Em relação à abertura do inquérito de injúria racial contra o conselheiro tutelar Abraão Fernandes, a autora da denúncia Mariana Martins, 25 anos, foi ouvida na delegacia, em São Mateus, na manhã desta terça-feira (17). O caso ficará a cargo do delegado Luciano Vidal, que não detalhou o que foi dito pela jovem durante seu depoimento. Ele ressaltou que irá se pronunciar sobre a situação só depois da conclusão da investigação. A abertura da apuração tem como base o Registro de Eventos de Defesa Social (Reds) feito por Mariana, na segunda-feira (16), por volta das 20h.
Segundo o documento, a universitária procurou a Polícia Militar para relatar que houve uma discussão entre várias pessoas no Facebook e, na ocasião, o conselheiro Abraão Fernandes teria encaminhado uma mensagem privada a ela, na qual afirma que a jovem “tinha cor de bosta” e que ela deveria se cuidar melhor, pois devia esconder um monte de coisas na cabeça, menos pente e shampoo. Ainda conforme o registro, a vítima afirmou que possuiu provas materiais dos fatos ocorridos que seriam apresentadas à Polícia Civil.
Em entrevista à Tribuna na segunda-feira, Mariana afirmou que os insultos proferidos pelo conselheiro causaram indignação na sua família. Como ela aponta, Abraão estava incitando a violência, com discurso de ódio, usando a prerrogativa da defesa da família. Ao jornal, o conselheiro negou ter feito o post e sugeriu que ele pode ter sido montado como forma de desqualificá-lo.
Advogada ressalta o perigo do discurso de ódio
Segundo Joana Machado, professora da Faculdade de Direito da UFJF e integrante da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da OAB/JF, as manifestações atribuídas ao conselheiro tutelar Abraão Fernandes agravam-se por seu cargo, porque sua visão passa a ser uma visão institucionalizada, não apenas uma opinião. “É bastante preocupante que alguém que trabalhe com o acolhimento de crianças e adolescentes defenda abertamente a redução da maioridade penal e faça comentários associando cor, local de moradia e condição social à criminalidade, entre outras declarações discriminatórias. Imagine quantas crianças e adolescentes podem ter sofrido violência institucional por causa destes posicionamentos!”, pondera a especialista.
A advogada ressalta que mais importante do que as punições previstas neste caso é a discussão sobre o avanço do discurso de ódio. “A repercussão dos casos é importante muito menos pelas punições cabíveis, até para que não se faça um linchamento público. É mais pedagógico, fundamental e eficaz tentar o que tem fundamentado este discurso de medo e ódio contra a diversidade, o que faz com que ele se torne tão sedutor.”
Representação no Ministério Público Federal
O conselheiro tutelar entrou com a representação no Ministério Público Federal (MPF), na última segunda-feira (16), solicitando que seja verificada a conduta do artista performático Nino de Barros. Nesta terça-feira (17), a assessoria de comunicação do MPF informou que a representação foi registrada e que irá seguir o trâmite normal, a fim de ser distribuída para um procurador. Conforme o órgão, até a próxima sexta-feira, deverá ser designado um procurador para apreciar o caso, avaliando se há ou não necessidade de intervenção do MPF. Dependendo dessa avaliação, poderá ser instaurado um processo cível para apuração ou até mesmo o caso ser arquivado.
Para Abraão, o vídeo faz apologia à ideologia de gênero e seu conteúdo deseja desconstruir o que foi ensinado pelos pais, “ferindo de morte um dos direitos fundamentais dos pais e responsáveis”. O conselheiro diz, ainda, que, quando Nino se refere à família brasileira de forma pejorativa, irônica e desrespeitosa, a drag não apenas fere as famílias, mas também as crianças que ali estão, já que estas são integrantes da família e, como sujeitos de direitos, devem ser reconhecidos e respeitados.