuso sexual”, afirmou. “No dia 19 de setembro, outra conselheira fez a visita, mas foi impedida pela mãe de entrar na casa. Ela alegou que tinham cachorros muitos grandes e que não conseguiria prendê-los. Mas só pelo lado de fora a conselheira já percebeu muito entulho. Parece que mexiam com recicláveis.”

Apesar da “conversa de portão”, o órgão autônomo da administração pública municipal constatou situação de vulnerabilidade. De acordo com Marisângela, no dia 2 de outubro, foi encaminhado ofício solicitando a intervenção e acompanhamento do Centro de Referência de Assistência Social (Cras). “Pedimos uma abordagem para uma proteção básica, mas agora entendemos que o Creas (Centro de Referência Especializado de Assistência Social) precisa ser acionado, para dar um atendimento mais diferenciado neste momento”, pontuou a conselheira.

Mesmo com os encaminhamentos, Marisângela destacou que o Conselho permanece em diálogo com esses órgãos. “Estamos preocupados com a questão psicológica das vítimas. Infelizmente, elas já foram muito afetadas com isso e ainda não estão frequentes na escola. Queremos ao máximo reduzir esses danos, para que se sintam protegidas.” Sobre a guarda das crianças, ela explicou que permaneceu com a mãe. “Conversamos com o delegado se ele achava que a mãe, de alguma forma, poderia ter sido conivente. Mas ele disse não acreditar, porque foi até a própria avó materna que foi fazer a denúncia. A partir daí, não achamos problema de as crianças ficarem com a mãe, porque, desde quando detectaram o problema, já procuraram os órgãos competentes. Foi a visão do delegado, e a nossa também.”

Nesta quinta-feira (22), a conselheira tem encontro marcado com a mãe. “Queremos olhar todo o contexto, porque existem mais filhos, e saber até onde esses outros irmãos foram afetados com tudo isso.” Alertando a população para a possibilidade de outros casos semelhantes, Marisângela citou o artigo 13 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), pelo qual “os casos de suspeita ou confirmação de castigo físico, de tratamento cruel ou degradante e de maus-tratos contra criança ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais”. “O importante é que denunciem. Em caso de suspeita ou confirmação, precisam comunicar ao Conselho Tutelar ou a algum órgão que possa fazer algo a respeito. Muitos desses abusos vão se estendendo, então tem que denunciar se suspeitar para que as vítimas sejam protegidas. Se cobra das autoridades, mas elas não estão dentro de casa para saber o que está acontecendo.”

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