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Frase racista volta a ser pichada em muro da escola

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Para tentar descobrir quem pichou a frase racista, Polícia Civil vai solicitar imagens dos prédios da vizinhança (Foto: Marcelo Ribeiro)
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Dois dias após ter sido apagada, a frase com conteúdo racista, com ofensa à origem da raça negra, voltou a ser pichada no muro externo da Escola Estadual Fernando Lobo, no Bairro São Mateus, na Zona Sul de Juiz de Fora. O caso, que já havia provocado indignação a quem passava pelo local, agora será investigado pela Polícia Civil, que instaurou inquérito para apurar a autoria da pichação. A investigação irá ocorrer na 1ª Delegacia, a cargo do delegado Luciano Vidal.

O vice-diretor da escola, Marcos Adriano, relatou que a nova inscrição traz exatamente o mesmo texto que já havia sido escrito no local. A primeira pichação foi percebida no muro depois do feriado de 7 de setembro. Nessa quarta-feira (13), a direção registrou novo boletim de ocorrência sobre o fato. “A Polícia Civil irá solicitar imagens dos prédios da vizinhança com objetivo de tentar identificar quem seria a pessoa ou as pessoas responsáveis”, afirmou o vice-diretor.

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Em razão da primeira pichação, a direção do colégio havia afirmado ao jornal que a instituição trabalha temas sobre diversidade e cultura afro-brasileira nas atividades pedagógicas desenvolvidas com os cerca de 1.500 estudantes matriculados do 1º ano do ensino fundamental ao 3º ano do ensino médio. Marcos Adriano reforçou, nessa quarta, que pretende iniciar uma campanha com objetivo de incentivar a reflexão a respeito do racismo. “Vamos começar um movimento, via escola, junto aos alunos, aos professores e à comunidade sobre o que é essa história do Brasil em relação ao racismo e ao preconceito contra os negros”, ressaltou, acrescentando que o fato ocorreu no muro de fora da instituição, mas poderia ser em qualquer muro. “Vamos propor ao colegiado da escola a campanha com o mote: “E se fosse no seu portão, no seu muro, na sua janela, o que você faria?”. Assim, vamos fazer as pessoas refletirem sobre a questão”, vislumbra o vice-diretor.

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Em nota encaminhada ao jornal, na última terça-feira, a Secretaria de Estado de Educação afirmou repudiar atitudes e manifestações de discriminação e de preconceito e que ações que estimulam o respeito às diferenças e o combate ao racismo são prioridades da atual gestão.

Prisão e multa

Em Juiz de Fora, quem for flagrado pichando pode ser preso por um período de três meses a um ano e poderá pagar multa que varia de R$ 500 a R$ 2 mil, conforme a Lei Municipal Antipichação 13.321, sancionada no ano passado. Já o conteúdo da frase pichada no muro da Escola Estadual Fernando Lobo também é considerado crime, porque atinge uma coletividade. A Lei Federal 7.716 define os crimes de preconceito racial e determina a pena de reclusão a quem tenha cometido atos de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. A legislação considera esse tipo de crime como inafiançável, imprescritível e de ação pública incondicionada, ou seja, não precisa da representação da pessoa lesada para que as autoridades públicas tomem providências a respeito da apuração dos fatos.

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Cidade ocupa terceiro lugar em desigualdade

Recente estudo publicado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) – órgão vinculado à ONU -, em parceria com a Fundação João Pinheiro e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), mostrou que Juiz de Fora é a terceira cidade do Brasil em desigualdade entre brancos e pretos. A pesquisa, publicada em junho deste ano, leva em conta o Índice de Desenvolvimento Humano (IDHM) da população negra. O município aparece depois de Porto Alegre (RS) e Niterói (RJ). De modo geral, o estudo, denominado “Desenvolvimento Humano para Além das Médias”, aponta que a população de negros cresceu, em média, 2,5% ao ano no Brasil, entre 2000 e 2010, acumulando alta de 28% no período, diante do 1,4% anual dos brancos ou dos 15% em dez anos. Mas, apesar do ritmo mais acelerado, só em 2010, o IDHM dos negros alcançou a pontuação (0,679) que já havia sido atingida pelos brancos dez anos antes (0,675). O índice mede a qualidade de vida para além da renda, ao levar em conta indicadores de saúde e educação.

Para o coordenador do Movimento Negro Unificado (MNU) de Juiz de Fora, Paulo Azarias, o episódio da pichação no muro da escola é uma realidade que pode ser observada em todo o Brasil em casos de intolerância e ódio, que crescem a cada dia. “Juiz de Fora nos preocupa, porque têm aumentado muito as manifestações racistas. Como a juventude negra, por meio dos movimentos, tem se assumido mais, isso tem incomodado muito os racistas, e esse tipo de ação não é isolada”, avalia Azarias, lembrando que exemplos de racismo estão explodindo pelo país. “No Estado do Rio de Janeiro, traficantes, em parceria com grupos religiosos, começam a proibir a prática da religião de natureza africana nas comunidades.”

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Ele lamenta que, atualmente, Juiz de Fora não tem dados que mostrem a situação dos crimes de racismo. “Não há um órgão específico para concentrar essas demandas. Não tem um órgão de acolhimento das pessoas que sofrem algum tipo de violência nesse sentido”, afirma o ativista, ressaltando que, mesmo que houvesse números, eles não iriam mostrar a real situação do racismo na cidade, pois muitos casos podem ser registrados com outra natureza, como injúria. “Além disso, há o medo da exposição e toda a burocracia para registro. É preciso mobilização de toda a sociedade contra qualquer forma de intolerância”, conclui.

Em 2014, reportagem da Tribuna mostrou que, segundo dados da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds), em Minas Gerais, a cada dois dias, uma denúncia de racismo era registrada. No total, foram 147 casos que evidenciavam este crime. O acumulado representava 12% a mais dos registros realizados, em 2013, quando 131 foram notificados.

Por princípio editorial, a Tribuna não publica frases ofensivas.
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