Logo no início do período chuvoso, Juiz de Fora já apresentou episódios críticos que acendem o alerta para insegurança da população que vive em área de risco. Só no último mês, a Defesa Civil informou que 32 imóveis foram interditados devido a riscos geológicos ou hidrológicos. O número total de casas que estão interditadas na cidade não foi repassado à reportagem. A Defesa Civil informou que essa quantidade é dinâmica e que as equipes fazem uma reavaliação de risco nos imóveis de forma constante.
Por questão de segurança, quem tem sua casa interditada precisa ir para outra moradia, seja ela própria ou alugada. O Poder Público, entretanto, não pode obrigar ninguém a deixar sua residência e, por isso, muitas pessoas, sem ter para onde ir, permanecem no mesmo local. Como forma de resolver esse impasse, o Programa Auxílio-Moradia, da Prefeitura de Juiz de Fora, oferece até R$ 600 para cobrir o aluguel de outra casa para a família. Atualmente, segundo a PJF, o programa atende 112 beneficiários na cidade, totalizando 93 famílias.
Quem pode receber o auxílio
A lei nº 14.214 de 2021 estabelece três tipos de auxílio-moradia: emergencial, de vulnerabilidade social e para mulheres vítimas de violência de gênero. O emergencial é destinado a famílias e pessoas residentes de áreas onde há indicação de risco de enchentes, desabamentos ou outros sinistros. Tais áreas são identificadas e monitoradas pela Defesa Civil do município.
Através de estudos técnicos, a equipe da PJF determina a necessidade de desocupação imediata da moradia. Depois disso, uma equipe do Serviço Social entra em contato para saber quais as condições para deixarem o imóvel. Conforme a lei, para receber o benefício é preciso que a família tenha renda de até três salários mínimos, estar inscrita no Cadastro Único para Programas Sociais, ser moradora do município e não ter outro imóvel próprio em Juiz de Fora ou em outra cidade.
Se preencher esse requisito, ela receberá, todo mês, o valor de R$ 600, destinado a famílias, e R$ 300 para indivíduos. Esse dinheiro deve ser utilizado exclusivamente para cobrir gastos com moradia, caso contrário, o benefício pode ser cancelado pela Prefeitura.
Contando com a sorte
Não são todos que têm o direito de receber o benefício, porque é preciso se enquadrar nos requisitos estabelecidos pela lei. É o caso de Gisele Oliveira, moradora da Rua Rosa Sffeir, no Bairro Grajaú. Sua casa é uma das 16 que foram interditadas pela Defesa Civil no final de setembro. O imóvel é próprio e abriga toda a família, desde o sogro até o cunhado. “Toda a família está aqui, não temos para onde ir. Para receber o auxílio-moradia você basicamente precisa comprovar que passa fome. A gente fica realmente desamparado.” Sem o auxílio, mas também sem condições de bancar um aluguel, ela, o marido e o filho vão ficando na casa, na esperança de que as chuvas fortes no fim de ano não tragam mais tragédias.
Já para a família de Carolina Dias, moradora da Vila Olavo Costa, o auxílio-moradia foi a única solução. Sua casa foi invadida por uma enxurrada em fevereiro deste ano. A força da água derrubou as paredes enquanto ela, o marido e os filhos de 7 e 10 anos estavam na residência. O marido ficou ferido e precisou levar 37 pontos no braço. O primeiro andar da edificação foi interditado pela Defesa Civil. A família se enquadrou nos requisitos para receber o auxílio-moradia e, por isso, conseguiu alugar um outro imóvel no bairro, onde moram até hoje.
Na última quarta-feira (18), a Defesa Civil interditou o restante do imóvel onde morava Carolina. A edificação de três andares abriga duas famílias, totalizando cinco pessoas. A mãe de Carolina, Rosana, está aguardando o auxílio-moradia para deixar o local. De acordo com ela, o benefício será suficiente para procurar uma outra casa na Vila Olavo Costa que seja adequada para a família.
Pela lei, o auxílio-moradia emergencial deve ser entregue aos beneficiários até que a situação de risco seja resolvida. Em nota, a PJF afirmou que o período de permanência no programa é de 12 meses, “com possibilidade de prorrogação até que a situação de risco seja solucionada”.
Papel social do Estado
Algumas dessas moradias interditadas pela Defesa Civil estão em terrenos que não são regularizados junto à Prefeitura, com riscos considerados iminentes. Apesar disso, o direito a uma moradia digna é constitucional, ou seja, é dever do Estado que ele seja garantido. Conforme explica o professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Bruno Stigert, mesmo reconhecendo o caráter de direito fundamental social da moradia como direito que materializa a dignidade humana, o Estado possui recursos limitados e deve garantir tal direito na medida do possível.
“O fato de as pessoas construírem casas em locais de risco não retira delas a condição de sujeitos de direitos, muito pelo contrário, escancara a fragilidade do Estado de garantir os mínimos sociais para os cidadãos. […] O auxílio é uma forma de atenuar a ineficiência do Estado em prover tal direito”, explica.
Em Juiz de Fora, de acordo com Bruno, a lei se enquadra como uma das mais protetivas do país por se estender a pessoas em vulnerabilidade social e mulheres vítimas de violência. “Não existe, há rigor, nenhuma lei em âmbito nacional que obrigue o pagamento do auxílio-moradia. Nos casos aqui tratados, cada município legisla sobre o tema e estipula as condições de acesso a esse direito.”
Chuvas mais fortes em janeiro
Conforme apontado pela climatologista da UFJF, Cássia Ferreira, o período chuvoso na Zona da Mata, incluindo Juiz de Fora, começa em outubro. As chuvas vão se tornando mais frequentes até março, quando há uma redução para a transição entre outono e inverno. “Os meses que registram os maiores volumes de precipitação são janeiro e dezembro, nessa ordem; janeiro mais, e dezembro um pouco menos.”
Por isso, de acordo com ela, as chuvas mais intensas são esperadas para o início do próximo ano. Para moradores de área de risco, é recomendado atenção a sinais de danos à estrutura do terreno e da edificação. O atendimento de plantão da Defesa Civil de Juiz de Fora pode ser solicitado através do telefone 199, que está disponível por 24h.