Entre quinta (12) e sexta-feira (13), Juiz de Fora sediou a 3ª Conferência Municipal do Meio Ambiente com o objetivo de debater e propor soluções acerca do tema: “Emergência climática: o desafio da transformação ecológica”. O evento reuniu pessoas de diversos setores da sociedade, como especialistas, empresas privadas, estudantes, representantes de bairros e associações ligadas à causa ambiental, além da Administração municipal. Como resultado do encontro, de dez propostas desenvolvidas para enfrentamento da emergência climática, duas serão apresentadas na etapa estadual, prevista para acontecer entre janeiro e março.
A programação contou com palestras sobre temas ligados a recursos hídricos, resíduos sólidos, educação ambiental, justiça climática, emissão de gases do efeito estufa, prevenção de riscos e transformação ecológica. Além disso, também aconteceu o lançamento do e-book “Espécies arbóreas nativas indicadas para a restauração florestal em Juiz de Fora e região”, desenvolvido por pesquisadores da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). No entanto, o foco da iniciativa foi a discussão e a elaboração de alternativas para o enfrentamento aos impactos da emergência climática. A reportagem solicitou à Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) quais foram as propostas e as pessoas escolhidas para representar Juiz de Fora na etapa estadual, mas não teve retorno até o fechamento desta edição.
Conferência discutiu lacunas em JF
O secretário de Sustentabilidade em Meio Ambiente e Atividades Urbanas (Sesmaur) e presidente do Conselho Municipal de Meio Ambiente (Comdema/JF), Raphael Lopes, aponta que a conferência foi um momento de colocar em pauta o que tem sido realizado e discutir o que ainda precisa ser feito. “Discutir a emergência climática é tratar o nosso presente e o nosso futuro. A vida acontece nas cidades e nós precisamos prepará-las para lidar com os impactos da emergência climática. Nós precisamos ter a manutenção da vida no meio urbano.” O secretário também destaca a importância do engajamento da população: “temos que trabalhar com todos os setores da sociedade juntos para alcançar os objetivos e preservar a vida”.
No início deste ano, a Tribuna publicou uma matéria com dados do Serviço Geológico do Brasil (SGB), empresa vinculada ao Ministério de Minas e Energia, que mostram que Juiz de Fora ocupa o terceiro lugar no ranking dos municípios mineiros com mais áreas de risco. Com base na estimativa do SGB, 50.336 pessoas viviam em áreas de risco na cidade até fevereiro de 2024. Entre mais de 1.600 municípios do Brasil, a cidade está em 15° lugar. Durante o evento, a Defesa Civil mostrou os trabalhos de prevenção, mitigação, preparação, resposta e recuperação desenvolvidos no município para evitar e/ou atender emergências ambientais. Atualmente, Juiz de Fora tem 142 áreas de risco geológico, como possibilidades de deslizamentos de terra, e 27 de risco hidrológico, referentes a inundações. O órgão informou que vários locais são constantemente monitorados e que, de 2021 para 2024, o número de vistorias preventivas subiu de 405 para 1.300.
Para fiscalizar o que será feito após a conferência, a pedido do ambientalista Wilson Acácio, vice-presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica dos Afluentes Mineiros dos Rios Preto e Paraibuna, as ações debatidas serão atualizadas em pelo menos duas reuniões a serem realizadas no ano de 2025, abertas à população, para que o Comdema repasse as propostas que foram de fato implementadas.
Criação de gabinete de crise, implementação do Plano da Mata Atlântica e outras demandas da população
O especialista em mudanças climáticas e professor da UFJF Nathan Barros, reforça a importância da conferência para dar voz a diferentes pessoas para apresentarem suas inquietudes e necessidades de mudança. Para ele, Juiz de Fora não está preparada para lidar com os eventos climáticos extremos, e a ausência de um gabinete de crise para pensar a raiz do problema dificulta o avanço das ações.
“Nós precisamos de um gabinete de crise, porque esse momento que estamos vivendo hoje não é mais de emergência, é um momento de crise. Nós tínhamos uma missão na nossa geração: evitar o aumento da temperatura a 1,5 grau até 2030 em relação aos valores pré-industriais. E nós falhamos. Isso significa que não dá mais para voltar atrás e ter a forma de vida que nós temos até aqui. Temos que nos adaptar à nova realidade para mitigar as emissões e não passarmos de 2 graus”, aponta o professor.
O integrante do Conselho Municipal de Meio Ambiente (Comdema) e diretor do Programa de Educação Ambiental (Prea), Matheus Cremonese, relembra que aproximadamente 20% da população de Juiz de Fora vive em áreas de risco, o que reforça a necessidade de atenção. “Juiz de Fora não tem situações extremas, como em Petrópolis e no Rio Grande do Sul, mas o potencial para isso acontecer, infelizmente, existe. A topografia da cidade é muito complexa, uma região montanhosa com um relevo acidentado, muita encosta e vales encaixados, o que potencializa os efeitos de chuvas intensas e secas severas.” Segundo o diretor do Prea, que também é geógrafo, além das inundações – como as frequentes nos bairros Santa Luzia e Industrial -, o município também enfrenta recorrentes problemas de deslizamento de encostas, e a população pobre acaba sendo a mais afetada.
“Embora algumas regiões tenham recebido intervenções, o risco permanece, colocando em perigo a população. Esse cenário evidencia a questão da justiça climática e demanda uma resposta integrada do Poder Público, orientada pelo diálogo entre sociedade, técnicos e especialistas, e a conferência é uma forma de criar essa conversa”, ele diz.
Cremonese explica que a conferência não irá resolver os problemas de Juiz de Fora em si, mas reforça que alguns temas dos debates ao longo desses dois dias precisam ser, posteriormente, implementados. “Nós temos que aproveitar o que foi discutido aqui para colocar em prática na cidade, mas a conferência ainda tem etapas estadual e federal também, nas quais as propostas de Juiz de Fora podem ser selecionadas para aplicação em diferentes municípios e cenários.”
Essa não é a primeira vez que Suely Gervásio participa de uma Conferência Municipal do Meio Ambiente. Em 2013, a representante da União Juizforana de Associações Comunitárias de Bairros e Distritos (UNIJUF) também esteve presente. Ela comenta que, naquela época, quase não houve resultado depois do evento. Agora, Suely diz estar esperançosa e acredita que os assuntos debatidos na conferência irão ganhar uma maior proporção – já que os problemas estão mais evidentes – e contribuirão para a busca de soluções para Juiz de Fora. A respeito da sua participação, ela diz que os moradores são fundamentais para relatar os problemas enfrentados, já que são eles que os presenciam no dia a dia. “Quando visito diferentes comunidades, percebo que cada bairro é uma realidade. Então, juntos, nós temos que trocar experiência e trabalhar em projetos para poder ajudar o nosso município.”
Uma das convidadas a participar do debate, a jornalista e consultora ambiental Valéria Costemalle ressaltou a importância da conservação de biomas e manutenção de serviços ecológicos, citando a elaboração do Plano Municipal de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica (PMMA). O diagnóstico ambiental foi feito pela Prefeitura de Juiz de Fora a partir de convênio firmado com a UFJF em 2023. O PMMA recebeu o selo Tree Cities of the World (Cidade Árvore do Mundo), concedido pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO/ONU) e pela Arbor Day Foundation. Mais de um ano depois, as ações previstas ainda não foram colocadas em prática. “Na semana passada, o PMMA foi aprovado pelo Comdema. Nós precisamos acompanhar esse plano para definir as áreas prioritárias de conservação e, assim, preservar as nossas florestas.”