O Dia Internacional da Síndrome de Down acontece em 21 de março para marcar uma das características dessa população, que tem a triplicação do vigésimo primeiro cromossomo. Os indivíduos que nascem com essa síndrome têm uma alteração genética que causa deficiência intelectual, além de outras particularidades de saúde em comum que podem exigir cuidados ao longo da vida. Longe de ser uma doença, a Síndrome de Down é presente em cerca de 270 mil brasileiros, de acordo com dados do IBGE. Mas, na maior parte dos casos, não é o cromossomo que define como será a vida desses indivíduos, e sim, como mostram os especialistas, o acolhimento da família, da sociedade e as oportunidades que são oferecidas a essas pessoas. Entre os entrevistados pela Tribuna, a inclusão é considerada a palavra-chave, que mostra como a trajetória dessas pessoas pode ser.
A médica pediatra e neonatologista do HU-UFJF/Ebserh Patrícia Brandão explica que, entre os indivíduos com Síndrome de Down, é comum encontrar baixa estatura, aumento do tamanho da língua, olhos amendoados e prega única na mão. Quando a síndrome é identificada, o mais importante, como ela explica, é que a família tenha todas as informações e orientações para que o indivíduo viva plenamente. “Para que esses indivíduos consigam atingir os marcos de desenvolvimento, é preciso de um atendimento multiprofissional”, destaca. Dessa forma, é possível garantir o máximo de autonomia possível para essa parte da população, e também acompanhar qualquer alteração nos exames de saúde, como por exemplo nos casos em que há algum tipo de malformação cardíaca.
Para isso, como ela sinaliza, é fundamental a família ter acesso a todas as informações necessárias sobre a síndrome, para poder ter compreensão e abraçar as necessidades e os desejos dos indivíduos. “O indivíduo pode ter uma existência super ativa e super produtiva, basta que a família tenha todas essas orientações e consiga fazer os estímulos certos para que ele consiga ter uma vida na sociedade”, ressalta. Para ela, o que impede que isso aconteça, muitas vezes, é o preconceito a partir do desconhecimento sobre essa condição, o que leva algumas pessoas a acharem que é algo contagioso, que pode atrapalhar a vida da família ou que pode impedir que a criança seja capaz de brincar ou estudar. Nada disso é verdade, como destaca: “Eles são capazes de trabalhar, estudar, ter relacionamentos. Se esses indivíduos têm os estímulos certos, claro que podem ter uma vida produtiva em sociedade”.
A principal medida de inclusão, como ela destaca, é a informação, começando desde a infância, nas escolas, para estimular o respeito às diferenças, para que seja possível viver em uma sociedade respeitosa e que entenda que cada indivíduo é único. Por isso, também reforça que a data é uma oportunidade de disseminar mais informação sobre a síndrome e entender o que faz a diferença na história de cada indivíduo.
Luiz Eduardo trabalha, namora, joga pokémon e estuda para tirar carteira
Aos 21 anos, Luiz Eduardo Pogianelo leva a vida como a maioria dos jovens de sua idade: trabalha, namora, joga pokémon, toca bateria e estuda para tirar carteira de motorista. A única coisa que o difere, talvez, seja o gosto particular por filmes de zumbi. Como afirma seu irmão, Thyago, a Síndrome de Down não o impede de nada. Preconceito não é uma palavra que faz parte do seu vocabulário, porque a inclusão nesses espaços permite que Luiz faça o que tem vontade. E, como ele mesmo afirma, isso é uma variedade de coisas enormes, porque seus sonhos são muitos.
O jovem tem dois trabalhos, atualmente, de segunda a sexta-feira no Colégio Cave, onde estudou e foi contratado em seguida para atuar junto à coordenação. “Foi muito bom poder voltar. Quero continuar lá”, conta. A rotina de trabalho dele é agitada e começa cedo: “Às 6h eu acordo, faço meu omelete, vou pra lá e fico no portão. Dou bom dia pra todo mundo. Ajudo os professores e a coordenação, passo nas salas. É bastante coisa, mas eu estou conseguindo”, conta. Por gostar desse tipo de responsabilidade, ele também trabalha em um restaurante japonês, o Japatê, recepcionando os clientes e levando a conta nas mesas. Nos dois casos, ele conta que gosta muito – e na escola, inclusive, é padrinho de uma das turmas do ensino médio nos jogos de interclasse. Mesmo com as diversas atividades que realiza, também tem tempo para namorar, e, ainda em março, comemora um ano de namoro com sua companheira.
Entre as coisas que ele ainda tem vontade de fazer, estão viver com a namorada e ter uma banda para fazer muitos shows, já que toca bateria há alguns anos. Além dos planos futuros, há o que quer fazer agora, como assistir ao novo filme do Kung Fu Panda e ir tomar sorvete com o irmão, como geralmente faz. Um dia, também quer abrir a própria cafeteria. “Adoro cafeteria, vou muito. Lá, vai ter coxinha, cigarrete, bolo, coca-cola, mate, café. Vai ter pão de sal para pegar também, para ficar à vontade. Vamos trabalhar eu e minha namorada lá”, diz. Em todos os cenários, ele afirma que quer ficar perto da família, de quem é muito próximo, e de seus cachorros, e inclusive “comprar uma casa verde” em seu próprio condomínio, para continuar por perto enquanto tem a sua autonomia.
Nathan deu ideia de ‘Instituto Down’ e sonha com vida na roça
O dia de Nathan Carvalho começa também cedo, porque às 8h chega ao seu trabalho, em uma farmácia, em que atua na parte de marketing e vendas. Com 35 anos, ele é um homem tímido, como sua mãe, Rosângela, define – mas também muito espirituoso e disposto a conversar e conhecer gente. Por isso mesmo, ela expõe a chateação de ver como alguns podem ser egoístas e fechados, sem vontade de conhecer todas essas nuances porque se incomodam com o que consideram diferente. “É só tratar normalmente”, destaca.
Ele frequentou a escola regular, acompanhando as turmas de sua idade e completando o segundo grau. Ao longo da trajetória acadêmica, aprendeu a ler na faixa de idade considerada recomendável e foi acompanhando todos os conteúdos da mesma forma. Também por perceber a importância de cuidar das pessoas com Síndrome de Down, ele sugeriu ao pai, Sérgio, a criação do Instituto Down, que trabalha com especialistas e voluntários para prevenir os agravos das doenças acarretadas pela síndrome. Já são mais de 20 anos de funcionamento desse instituto e do envolvimento de toda a família na causa.
Para além da rotina, uma das grandes paixões de Nathan é a roça. Quando pode estar na natureza, com sua família, sente-se muito bem. “Fui criado lá, né? Então gosto muito”, conta. Assim como Luiz, ele também namora, há cinco anos – “praticamente um noivado”, como diz. Por isso, um dos seus maiores sonhos é poder aproveitar o que mais gosta da vida com a namorada: “Sou peão boiadeiro e queria sair em comitiva, um dia, junto com a minha gata”, diz.