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Posts falsos na web causam pânico

Informações foram verificadas no  local com autoridades responsáveis (Foto: Olavo Prazeres/17-08-16)
Informações foram verificadas no
local com autoridades responsáveis (Foto: Olavo Prazeres/17-08-16)
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Pouco depois que o estrondo da explosão de um dos paióis da Indústria de Material Bélico do Brasil (Imbel) foi ouvido e sentido em diversos bairros e regiões, telefones apitaram pela cidade inteira, com uma avalanche de informações e imagens supostamente relacionadas ao fato. A disseminação de conteúdo inverídico, que trazia imagens de pessoas acidentadas, carros em chamas e supostos números de mortos e vítimas, não apenas deixou a população em pânico (sobretudo os moradores do entorno da Imbel), mas também prejudicou a atuação de serviços que atuavam na ocorrência, como o Corpo de Bombeiros.

“A tecnologia permitiu que nos mobilizássemos e organizássemos mais rapidamente dentro da corporação, mas o medo generalizado causado pelas informações inverídicas causou vários problemas. Vários curiosos se dirigiram ao local, dificultando a circulação das equipes e viaturas e pondo em risco sua própria segurança. Além disto, vários moradores saíram de suas casas sem que houvesse necessidade, querendo orientação sobre como agir. Isto desloca profissionais de suas funções para dar atenção a estas demandas, além de congestionar nossas linhas de atendimento e nosso sistema, o que pode refletir em outras ocorrências, além do andamento do caso da Imbel”, desabafa o assessor da corporação, tenente Acácio Tristão, destacando que a avalanche de factoides afeta instituições parceiras da corporação. “Vários órgãos se mobilizaram na intenção de nos ajudar sem que fosse preciso, e com isto deixaram de atender quem realmente precisava pelo menos por algum tempo”, observa.

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A funcionária pública Ana Paula Figueiredo começou a receber mensagens com imagens das chamas e de vidros quebrados por volta das 23h20, acompanhadas por áudios atribuídos a funcionários da Imbel e órgãos da Prefeitura que supostamente orientavam os moradores a deixarem suas casas, além de imagens subsequentes de vítimas e estragos. “Em um dos áudios falava-se em novas explosões. Fiquei com o coração apertado por ter parentes e amigos que moram próximo e porque, dependendo da gravidade, poderia atingir uma área muito mais ampla. Moro no (bairro) Santa Helena e ouvi a explosão. Só fiquei mais tranquila quando soube da informação oficial de que não houve vítimas”, relata.

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Em nota, a Imbel informou que “repudia informações sensacionalistas e mentirosas que vêm circulando nas redes sociais sobre o acontecimento”. A indústria reiterou, ainda, que “a explosão não ocasionou qualquer vítima e que os danos materiais foram de pouca monta”. Também lembrou que a empresa está fazendo levantamento dos moradores cujas casas foram afetadas, para que haja “oportuna recuperação”. Por fim, a instituição orientou que qualquer informação de sua autoria será divulgada pelo site imbel.gov.br ou na página oficial da empresa no Facebook.

 

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Conteúdo replicado traz graves consequências

Para a jornalista, professora universitária e pesquisadora de redes sociais Aline Maia, além de atrapalhar os serviços de atenção, como os do Corpo de Bombeiros e do Samu, e instaurar um clima de apreensão, a profusão de conteúdo inverídico tem consequências a longo prazo. “As instituições oficiais e os órgãos de imprensa acabam perdendo sua credibilidade junto à população que, movida pelo imediatismo, prefere acreditar na primeira informação que tem do que esperar pelo relato que foi apurado e verificado, e, por isso mesmo, leva tempo para ser obtido.”

Em coro, o jornalista e especialista em redes sociais Renan Caixeiro destaca o perigo da falsa impressão de confidencialidade do meio digital. “As pessoas se esquecem de que não estão falando só com um amigo no WhatsApp ou no Facebook, o que se fala para a internet é repassado, replicado, dito para o mundo. Com isso, há consequências gravíssimas, pessoas já foram linchadas devido a ‘hoaxes’ (boatos espalhados digitalmente) de que teriam cometido crimes hediondos. O usuário precisa entender que tem responsabilidade sobre e informação que repassa”, alerta Renan.

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Incêndio na Floriano

Segundo ele, a catástrofe ocorrida na Imbel, se comparada a outro acidente de grande porte ocorrido na cidade, o incêndio da Tetê Festas, na Rua Floriano Peixoto em 2011, mostra como as redes sociais passaram a ter um papel muito mais relevante na maneira como as pessoas e instituições se comunicam. “Na época, eu mesmo não tinha acesso 3G, só fui me informar sobre o ocorrido quando liguei meu computador em casa, após chegar do trabalho. Os smartphones e o acesso móvel à internet não tinham amplo acesso de todas as classes como hoje, então as informações que não as oficiais eram mais pulverizadas, por isso prevalecia sempre o conteúdo que vinha da imprensa.
A própria cobertura dos veículos era diferente: a maioria ainda não dispunha de infraestrutura para fazer transmissões móveis e repassava as informações à redação por ligação telefônica”, avalia. “Hoje em dia, qualquer pessoa dispõe dos mesmos recursos que as empresas de comunicação têm, então é muito mais fácil haver essa produção de boatos sendo tomados como verdade no lugar da informação jornalística, que foi trabalhada, checada e produzida com responsabilidade.”

