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Motoristas vivem com medo por trás do volante ‘Trabalhamos refém da linha’

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“A população desconhece a rotina de medo que motoristas e cobradores são obrigados a enfrentar. Já ouvi gente dizer que nossa categoria é vaidosa e gosta de tumultuar, mas não sabe o que acontece nos pontos mais longíncuos onde temos que ir. Não conhece nossos itinerários de riscos. Muitas vezes saímos de casa com medo de não voltar”, desabafa um motorista, que diz se sentir invisível perante as autoridades. “Nossas demandas não estão sendo enxergadas. Só temo que providências cheguem depois que o pior acontecer”, alerta o profissional. Para não ser prejudicado no emprego, ele prefere não ser identificado. A apreensão atrás do volante, conforme o Sindicato dos Trabalhadores em Transporte e Trânsito (Sinttro), é realidade para os cerca de 3.500 trabalhadores, entre motoristas e cobradores, que servem o transporte urbano de Juiz de Fora.

O presidente do Sinttro, Vagner Evangelista Corrêa, afirma que, atualmente, a violência contra os profissionais está pulverizada e não é possível identificar qual a linha de maior insegurança. Mas os motoristas ouvidos pela Tribuna apontaram problemas nos trajetos que percorrem os bairros Sagrado Coração de Jesus (Zona Sul ), Vila Olavo Costa (Zona Sudeste), Nova Germânia (Cidade Alta), Parque das Torres e Vila Esperança I e II (Zona Norte). “Trabalho na empresa há um bom tempo, além do Sagrado, fazemos outras linhas e sabemos o quanto a situação é complicada, mas o Sagrado tem se sobressaído, porque é vizinho do Vale Verde e há um atrito muito grande entre grupos desses dois bairros”, diz um motorista que também terá o nome preservado. No último dia 26, um motorista que trabalha na mesma linha teve o carro alvejado de pedras. O episódio violento deixou três pessoas machucadas, inclusive o condutor, que se feriu com mais gravidade.

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“Quando estamos no percurso, acontece de encontrarmos membros dos dois grupos dentro do ônibus e sempre há brigas. Às vezes, passageiros do Sagrado que estão dentro do coletivo nos dizem para não parar em determinado ponto, porque tem moleques do Vale Verde esperando. Muitas vezes, esse tipo de situação resulta em pedradas e danos ao veículo. Eles inclusive já sabem quem está no ônibus, porque contam com olheiros e, por isso, ficam à espreita esperando. Assim, motorista e cobrador, além dos passageiros, são desrespeitados. A presença de idosos e crianças é ignorada”, afirma o profissional.

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Depois do apedrejamento da linha 137, no Bairro Sagrado Coração, os profissionais que atuam naquela região estão mais temerosos, pois, segundo eles, a rivalidade entre os grupos deixa o trabalho no volante mais arriscado. “Se estamos numa linha, a gente para e abre a porta para o grupo do bairro rival, eles acusam o motorista de ser conivente. Se não paramos, acontece os casos de apedrejamentos e pauladas, como aconteceu recentemente. Chega até a ocorrer tiros. Eles usam a expressão “mancomunados” para designar os motoristas que param o ônibus no ponto onde há uma gangue rival. “O motô está mancomunado com os caras de lá. Vamô pegar o motô” É assim que eles gritam”, denuncia.

Os profissionais também chamam a atenção para outra questão. Segundo eles, a mudança de linha é também outro fator de risco. “Hoje podemos estar numa que atende ao Sagrado, mas amanhã podemos estar na que serve ao Vale Verde, o que nos coloca sujeitos a retaliações”, lamenta o motorista, acrescentando que o período da noite é quando acontecem mais assaltos. “Às vezes entram dois meninos, até pagam a passagem, agem com naturalidade, mas num determinado ponto, eles sacam a arma e anunciam o assalto. Eles ameaçam nossa vida, colocam a faca no nosso pescoço, nos intimidam com pedaço de pau. É preciso sempre ter alguma coisa para dar para eles. Costumo dizer que trabalhamos refém da linha. Não podemos vacilar”.

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