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Excesso de fiação traz riscos nas ruas de Juiz de Fora

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Entre os prédios que compõem o conjunto arquitetônico da Praça da Estação, os fios chegam a formar uma teia, inclusive com alguns cabos soltos. Para especialista, qualquer fio desprendido pode ser perigoso, assim, ao se deparar com situações semelhantes, o ideal é se manter afastado por pelo menos cinco metros e contactar a concessionária responsável (Foto: Fernando Priamo)
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Pelas ruas de Juiz de Fora, a população tem que lidar com um desconforto ótico: o excesso de fios de telecomunicações impacta a paisagem urbana do município. Além de se constituir como poluição visual, segundo especialistas, o emaranhado de cabos também é visto como perigo à segurança dos juiz-foranos. Os fotógrafos da Tribuna flagraram vários pontos na cidade cuja visão está comprometida pela fiação. Entre os locais, patrimônios históricos e culturais são afetados, sendo o problema observado, inclusive, por visitantes.

“Uma das coisas que mais chama atenção das pessoas, principalmente quando recebemos visitas do exterior, é essa poluição visual criada pela fiação aérea”, conta Rogério Mascarenhas, arquiteto e urbanista. “Hoje, existem várias concessionárias de serviços que aproveitam o posteamento e colocam novas fiações, novos cabos de telefone, e isso cria, então, um emaranhado de fios que é muito feio para a paisagem urbana, principalmente em áreas históricas e de patrimônio.”

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Para o arquiteto, a poluição visual acaba prejudicando esses espaços. “Ela desvaloriza a paisagem urbana como um todo, porque cria uma paisagem poluída com essa fiação colocada de maneira bastante caótica”, afirma. O arquiteto relembrou o decreto 8.637, de 2005, que proíbe a colocação de qualquer tipo de recursos de divulgação de publicidade que ocultem total ou parcialmente elementos decorativos e vãos de fachadas de imóveis tombados e que impeçam ou reduzam a sua visibilidade. “É preciso nos mobilizar com essa adversidade na paisagem urbana no que se refere à fiação aérea.”

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Fiação subterrânea

Para Mascarenhas, o ideal seria que a cidade adotasse a fiação subterrânea. Em Juiz de Fora, de acordo com a Cemig, a região de “hipercentro” da cidade, que compreende um retângulo formado entre as avenidas Rio Branco, Getúlio Vargas, e ruas Afonso Pinto da Mota e Barão de São João Nepomuceno, é a única área no município que possui a fiação no subsolo. “É claro que é um desejo de todos nós que a cidade tenha uma paisagem mais limpa e, para isso, é fundamental que a fiação realmente seja subterrânea. Mas também entendo que temos outras prioridades, pois estamos vivendo uma escassez de recursos muito grande”, aponta. Na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, o decreto 34.442 prevê a obrigatoriedade das empresas que utilizam a rede aérea no município em implantar sua fiação no subsolo urbano, ação que resguarda o Executivo de despesas extras.

O principal empecilho para a fiação subterrânea é, justamente, o custo alto. De acordo com Moisés Ribeiro, professor do Departamento de Energia Elétrica da Faculdade de Engenharia da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), para instalação da rede no subsolo, seriam necessárias galerias, o que exige um capital elevado. “Infelizmente, o modelo adotado na cidade não foi subterrâneo, e, para aderir a isso, requer um investimento enorme para passar todo o cabeamento”, afirma. “É um conceito de não poluir o espaço. Para nós que somos consumidores, não teria essa poluição visual.”

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Conforme o professor, tal serviço seria o mais indicado para cidades com alta densidade demográfica, mas deve ser bem avaliado a fim de definir se o investimento valeria a pena. “O que tem acontecido é um movimento acelerado de urbanização e concentração de pessoas, então você tem um consumo muito elevado. Neste caso, o uso de infraestrutura de distribuição de energia subterrânea é mais indicado, mas, no final das contas, é necessária uma análise de custo-benefício. Para trocar uma infraestrutura, tem que ser analisado”, explica. “O problema não é a infraestrutura de distribuição de energia, mas sim a de telecomunicações. Existe uma autorização, só que fica feio. O ideal é ter uma infraestrutura de fibra ótica compartilhada por várias empresas, o que diminuiria o problema.”

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Em 2018, o Palácio Barbosa Lima, que abriga a Câmara Municipal, completou 140 anos. O Imperador D. Pedro II fez a inauguração do edifício, que segue o estilo clássico, organizado de forma tripartite, ou seja, um corpo central ligeiramente avançado e duas alas laterais simétricas, com três vãos. À frente do prédio histórico, um poste atrapalha o olhar de quem passa pelo Parque Halfeld e tenta observar o projeto arquitetônico do palácio (Foto: Fernando Priamo)

Especialista aponta riscos de excesso de fiação

Juiz de Fora possui mais de 50 mil postes na área urbana, além de cerca de oito mil na região rural, de acordo com a Cemig. Cada pilar conta, normalmente, com três camadas de fio, segundo Edson Martinho, engenheiro eletricista e diretor executivo da Associação Brasileira de Conscientização para os Perigos da Eletricidade (Abracopel). A primeira camada está a cerca de sete metros de altura. É considerada de alta ou média tensão e como a mais perigosa, já que, normalmente, por ela passam distribuições elétricas de 13.800 volts. A segunda, de baixa tensão, transmite eletricidade de 110 até 440 volts, o que a qualifica também como perigosa, já que, conforme Martinho, “qualquer choque acima de 50 volts pode ser fatal”. A camada mais baixa é a que conta com os cabos de telefonia e TV a cabo, além de outros acessórios que, segundo o engenheiro, não deveriam oferecer riscos por conta das menores tensões, no entanto, devido a outros fatores, também apresenta determinadas ameaças.

