Rafael Carlos Macedo de Souza, mestre em Enfermagem pela UFJF, dedicou-se a compreender como uma cirurgia mutiladora no sistema geniturinário masculino, que envolve a retirada total ou parcial de órgãos, como o pênis, a próstata e os testículos, afeta o bem-estar dos homens. Para isso, ele apresentou dados relacionados às cirurgias mutiladoras no período entre dezembro de 2015 e novembro de 2016 realizadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). No total, foram feitas 222 cirurgias de retirada do pênis, 5.128 de remoção dos testículos e 8.313 de retirada da próstata.
Em sua dissertação, elaborada como pré-requisito para obtenção do título de mestre, o enfermeiro analisou as vivências de 13 homens que passaram por uma cirurgia mutiladora em um hospital universitário da Zona da Mata e concluiu que eles vivem constrangidos e enfrentam a perda da masculinidade. “Uma cirurgia, seja ela qual for, já causa medo e ansiedade no paciente. Quando associada à parte urológica, que no homem é muito significativa, a cirurgia ganha um peso ainda maior, pois esses órgãos representam a masculinidade para ele.”
Para conclusão do curso de graduação, o acadêmico já tinha analisado as vivências dos homens que descobrem a necessidade de passar por uma cirurgia. “Verifiquei que, no pré-operatório, eles já tinham medo de não conseguir manter uma vida sexual após a cirurgia, além do medo da anestesia e da intervenção em si. Já no pós-operatório, analisei os impactos da retirada desses órgãos”, conta Rafael. Entre os principais motivos para a necessidade de retirada de um desses órgãos estão torsões nos testículos, fimose e, principalmente, o câncer de próstata. Algumas patologias têm início com a falta de higiene. Por isso, é essencial fazer a limpeza adequada, consultar-se com um médico frequentemente e buscar atendimento caso surja algum sintoma.
Saúde do homem
De acordo com Rafael, o interesse na saúde do homem surgiu porque o ambiente da área é muito feminino, o que, para o enfermeiro, destaca a necessidade de atenção ao homem, tanto por parte da população como dos profissionais de saúde. “Os homens têm medo de ir até os serviços de saúde, até porque a atenção básica de saúde é considerada por eles como um ambiente feminino, onde a maioria das profissionais é mulher. Isso causa uma dificuldade de acesso. Além disso, existe a ideia de que ele é forte e viril e que, por isso, não adoece e não precisa de cuidados, o que faz com que o homem não se previna.”
Anna Maria de Oliveira Salimena, professora da Faculdade de Enfermagem da UFJF e orientadora do acadêmico, afirma que é preciso inovar e vislumbrar as possibilidades da área, o que Rafael fez ao abordar o assunto. “Percebemos que o homem demora muito para procurar se cuidar por vários fatores, mas o principal é ele achar que não está doente, que não precisa fazer prevenção, que é bobagem ir ao médico. Quando ele chega a procurar ajuda, já está com algum problema maior. Muitos alegam falta de tempo e falta de disponibilidade por conta do horário de trabalho, mas, na verdade, sabemos que é cultural, que ele acha que não precisa daquilo.”
Chance de cura é de 90% em diagnósticos precoces
O câncer de próstata, segundo tipo de câncer mais comum entre os homens, perdendo apenas para o de pele não melanoma, pode fazer 14 mil vítimas fatais no Brasil somente neste ano. A estimativa é do Instituto Nacional do Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca), que também prevê o surgimento de 61 mil novos casos da doença em 2017. Apesar dos dados, a chance de cura é de 90% para casos da doença diagnosticados precocemente.
Segundo o médico responsável pelo Serviço de Urologia do Hospital Universitário da UFJF e parceiro da Secretaria de Saúde na campanha Novembro Azul, Humberto Lopes, o câncer de próstata não tem sintomas na fase inicial. Se o paciente chega a sentir algum sintoma, é sinal de que a doença está em estágio avançado, o que acontece em 20% dos casos. “Por isso, a orientação é não esperar e realizar exames preventivos a partir dos 50 anos.” No entanto, há grupos de risco para a doença. “Homens cujos pais, irmãos ou parentes próximos tiveram a doença, homens negros e obesos devem iniciar os exames preventivos com 45 anos, pois têm mais risco de desenvolver a doença”, alerta o médico.
