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Um problema a se discutir

guilherme amaral explica que disturbios psiquicos estao por tras do problema leonardo costa

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Guilherme Amaral explica que distúrbios psíquicos estão por trás do problema (Leonardo Costa)

Guilherme Amaral explica que distúrbios psíquicos estão por trás do problema (Leonardo Costa)

“A ameaça de se matar é, muitas vezes, um pedido de ajuda. Se a ajuda não vier, a pessoa pode perder a esperança e cometer mesmo um suicídio. A maioria fala ou dá sinais disso.” A afirmação do presidente da Associação Psiquiátrica de Juiz de Fora, Guilherme Henrique Faria do Amaral, traz um alerta para a necessidade de se quebrar um tabu: falar sobre o autoextermínio a fim de se garantir a prevenção, especialmente no mês intitulado Setembro Amarelo. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), em todo o mundo, mais de 800 mil pessoas cometem o suicídio, o que representa uma morte a cada 40 segundos. Além disso, a cada três segundos, uma pessoa atenta contra a própria vida. O Brasil ocupa a oitava posição na lista dos países que é encabeçada pela Índia. Só em 2012, foram 11.821 casos. Em Juiz de Fora, dados da Polícia Militar mostram que, só em 2016, foram 31 consumados, sendo ainda registradas 60 tentativas de janeiro a agosto. Os números são próximos dos divulgados pelo Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde. Segundo o órgão, em 2014, 33 pessoas cometeram o autoextermínio na cidade, contra 32 em 2013. De acordo com o Mapa da Violência de 2014, a cidade ocupava, em 2012, a 707ª posição no país.

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Entre os fatores que reforçam a importância de se abordar o tema estão as grandes chances de se reverter a tentativa de autoextermínio. Dados da Associação Brasileira de Psiquiatria apontam que, em 90% dos casos, os suicídios estão associados a doenças de ordem mental que podem ser diagnosticadas e tratadas, evitando sua consumação. Problemas como transtornos de humor, ligados à depressão, a dependência de álcool e outras drogas, a esquizofrenia e os transtornos de personalidade podem ser detectados inclusive por amigos e familiares, os quais assumem papel fundamental para conter o ato.

“O paciente que vai cometer o suicídio tem uma doença mental por trás. Grande parte deles, quase 80%, tem transtorno de humor, transtorno bipolar ou a depressão. Um quarto deles tem uma dependência química associada. Um número grande de pacientes psicóticos, se não tratar direito, vai cometer o suicídio. É preciso deixar isso claro, até para a conscientização do familiar. A gente tem que saber abordar e prevenir.”, explica Guilherme.

Mitos

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Guilherme afirma que é preciso combater algumas crenças que envolvem o suicídio, muito disseminadas pelo próprio desconhecimento do assunto. Um dos principais mitos é de que não se pode falar do assunto. “Há um mito de que, ao se falar sobre suicídio, se estimula o ato. Pelo contrário. Falar sobre o tema é uma forma de saber se a pessoa tem mesmo esse desejo, identificando o problema e levando ao tratamento. Um dado estatístico muito perigoso é de que 80% das pessoas que tentaram o suicídio tiveram êxito na primeira vez. A gente precisa de uma identificação precoce”, afirma.

Uma preocupação que pode se destacar em relação ao suicídio é referente aos riscos. O fato de uma pessoa que pensava em suicídio desistir da ideia e passar a se sentir melhor não significa que ela não irá cometê-lo. “Às vezes, a pessoa fica deprimida, desesperançosa e, quando coloca a ideia na cabeça, tem um certo alívio. E, às vezes, isso aparenta uma melhora. Tem que tomar cuidado. Por isso é importante a família estar presente, os amigos. Quem vai salvar a vida é quem está perto”, explica Guilherme.

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O médico reforça, inclusive, a obrigação social da mídia de tratar o assunto de forma adequada, oferecendo informações sobre como buscar ajuda.

Uma das conclusões do Mapa da Violência é o “tabu existente na mídia de divulgar questões relativas ao tema, pelo temor do ‘Efeito Werther’, que são ondas de suicídios por imitação ou indução”. Outro mito que o médico apresenta é de que as pessoas que ameaçam se matar querem, muitas vezes, chamar a atenção.

Números podem estar subestimados

Publicação da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) de 2010 alerta também para outro fator: os dados sobre suicídio registrados no Sistema de Informação de Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde “certamente são subestimados”. Por ser um dado classificado dentro da categoria de mortes por causas externas, a associação sustenta que é recorrente o registro em cartórios de mortes que se referem à lesão sem considerar a circunstância que a ocasionou. Nessa categoria, em torno de 10% são considerados como “óbitos por causas externas de tipo ignorado”, sem levar em conta se trata-se de homicídio, suicídio ou acidente. A hipótese ganha força diante da discrepância entre os dados informados no sistema DataSUS e pela Polícia Militar. Em 2014, por exemplo, quando o SIM demonstrou o quantitativo de 33 pessoas, a PM afirma terem sido registrados 72 casos consumados. Neste mesmo ano, o número de tentativas impressiona: foram 181 registros, número que apresentou queda em 2015, com 130 casos.

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Em âmbito nacional, a ABP estima que o número de tentativas de suicídio supere em dez vezes o número de suicídios consumados. No entanto, afirma que, em nenhum país, há registro de abrangência nacional dos casos de tentativa. Outro fator importante a ser observado é a faixa etária. A Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta ainda que o suicídio já é a segunda causa de mortes na faixa etária dos 15 aos 29 anos, no entanto, a incidência é maior em pessoas com mais de 70 anos. Em relação ao gênero, as pesquisas apontam que a média maior de autoextermínio é provocada por homens, de incidência é maior do que entre as mulheres.

Alívio

Diante da falta de apoio familiar ou de amigos para amparar em um momento de pensamentos suicidas, canais de escuta se abrem para oferecer apoio de forma gratuita. Em Juiz de Fora, o Grupo de Valorização da Vida (GVV), ligado à Fundação Espírita Allan Kardec, oferece, desde 2005, o serviço SOS Preces. Além do atendimento por telefone, o grupo ainda oferece atendimento presencial na Rua Itamar Soares de Oliveira 200, no Cascatinha. O site do grupo é feak.org.

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Fundado há 53 anos e atendendo em todo o Brasil, o Centro de Valorização da Vida (CVV) realiza 800 mil atendimentos ao ano. Ele atua no apoio emocional e na prevenção do suicídio. As ações, antes concentradas apenas em ligações telefônicas, agora também abrangem um perfil no Facebook, o Conte Comigo, em parceria com a Associação Brasileira de Psiquiatria. O CVV também possui um canal no Skype e chat em seu site www.cvv.org.br. “Ela faz parte de uma rede de 370 centros no mundo, que atua em 36 países, chamada Befrienders, que se dedica a ouvir atentamente o outro, de forma gratuita e não invasiva”, explica uma das porta-vozes, a jornalista Leila Herédia.

Em junho deste ano, foi sancionada pelo Executivo municipal a lei que institui a Semana Municipal de Valorização da Vida, que será realizada anualmente na semana de 10 de setembro, dia de prevenção ao suicídio. A intenção é conscientizar sobre a temática, promovendo encontros para debater o assunto, incluindo a produção de cartilhas e realização de seminários, palestras, debates e distribuição de folhetos informativos.

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