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Marido é interrogado por uma hora em julgamento do homicídio de Jomara Amaral

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Familiares e ativistas protestaram em frente ao Fórum Benjamin Colucci (Foto: Olavo Prazeres)
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Cartazes contra a violência que fere e tira a vida de tantas mulheres foram espalhados na porta do Fórum Benjamin Colucci nesta terça-feira (17), clamando por justiça no caso da morte de Jomara Amaral, 38 anos, assassinada com golpes de arma branca no dia 29 de dezembro de 2009. Apesar de ter confessado o crime, o comerciante Marcos André Canavellas Pereira, 49, responde em liberdade durante esses quase nove anos em que a família luta por sua prisão. Pouco antes das 9h30, ele chegou sozinho ao Fórum para o segundo julgamento do caso – o primeiro, ocorrido em 2015, foi anulado após apelação do Ministério Público, com base na tese de que a decisão do Conselho de Sentença foi manifestamente contrária à prova dos autos, resultando em uma pena de dez anos, considerada baixa.

Desta vez, a família está mais confiante em uma punição. “Se Deus quiser, vai dar tudo certo. Ele caiu em contradição e mentiu o tempo todo”, avalia a irmã da vítima Denise Amaral, 49, sobre o interrogatório do réu no Tribunal do Júri, que durou uma hora e encerrou o período da manhã na sessão presidida pelo juiz Paulo Tristão. Após o sorteio dos jurados, o Conselho de Sentença foi composto por seis mulheres e um homem. O julgamento teve início com os depoimentos das testemunhas de defesa e acusação. Já na parte da tarde, acontecem os debates entre os dois lados. A expectativa é de que a sentença seja anunciada ainda nesta terça.

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O assistente de acusação, Nelson Rezende Júnior, representa as duas filhas do casal. Na época do crime, elas tinham 10 e 12 anos e chegaram a ver a mãe ferida, ensanguentada no corredor de acesso à residência onde moravam, na Avenida Olegário Maciel, no Bairro Paineiras, região central. Atualmente com 19 e 20 anos, as jovens não desejaram comparecer ao julgamento do pai, mas uma delas passou a procuração ao advogado, que atua em um escritório-escola. As duas filhas precisaram passar por tratamento psicológico em decorrência do trauma.

 

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As meninas têm o interesse de que a honra da mãe não seja mais manchada. Elas querem a condenação do pai, sem a redução de pena. Não querem que pareça que o pai matou provocado pela mãe. Na verdade, elas entendem que não houve provocação e que ele matou de maneira covarde.

Nelson Rezende Júnior, assistente de acusação

 

Nelson acredita que Marcos pode ser condenado a cerca de 15 anos de reclusão. “Houve um recurso da pena aplicada da última vez por parte do Ministério Público e houve também um recurso por parte da defesa, que não foi provido. A acusação entendeu que houve um reconhecimento de um privilégio para o réu fora das provas. Ou seja, não teria nenhuma prova que recomendasse uma diminuição de pena como aconteceu. Por isso, o júri foi anulado. As provas recomendam uma pena bem maior hoje, sem uma redução que varia de um sexto a um terço. Acho que o julgamento está em torno do que sentem os jurados. Da outra vez, de alguma maneira, tiveram alguma piedade do réu.”

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Em seu interrogatório, acompanhado pela reportagem, Marcos insistiu na tese de que teria agido “sob forte emoção” ao descobrir uma suposta traição da esposa por meio de contatos telefônicos, quando ele ainda passava por tratamento pela dependência de cocaína. Ele afirmou não se recordar do momento exato em que desferiu os golpes contra a vítima. O réu disse ter sacado o canivete que estava junto ao seu chaveiro do carro e apenas ter visto depois sua mão suja de sangue. “Matei no impulso, quando ela disse que ia para Cabo Frio ficar com outra pessoa.” Jomara teria sido surpreendida por volta do meio-dia, quando chegava em casa para viajar com as filhas para a Região dos Lagos. A vítima sofreu pelo menos seis perfurações cortantes. Duas delas atingiram o pulmão e o coração, causando a hemorragia que levou ao óbito.

Jomara apresentava marcas de agressão quando o socorro chegou. Apesar das denúncias de que o réu já havia agredido a mulher outras vezes, ele alegou “nunca ter encostado a mão nela”, voltando atrás logo depois ao admitir “uma bofetada”. Ele também afirmou ter cortado algumas roupas da companheira, mas não soube explicar o motivo. O homem ainda disse que a própria vítima teria “pulado do carro em movimento”, quando a denúncia era de que ela teria sido empurrada de dentro do veículo. Denise Amaral afirmou que a irmã havia sido espancada cerca de uma semana antes de ser morta, durante uma festa. “Ela já estava se separando dele e sendo ameaçada de morte.”

O juiz lembrou durante o julgamento que a conclusão do laudo psiquiátrico forense é de que Marcos era plenamente capaz, na época, de responder por seus atos e de entender o caráter ilícito da sua conduta. “Eu errei, mas só eu sei o que passei. Fui fraco, mas estou aqui para ser julgado”, disse o réu perante o Tribunal.

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‘A saudade vai ser eterna, e a dor também’

Da mesma faixa etária que as filhas de Jomara Amaral, a sobrinha da vítima e estudante de direito Juliana Amaral, 21, decidiu acompanhar o julgamento. “Na época foi muito triste. É uma coisa que vai marcar nossa família para o resto das nossas vidas. Esperamos que pelo menos tenha justiça, que ele seja condenado pelo que fez. Isso é o mínimo, porque nunca mais vamos poder ter a Jomara de volta. A saudade vai ser eterna, e a dor também.”

Valéria Amaral, 56, também irmã da vítima, diz ser um momento muito difícil. “Por mim eu nem estaria aqui de novo hoje, para não mexer nessa ferida. Mas a expectativa é de que ele seja condenado. A maior vergonha que sinto é quando me perguntam se ele está preso. São muitas mulheres violentadas, e esse caso deveria servir de exemplo, mas é vergonhoso.”

Com frases como “Chega de feminicídio, Jomara presente”; “Nossas vidas importam. Por Marina, Jomara e tantas outras”; e “Ninguém é capaz de nos calar”, integrantes do coletivo Maria Maria e do Fórum 8M apoiaram a família nesta terça-feira (17). Sandra de Castro, integrante do 8M, foi enfática: “Não podemos deixar o caso da Jomara em branco, porque já se passaram quase nove anos e o assassino está solto até hoje. Nós mulheres estamos nesta luta para combater essa violência.”

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Integrante do Maria Maria, Laiz Perrut reforça: “Sabemos que essas mulheres não vão voltar ao nosso convívio, porque foram mortas por serem mulheres, por feminicídio. Mas esperamos que esse caso e todos os outros tenham um desfecho e que possam servir de exemplo, para que os homens pensem antes de cometer esses crimes. Não vamos deixar de nos manifestar até que todas nós sejamos livres e nenhuma mais seja morta.”

Quando Jomara foi assassinada, em dezembro de 2009, ainda não estava em vigor a lei 13.104 de 2015, que tornou hediondo o homicídio no contexto da violência doméstica e menosprezo à condição de mulher, qualificado como feminicídio e com reclusão de 12 a 30 anos.

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