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Postagem falsa poderia ter agravado problema

Para o tenente Acácio Tristão, o mais grave sobre o que ele chamou de “caos de informações” foi a criação de uma falsa postagem atribuída à Tribuna, que dizia “centro de munições da Imbel sofre explosão, deixa pelo menos 3 funcionários mortos e outros 7 feridos. Mais informações em breve”. “Como tínhamos equipes trabalhando no local, sabíamos que o conteúdo não era verdadeiro. Mas caso ainda não estivéssemos na Imbel, nossa estratégia de atuação seria completamente diferente a partir desta publicação, que se fez passar por post de um veículo oficial de comunicação – informação, para nós, de credibilidade e que norteia nosso trabalho. Por isso, a atitude é tão grave, irresponsável e poderia ter efeitos desastrosos”, explica.

A Tribuna repudia a circulação de falsas informações mascaradas de trabalho jornalístico e informa que nenhum dos perfis oficiais do veículo usa a identidade “@TribunadeMinas”, empregado pelo falsário. No Twitter e no Instagram, o nome de usuário do periódico é “@tribunademinas”, e nenhuma postagem foi feita nestas redes na noite de terça-feira, dia 16, quando a cobertura foi concentrada no Facebook, visando a atingir um número maior de usuários. Além disto, o jornal informa que em momento algum publicou que a explosão tivesse ocorrido no “centro de munições” da Imbel ou que tenha deixado vítimas. A informação dada – somente após o acesso a dados oficiais obtidos por apuração no local – foi que o acidente havia ocorrido em um dos paióis da empresa, não havendo registro de vítimas.

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O setor jurídico da Tribuna está tomando as providências legais cabíveis ao caso, e o veículo reitera seu compromisso com a informação ética e de responsabilidade, visando ao objetivo primordial do jornalismo: seu papel social junto à população.

 

Criação de factoides está sujeita a punição

Segundo o advogado Alexandre Atheniense, um dos precursores do Direito da Tecnologia da informação no Brasil, penalidades podem ser aplicáveis tanto a quem repassa informações de fonte desconhecida quanto àqueles que a criam. “Quem passa estas mensagens adiante pode ser considerado corresponsável, uma vez que a origem delas nem sempre é facilmente identificável. A partir disto, é preciso pedir ao provedor (seja um aplicativo ou site) para divulgar dados que possam remeter ao possível autor para ver como o crime, caso haja um, será classificado e a devida penalidade será aplicada”, diz.

Segundo Atheniense, é impossível prever a punição porque, caso sejam constatados, os atos ilícitos podem ter naturezas distintas: perturbação da paz, falsa identidade, incitação da violência, entre outras. O advogado orienta que o primeiro passo de quem se sinta lesado pela divulgação de falsas informações é guardar a evidência deste compartilhamento. ” É a partir delas e dos rastros que elas deixam que se pode dar início a uma investigação judicial para identificar os autores que, caso sejam constatados como infratores, serão punidos com êxito.”

Para Renan Caixeiro, muitas pessoas que agem de má-fé, criando “hoaxes”, acreditam ainda num pretenso anonimato propiciado pela internet. “Mas ao passo que a tecnologia evolui, a Justiça evolui também. Já há jurisprudências e leis sendo aplicadas contra crimes virtuais, o próprio Marco Civil é um exemplo disto. Só que acho que mais importante é conscientizar as pessoas de que há consequências para informações, fotos e dados repassados sem que haja conhecimento da fonte. E acho que isto está acontecendo devagar. O caso da Imbel tende a fazer com que os usuários pensem duas vezes antes de compartilhar informações sem checá-las.”

Além da responsabilidade com o conteúdo compartilhado, a especialista Aline Maia destaca a importância de sempre se buscar as fontes mais oficiais possíveis. “A imprensa erra? Sim, mas muito menos do que um usuário comum do WhatsApp ou Facebook, até porque ela está muito mais sujeita a processos judiciais caso o faça. Então a informação dos veículos de comunicação é sempre um bom caminho a se seguir. E já que estamos falando em tecnologia, seu lado bom é que corporações e instituições cada vez mais têm páginas oficiais em redes sociais”, indica. “No dia da explosão, procuramos manter nossa página do Facebook atualizada com as informações oficiais o tempo todo”, completa o tenente Acácio Tristão, reforçando a afirmativa.

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