Uma mulher de 45 anos, proprietária de um hotel infantil localizado na região central de Juiz de Fora, está sendo denunciada por maus-tratos, após a divulgação de um vídeo em que ela aparece sendo “ríspida e agressiva” contra bebês e crianças, como é descrito em boletim de ocorrência obtido pela reportagem. A gravação foi realizada na última quarta-feira (10) e compartilhada dois dias depois nas redes sociais. Nesta segunda-feira (15), um grupo de dez mães, em que os filhos estão matriculados na instituição, iniciaram as diligências preliminares para dar segmento às denúncias junto ao Ministério Público.
Os representantes legais das crianças estão sendo ouvidos pela Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG). Em nota, o órgão informou que instaurou procedimento para apurar os fatos e que as solicitações para exame de corpo de delito já estão sendo cumpridas. A Tribuna foi até o local e procurou o hotel infantil em questão, mas não obteve retorno até o momento desta publicação. Em caso de uma resposta, a matéria será atualizada com o posicionamento.
Um dos boletins de ocorrência sobre o caso foi feito na tarde do sábado (13). Os denunciantes são uma mulher, de 34 anos e um homem, 38, que relataram que a filha, 2 anos, seria uma das vítimas que aparecia na gravação.
Conforme consta no Registro de Eventos de Defesa Social (Reds), a filha do casal estava sentada, quando a dona do hotel pega a criança por um dos braços de forma “ríspida e agressiva”. Desta forma a menina é retirada de uma cadeira e colocada no chão. A criança estava matriculada no local há menos de uma semana.
Outro episódio no mesmo dia
A mãe também relatou à polícia que outro episódio envolvendo o local chamou sua atenção. A criança indicava aos pais quando estava com vontade de ir ao banheiro – pedindo que eles a levassem. Contudo, na data, ela informou aos pais que havia urinado na roupa dentro do hotel. Quando os pais questionaram o que teria ocorrido, a menina não soube explicar, demonstrando reação “acatada”.
A ocorrência, além de encaminhada para as polícias Militar e Civil, também está sendo apresentada ao Conselho Tutelar. Em nota oficial divulgada pelo órgão neste sábado (13), o Conselho reitera que o caso será orientado pelos princípios do Estatuto da Criança e do Adolescente. “Estamos, também, acompanhando as famílias e buscando os melhores caminhos para, junto à rede de proteção da infância do município, aplicar medidas de proteção e dirimir a consternação e eventuais traumas gerados pela situação”. A íntegra da nota pode ser conferida no fim da matéria.
Já a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) foi procurada mas informou que não vai se manifestar sobre o assunto.
Segundo testemunha, ‘bebês ficaram amarrados’
O vídeo que retrata o episódio de violência veio a conhecimento público na sexta-feira (12), quando uma das mães, que prefere não ser identificada, havia deixado o filho no hotel infantil e ido participar de uma entrevista de emprego. Assim como ela, outras mães estavam no trabalho quando tiveram o acesso ao vídeo.
De imediato, além de irem buscar os filhos no hotel, elas questionaram funcionárias do local, que não se pronunciaram a respeito do fato. Juntas, as mães procuraram ex-funcionárias da empresa, quando uma outra série de relatos de supostas agressões veio à tona.
O filho de um ano de Achellen Daiane Leite, 32, não foi na aula no dia em que o vídeo teria sido gravado. Ainda sim, ao ver as imagens, ela retrata ter sido tomada por um desespero, que aumentou diante do relato de uma testemunha.
“Ela (testemunha) estava falando com todas as mães. Ela falou que a situação era pior com os bebês e citou o nome de alguns, inclusive do meu filho”, expõe Achellen. As ações de violência teriam sido citadas por essa testemunha – que já entrou em contato com a polícia. “Ela (a dona do hotel) pegava os bebês e socava dentro do carrinho com força, enfiava comida goela abaixo e amarrava os bebês”, acrescenta a mãe da criança, sobre as práticas que ela só teve conhecimento após o relato dessa testemunha.
Machucados e assaduras
Até então, essas mães não se viam e também não possuíam um grupo para comentar sobre a rotina das crianças. Contudo, quando elas se reuniram, após o vídeo se tornar público, elas compartilharam histórias e viram que alguns aspectos se repetiam. É o caso das crianças machucadas com assaduras.
Segundo uma das mães, que preferiu não ser identificada, o filho voltava machucado para casa, mesmo que as fraldas fossem levadas até o hotel infantil. Outras mães, ao ouvirem a história, se manifestaram. Elas compartilhavam as mesmas experiências.
Próximos passos
Conforme a advogada Paula Assumpção, que representa os pais, a expectativa é de celeridade para os procedimentos deste caso. “O Conselho Tutelar está atuando para conseguir vagas substitutivas para as mulheres que precisam de rede de apoio, porque tendo em vista essa situação extraordinária, essas mães não têm onde deixar suas crianças. Muitas não têm mais dinheiro, porque elas pagaram a essa mulher para tomar conta da criança e agora elas não têm como fazer”, explica.
Desta forma, vagas em creche substitutiva estão sendo procuradas, mas, para além disso, a advogada também tem como alvo a interdição do hotel. O local, de acordo com ela, não teria permissão para ser caracterizado como creche, uma vez que não tinha abordagem educativa e pedagógica.
Assim que o caso tomar corpo de processo, ele será enviado ao Ministério Público. A intenção da defesa dos pais é a de que, seguindo os tramites judiciais cabíveis, as contas com o CNPJ do hotel e as contas da pessoa física proprietária sejam bloqueadas. A finalidade da representante jurídica é dar seguimento às investigações e conseguir que a responsável pelo hotel infantil seja responsabilizada.
Confira a nota completa enviada pelo Conselho Tutelar sobre o caso:
“Nós membros dos 5 Conselhos Tutelares de Juiz de Fora, acompanhamos as recentes denúncias, realizadas nas redes sociais, sobre violências praticadas contra crianças em uma instituição privada de cuidados, voltada para crianças de 5 meses a 10 anos, no município.
Desde então, o colegiado vem tomando providências e realizando as solicitações necessárias, junto aos órgãos competentes, visando apuração dos fatos e tomada de providências, visando a proteção das crianças, que é função prioritária desse Conselho Tutelar.
Estamos, também, acompanhando as famílias e buscando os melhores caminhos para, junto à rede de proteção da infância do município, aplicar medidas de proteção e dirimir a consternação e eventuais traumas gerados pela situação.
Reforçamos que nosso trabalho seguirá orientado pelos princípios do Estatuto da Criança e do Adolescente, com olhar solidário e de cuidado, àqueles e àquelas que representamos.”