De acordo com o especialista, apesar de não haver causas específicas para o câncer de próstata, alguns fatores podem contribuir com o surgimento da doença. “Sabemos que, em determinado momento da vida, a próstata pode sofrer mutação. Ao invés de nascerem, crescerem e morrerem, as células cancerígenas passam a se disseminar. Por isso é necessário ter uma alimentação adequada, evitar cigarro e álcool e praticar atividades físicas regularmente”, explica Lopes.
Preconceito
Entre os impedimentos utilizados pelos homens, consciente ou inconscientemente, para evitar a ida ao médico, está também o preconceito ligado ao exame de toque para detecção de tumores na próstata. O exame, feito manualmente pelo profissional, que insere um dedo no ânus do paciente para apalpar a próstata, é considerado por muitos homens como algo que vai diminuir a masculinidade dele. Apesar de o exame não ser obrigatório, o especialista pontua que médico e paciente devem conversar sobre isso.
“As vantagens e desvantagens de fazer a avaliação da próstata têm que ser discutidas com o paciente. O médico tem que orientar nesse sentido. Se o paciente se recusar, isso pode gerar uma consequência caso haja suspeita da doença, como o risco de fazer biópsia, que pode causar sangramento. No caso do exame de toque, o médico usa luvas e lubrificação, e é possível verificação a consistência da próstata e se há nódulo ou não.”
Ainda conforme o médico, o exame não altera em nada a masculinidade do paciente e contribui para o diagnóstico precoce. “O exame dura menos de um minuto. Pesquisas já revelaram que 99% dos homens que vão ao urologista pela primeira vez perdem o preconceito e voltam, porque o exame é rápido, não dói e é feito com o médico de confiança do paciente. O homem que se previne está contribuindo para sua saúde e de sua família.”
Horário alternativo para consultas em UBSs
A campanha Novembro Azul ficou mais popular em meados de 2010 e tem se tornado cada vez mais importante no calendário de ações voltadas à saúde. Com o objetivo de conscientizar os homens e a sociedade em geral sobre a importância da prevenção contra o câncer de próstata, a campanha também tem abordado questões relativas à saúde do homem de forma geral. Em Juiz de Fora, a Secretaria de Saúde disponibilizou horários alternativos durante este mês para que os homens se consultem e realizem os exames preventivos.
Desde a última terça-feira (7), as Unidades Básicas de Saúde (UBSs) têm atendido cem homens por dia, das 18h às 20h, para a realização do exame de próstata combinado ao de sangue PSA, (antígeno prostático específico) (ver quadro). A ideia é oferecer mais uma oportunidade para que os homens cuidem da saúde. Além dos exames, as unidades também terão atividades educativas, com informações relevantes sobre diversos temas, como prevenção e controle de doenças sexualmente transmissíveis (DST/Aids), direitos reprodutivos e planejamento familiar, violência sexual e familiar, tabagismo, alcoolismo, imunização, hipertensão arterial, diabetes, obesidade, saúde do trabalhador, vigilância nutricional e alimentar, importância da atividade física, saúde mental e outros.
Segundo o urologista Humberto Lopes, a iniciativa visa a alertar o homem sobre a saúde, de forma geral. “Acabamos focando no câncer de próstata, mas os homens deveriam cuidar de sua saúde o ano todo, controlando a hipertensão, diabetes, entre outras patologias. Outra orientação é para aqueles que já foram diagnosticados: eles não devem ficar preocupados, pois, atualmente, existem diversos tipos de tratamento e a cirurgia não é a única solução.”
A Secretaria de Estado de Saúde também está orientando os homens a cuidarem da saúde. Com o tema “O sempre é o momento ideal para cuidar de sua saúde”, a pasta visa a alertar os homens sobre os riscos de não se consultar com frequência ou de não realizar exames preventivos.