O estrondo ouvido por toda a cidade, na noite de terça-feira, foi provocado pela explosão de centenas de granadas em processo de montagem que estavam armazenadas em um dos três paióis da Indústria de Material Bélico do Brasil (Imbel), na Zona Norte. A suspeita é que houvesse pelo menos 400 corpos destes artefatos no paiol de número um, destruído no incêndio. O acidente, que repercutiu nacionalmente, levou pânico à população de várias regiões de Juiz de Fora, onde está localizada uma das cinco fábricas da empresa pública no Brasil. O impacto foi sentido, principalmente, no Bairro Araújo, que fica a um raio de 500 metros de distância do epicentro da explosão. Várias casas tiveram janelas e portas destruídas, levando pânico aos moradores da Zona Norte. Preocupados, muitos correram para a via pública, na tentativa de se proteger de possíveis desabamentos. Levantamento da Defesa Civil aponta danos em dezenas de moradias, mas nenhuma delas precisou ser interditada. A direção da indústria abriu inquérito técnico administrativo interno para investigar o caso. Os trabalhos serão acompanhados pela Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército. Por enquanto, não há previsão para a retomada das atividades.
Ainda não há informações sobre as prováveis causas do acidente, mas nenhuma hipótese será desconsiderada, inclusive a de incêndio criminoso. “Apesar de a hipótese de incêndio criminoso ser remota, ela é viável. Nenhuma linha de investigação será descartada. Na prática, os explosivos que existem na granada são relativamente estáveis. Pode ter havido uma desestabilização química, mas qualquer afirmação nesse sentido é prematura, afirmou o chefe de Comunicação Institucional da Imbel, em Brasília, coronel Marcelo Muniz.
Fábrica já registrara três acidentes fatais
Procedimentos de segurança
Apesar da magnitude da explosão, cujas chamas puderam ser vistas a quilômetros de distância, a Imbel destaca a ausência de vítimas e o funcionamento do sistema de segurança, já que os outros dois paióis não foram afetados pela explosão, embora um deles tenha tido o teto danificado. “Apesar de a explosão ter sido muito forte, os procedimentos de segurança minimizaram os efeitos. Se a explosão se propagasse horizontalmente, e não para o alto, como ocorreu conforme as normas de segurança, a onda de choque seria violenta”, explicou o coronel Muniz, destacando, ainda, a existência de sensores de temperatura e de sensores de umidade nos locais de armazenamento, necessários para manter a estabilidade química do material explosivo.
Solicitação de interdição
Mesmo sem vítimas, a dúvida quanto à segurança dos quase 250 trabalhadores da fábrica em Juiz de Fora levou o sindicato que representa os servidores a solicitar a interdição da empresa junto ao Ministério Público Federal (MPF). “Precisamos saber da verdade dos fatos, mas o silêncio da empresa é preocupante. Mesmo que 90% do quadro tenham sido dispensados do trabalho hoje (quarta), os trabalhadores da conservadora entraram na fábrica, o que é um absurdo, pois não sabemos o tamanho do risco”, afirma o presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Químicas, Farmacêuticas e de Material Plástico de Juiz de Fora e Região (Stiquifamp/JF), Scipião da Rocha Júnior.
O coronel Muniz afirma que, mesmo que a explosão ocorresse durante o turno de trabalho, a segurança estaria garantida, pois o local onde a acidente ocorreu é de acesso restrito. Somente pessoas autorizadas podem entrar na área que é isolada do restante da fábrica. Em nota, a Imbel acrescentou que “segurança é um valor intangível que consta do seu planejamento estratégico e baliza as principais decisões gerenciais da empresa.” Ainda segundo a nota, os empregados foram liberados do expediente por iniciativa da empresa até a completa normalidade das atividades.
Diante da repercussão do caso, o vereador Cido Reis (PSB) apresentou requerimento para a criação de uma comissão na Câmara para investigar o episódio. O pedido foi aprovado em plenário e, em princípio, o próprio Cido deve integrar o colegiado, que deve contar, ainda, com Chico Evangelista (Pros) e outro vereador indicado pela presidência da Casa.
Estrondo levou danos a imóveis da região
A explosão causou prejuízo a moradores de diversos pontos da Zona Norte, que tiveram portas, janelas e outras estruturas de suas casas danificadas. A Imbel já deu início ao levantamento de moradores afetados, e garantiu que irá ressarcir os prejuízos. Além do Bairro Araújo, onde fica a empresa e há muitas pessoas afetadas pelo incidente, há registro de estragos em bairros como Nova Era, São Judas Tadeu, Santa Cruz e Nova Benfica. Em Benfica, a explosão destruiu uma porta de vidro da agência do Banco do Brasil, que fica na Praça Jeremias Garcia. O gerente geral da unidade, Adilson Gomes, informou que, provavelmente, o banco não vai pedir ressarcimento à Imbel, já que conta com seguro próprio. Enquanto a porta não for substituída, serão colocados tapumes no local. No mesmo bairro, um restaurante também teve janelas e porta de vidro estilhaçados com o deslocamento de ar provocado pela explosão. “Eu também moro no Araújo. Durante a madrugada, saí de casa e fui para a minha granja. Hoje, 6h, nos deparamos com esta situação. Estou registrando fotos para pedir ressarcimento à Imbel”, disse a proprietária do estabelecimento, Chislaine Souza, 34 anos. A Praça CEU também teve sete vidros quebrados e duas portas empenadas, além de pontuais quedas de rebocos das paredes.
Mas os maiores prejuízos foram mesmo para os moradores do Araújo, que, até o início da tarde desta quarta-feira, tentavam entender o que tinha acontecido.
A Tribuna esteve no local ainda durante a madrugada e observou famílias inteiras apavoradas. Muitas, por conta própria, deixavam o bairro, enquanto outras ficavam nas ruas, sem saber o que fazer. Apenas por volta de 1h, após checar a real situação, é que o Exército se pronunciou sobre o acidente.
Quase todos os moradores da Rua Coronel Ancino Nunes Pereira tiveram prejuízos. Esta via é perpendicular à Avenida Brasil, próximo ao leito do Rio Paraibuna, a um raio de aproximadamente 500 metros do local da explosão. É o ponto habitável mais próximo do epicentro. Morador desta via, Tarcísio Ribeiro estava deitado quando as telhas de amianto se quebraram e caíram pedaços de tijolo no cômodo. “Na hora, não sei nem o que pensei, foi um susto enorme. Eu ia mudar minha cama de lugar, e ia cair exatamente em cima de mim, foi livramento”, disse. Os tijolos que quebraram as telhas da cada de Tarcísio foram arremessadas do segundo andar da residência vizinha. O dono deste imóvel, o aposentado Adolfo Gonçalves, contou que assistia a um jogo de vôlei pela TV com sua esposa quando ouviu o estrondo. “Na hora, pensei que fosse uma bomba, parecia que meu terraço estava sendo arrancado. A minha cobertura tinha tijolos vazados em cima do beiral, eles foram arrancados. Além disso, tive janelas quebradas e porta danificada.”
Na mesma rua, a moradora Maria Rosângela, que também teve muitos prejuízos em seu imóvel, relatou que, no momento da explosão, as ruas do bairro viraram um caos. “Ninguém sabia o que tinha acontecido, foi uma correria na rua, todos apavorados. A gente não sabia de onde tinha vindo o barulho, parecia que um trator tinha invadido minha casa. Foi horrível.”