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“Caso haja rompimento de cabos em cima, eles caem nos que estão abaixo e transferem o potencial, passando a ser perigoso. O segundo ponto é que essa instalação é sem controle. Existem fios pendurados de qualquer jeito e, assim, fica difícil saber se tem algum problema ou não. Aí entra a nossa preocupação: é um cabo, você não sabe o que é, então não chegue perto.” Isto porque, conforme Martinho, muitos acidentes acontecem por conta do emaranhado de fios próximos à rede elétrica. De acordo com o último Anuário Estatístico Brasileiro dos Acidentes de Origem Elétrica da Abracopel, em 2016 ocorreram 218 mortes no país por conta de acidentes em redes aéreas de distribuição.

Desta forma, o principal alerta do especialista se relaciona com os cuidados na hora de se trabalhar com a rede elétrica, seja para quem já presta serviço na área ou para os que costumam fazer “gambiarras”. “É importante ressaltar que eletricidade é perigosa, e qualquer serviço só pode ser feito por profissionais que tenham conhecimento da eletricidade e conhecimento dos riscos”, adverte. “Se você não conhece o ambiente, qualquer cabo solto, em qualquer lugar, pode ser perigoso. Então é preciso se afastar por pelo menos cinco metros e avisar a concessionária, seja de telefonia ou energia, para que tome as providências.”

Descargas elétricas

Um estudo do Grupo de Eletricidade Atmosférica (Elat) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) indica que, neste verão, a incidência de raios no Brasil está sendo influenciada pelos efeitos do fenômeno climático El Niño, que atua nas águas do oceano, aquecendo-as e causando efeitos diferentes nas temperaturas em determinadas regiões do país. Na região Sudeste, a previsão é que o fenômeno deve provocar um aumento de 20% a 30% nas descargas elétricas.

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Tal acontecimento causa um alerta nos problemas causados pela queda de raios, já que, conforme Martinho, por ter uma potência muito grande, o raio pode induzir também cabos de telefonia e TV, que são, em sua maioria, de material metálico. “Qualquer descarga atmosférica pode vir a colocar uma tensão alta tanto na parte de telefonia e TV a cabo, como na parte de energia. Esse surto elétrico pode queimar equipamentos ou, se a pessoa estiver usando um notebook ou celular, por exemplo, conectados na rede elétrica, pode ser transferido para a pessoa e levá-la a óbito”.

O excesso de fiação que segue pela Getúlio Vargas também afeta o prédio onde funciona atualmente o Centro Cultural Bernardo Mascarenhas. A edificação foi inaugurada em 1888 para sediar a Companhia Têxtil Bernardo Mascarenhas, com estilo arquitetônico que imita as fábricas inglesas de tijolos aparentes (Foto: Fernando Priamo)

28 empresas de telecomunicação atuam em JF

Só em Juiz de Fora, 28 empresas possuem autorização da Cemig para compartilhamento de infraestrutura, sendo que apenas uma destas – o Município – não atua no ramo de telecomunicação, de acordo com Weglisson Climaco, agente de comercialização da companhia. Na área de concessão da Cemig, que compreende aproximadamente 96% do território de Minas Gerais, 681 empresas possuem contrato de compartilhamento, estão em processo de renovação ou já solicitaram a formulação do seu primeiro contrato. O número mais que triplicou nos últimos cinco anos, quando eram cerca de 180 empresas.

De acordo com a Lei Geral das Telecomunicações, as prestadoras de serviços de telecomunicações possuem o direito de utilizar os postes “de forma não discriminatória e a preços e condições justos e razoáveis”. O compartilhamento só é negado por conta de limitação na capacidade, segurança, estabilidade, confiabilidade ou violação de requisitos de engenharias, conforme a resolução conjunta nº 001 das agências nacionais de Energia Elétrica (Aneel), de Telecomunicações (Anatel) e do Petróleo (ANP). Desta forma, a Cemig é sujeita a ceder o espaço para as empresas de telecomunicação.

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Para Climaco, o valor “demonstra como a livre concorrência do setor de telecomunicações e o grande crescimento anual do número de empresas tornam insustentável a dependência do setor aos postes das distribuidoras, que são infraestruturas naturalmente limitadas e que, nos grandes centros, já estão majoritariamente saturados”. Conforme o agente, a companhia tem trabalhado na melhoria dos processos internos, a fim de que as empresas procurem se regularizar, além de elaborar “planos colaborativos de fiscalização com associações de provedores e com órgãos que se mostrem interessados.”

Para realizar alguma intervenção nos postes de incumbência da Cemig, é necessário que a empresa apresente um projeto executivo à companhia para liberação do compartilhamento, para então firmarem contrato e determinar fatores técnicos e comerciais. A Cemig também é responsável pela fiscalização deste compartilhamento. Conforme Climaco, a companhia notifica as empresas ocupantes da infraestrutura para regularização da rede quando executa qualquer tipo de obra. Também, quando recebe denúncias ou flagra algum lançamento de cabos sem autorização, a Cemig penaliza em conformidade com o contrato firmado, que prevê a notificação em casos de irregularidades. Somente na área de concessão da Cemig foram 23.241 notificações para regularização de obra no ano passado.

 

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