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Professor da UFJF conta sua batalha contra a Covid-19

professor ufjf coronavirus by monte sinai
Daniel Sales Pimenta teve alta médica no último sábado (11), após ficar três semanas internado (Foto: Monte Sinai/Divulgação)
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“Foi uma luta”, resumiu o professor do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Daniel Sales Pimenta, 57 anos, primeiro paciente grave positivo para Covid-19 do Hospital Monte Sinai considerado recuperado. Infectado pelo novo coronavírus durante viagem à França, ele teve alta médica no último sábado (11), após ficar três semanas internado, duas delas na UTI, alternando entre estados de lucidez e inconsciência, com sedação e ventilação mecânica. Daniel continua se recuperando cercado por dois de seus quatro filhos em Chácara, município vizinho a Juiz de Fora. Em entrevista à Tribuna nesta segunda-feira (13), o professor relembrou a viagem à Europa, que terminou três dias depois de ser decretada a pandemia, falou dos cuidados que tomou quando retornou ao Brasil e descreveu os momentos de angústia enquanto combatia o vírus. O carinho que ele recebeu dentro e fora do hospital ficou registrado nas fotos postadas nas redes sociais pelo Monte Sinai no sábado. Em apenas dois dias, as publicações ao lado da equipe de saúde alcançaram mais de 110 mil pessoas no Facebook e tiveram mais de seis mil curtidas no Instagram.

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Daniel havia viajado de férias para a França e ficou entre os dias 2 e 14 de março na casa de uma filha, 30, que mora em Estrasburgo. Ela também chegou a apresentar os sintomas da Covid-19, mas de forma mais branda. “Ficamos zaranzando para todo lado, o transporte público estava liberado ainda e havia pessoas andando. A gente ficava sem máscara, e lá estava pegando mais (a doença) do que aqui. Quando voltei, de 14 para 15 (de março), estava com essa consciência de que poderia contaminar alguém no Brasil, caso eu tivesse sido contaminado na França. Quando pousou o avião, passei álcool na mão, coloquei máscara e saí.”

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Após deixar o aeroporto no Rio de Janeiro, onde apenas havia retirado a proteção na hora da leitura eletrônica do passaporte, o professor seguiu para a rodoviária.

“Quando cheguei parecia que eu era um E.T, porque só eu estava de máscara. Falei com o cara no guichê: ‘Estou de máscara não é preocupado com a sua doença não, é que eu possa estar trazendo, porque estou vindo da França.”

Ele me deu a passagem, esperei o ônibus, vim para Juiz de Fora e peguei um táxi, de janela aberta e máscara. Aqui estava mais quentinho do que na França, lá estava ainda no fim de inverno, início de primavera.”

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Daniel mora sozinho e, chegando em casa, permaneceu em isolamento voluntário. “Fiquei quieto de quarentena, não deixei meus outros filhos irem me ver. No dia seguinte ainda estava muito cansado da viagem. Já no outro dia eu estava espirrando, tossindo, com dor de cabeça e febre. Comecei a acompanhar e estava com 38, 38,5. Fui nessa até no sábado (21). Mas na quinta ou na sexta (anteriores), minha cabeça já começou a ficar embaralhada. Todos esses dias com febre. A dor de cabeça parou na terça-feira, dor de fundo de olho e tal. Espirros pararam também. Eu não estava com dificuldade respiratória não. Mas era uma febre que não parava, e meu apetite acabou. Não tive vontade de comer.” Logo, o professor pensou: “Onde eu vou parar? Com essa febre intermitente, parando de comer, a imunidade vai embora. E eu sozinho.” A partir daí, Daniel decidiu seguir os conselhos de uma amiga médica, de procurar atendimento hospitalar, porque se a situação se agravasse, ele poderia não ter como pedir socorro a tempo.

‘Foi uma pancada’

No dia 21, Daniel foi internado no Hospital Monte Sinai. “Cheguei com a mala já dentro do carro, e o médico me disse que eu ficaria mesmo internado. Já entrei dentro do controle de infecção deles, com todos protegidos no quarto. Dois ou três dias depois me levaram para a UTI, fui o primeiro leito ocupado lá no Monte Sinai. No segundo dia de UTI já me entubaram, me sedaram, e eu não vi mais nada. Aí meus filhos começaram a fazer síntese do que o médico informava para eles, um infectologista muito atencioso, que todo dia dava notícias. Nessa hora que foi a luta: vai, não vai, consciência vai embora, passa dois dias, volta. Tentaram um medicamento que não deu certo, tentaram outro. E foi uma luta. Mas, graças a Deus, passaram-se alguns dias… acho que fiquei duas semanas na UTI.”

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As postagens assinadas pelos quatro filhos de Daniel em redes sociais eram sempre positivas, apesar da situação difícil pela qual estavam passando. Em uma delas, finalizaram: “Pedimos a todos que se cuidem e cuidem das pessoas ao seu redor. Boas energias e orações são bem vindas.” O pai só teve ideia do que se passava “do lado de fora” quando recebeu alta da UTI.

“Foi uma pancada. Depois que fiquei sabendo como eles tiveram força para passar por isso. Os quatro todos os dias faziam a síntese. E eles mesmos na expectativa.”

Após recobrar a consciência e apresentar evolução satisfatória de acordo com os requisitos médicos, o professor da UFJF continuou seus dias de internação em um quarto. Tarefas de higiene comuns no dia a dia passaram a ter outro valor para ele: “Tomei banho sozinho, escovei os dentes. Isso faz uma diferença danada, tem gente que não tem noção do que é isso. Fui liberado e vim para a casa da minha filha, que está morando em Chácara.” Enquanto Maria, 26, e João Francisco, 34, cuidam do pai com todo amor e carinho, ele também recebe a atenção de uma filha adolescente, 16, e daquela de 30 anos que mora na França. “Ela teve os sintomas do caramelo na boca e da dor de cabeça, uns três, quatro dias. Mas administrou com a calma dela e, graças a Deus, não teve nem febre.”

Depois de sair do hospital, Daniel foi para Chácara, onde se recupera ao lado dos filhos João Francisco e Maria e da nora Bianca Nespoli (Foto: Arquivo Pessoal)

Enquanto o professor do Departamento de Botânica do ICB estava internado, a UFJF ressaltou que o docente havia viajado por iniciativa pessoal e não acadêmica. “Ao retornar a Juiz de Fora, ele se manteve em regime de quarentena, portanto, não voltou a frequentar a UFJF. Lembrando que as atividades da instituição também já haviam sido suspensas”, disse a UFJF, em nota.

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