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Unidades de saúde de JF enfrentam dificuldades para adquirir medicamentos

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A demanda por anestésicos e sedativos durante a pandemia do coronavírus tem causado transtornos para pacientes e gestores de hospitais. Como esses medicamentos são muito utilizados nos casos de entubação das vítimas graves da Covid-19, administradores têm buscado a substituição segura de insumos em falta no mercado, mas, mesmo assim, alguns procedimentos necessários em razão de outras enfermidades estariam sendo afetados. Município e Estado garantem que não há desabastecimento em Juiz de Fora, mas admitem que a escassez desses insumos no país tem elevado os preços e dificultado a aquisição de determinados fármacos, que têm sido trocados por outros.

Em razão da situação, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) anunciou, nesta terça-feira (7), a criação de uma rede solidária entre entidades que prestam serviço de saúde no estado. O objetivo é estabelecer “alternativas para enfrentamento do desabastecimento do mercado de medicamentos anestésicos, promovendo o remanejamento de estoques entre setores públicos e privados, a fim de evitar desassistência neste momento de pandemia”.

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Diante do aumento do uso de sedativos e anestésicos em todo o mundo, a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) informou que já orientou suas unidades a fazerem uso racional desses fármacos e estuda, junto ao corpo técnico de médicos e farmacêuticos, as possíveis substituições disponíveis no mercado. As orientações seguem a Sociedade Brasileira de Anestesiologia e a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES/MG).

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“Até o momento, as unidades de saúde gerenciadas pela Secretaria de Saúde de Juiz de Fora possuem os medicamentos preconizados em seu protocolo de anestesia, analgesia, sedação e relaxamento muscular. Entretanto, a pasta está ciente do desabastecimento desses fármacos, que vem ocorrendo nacionalmente, sob alegação da indústria farmacêutica pela dificuldade na obtenção de matéria-prima, em grande parte importada da China e Índia”, destacou a PJF nesta terça, por meio de nota.

Em razão da pandemia, medicamentos usados na entubação das vítimas graves de Covid-19 estão em falta em todo o mundo, o que pode prejudicar atendimentos, mesmo se houver leitos (Foto: Gil Leonardi/Imprensa MG)

Busca por alternativas

Medidas parecidas vêm sendo adotadas por hospitais particulares, que também sentem os efeitos da alta procura no mercado por anestésicos e sedativos por causa da epidemia. Embora a maioria das unidades esteja com estoque garantido, por enquanto, alguns gestores já tiveram que modificar planejamentos. “Para determinadas drogas, há dificuldade de aquisição, superadas com nosso estoque, e também enfrentamos aumento exponencial de custos. Além disso, foram estabelecidas algumas substituições com total segurança”, informou o Monte Sinai.

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A Santa Casa disse que, assim como outros hospitais, tem tido dificuldade na aquisição dos medicamentos. A unidade já havia reduzido as cirurgias eletivas por conta da Covid-19, conforme a assessoria. Já o Hospital Unimed disse que “atualizou o seu estoque de medicamentos antes da pandemia e nenhum dos seus serviços foi afetado”. Mas ponderou, por meio da assessoria, que, como todos os demais, já observa dificuldades em decorrência da alta demanda.

O Albert Sabin, por sua vez, assegurou que “esteve, desde o início da pandemia preparado, não só do ponto vista assistencial, mas também do ponto de vista logístico (cadeia de suprimentos) para conduzir com critério o tratamento do novo coronavírus”. Ainda assim, “reconhece que tais medicamentos estão em falta no mercado, mas possui estoque para atendimentos dos seus protocolos internos”: “Caso a escassez perdure muito tempo, tais protocolos serão revisados e modificados sem prejuízo ao atendimento prestado a seus pacientes”, garantiu a responsável pela gestão de suprimentos.

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A assessoria do Hospital São Vicente de Paulo, que também administra as unidades de Pronto Atendimento (UPAs) Norte e Oeste (São Pedro), confirmou que ambas estão com dificuldade em adquirir anestésicos e sedativos. “Como alternativa optou-se por usar alguns medicamentos antes não padronizados e com um custo muito superior ao habitual, assim garantindo o bom atendimento e recuperação de nossos pacientes.” Diante do atual cenário, no São Vicente de Paulo “alguns dos procedimentos cirúrgicos eletivos foram cancelados, devido à dificuldade de compra de novos medicamentos, estando o estoque atual reservado para caso de emergência”.

O Monte Sinai acrescentou que “já passou por todas as etapas de oscilação de disponibilidade ou valores superfaturados, mas em nenhuma situação sofreu com a falta de medicações ou suspensão de procedimentos por este problema atual no mercado”. A expectativa do hospital é uma normalização da situação em breve. “Atualmente, o setor responsável pelas compras vem conseguindo adquirir a linha mais recomendada em cada opção, sempre que disponível. Porém, os custos com a elevação de valores é uma realidade à qual o hospital já foi submetido e, por isso, já vem tentando negociar a questão (repasse do ágio nos valores contratados) também com os planos de saúde. Mas tanto emergências gerais, quanto procedimentos eletivos ou atendimento a pacientes com Covid-19 seguem sem alteração até o momento.”

O Albert Sabin acredita que o dimensionamento dos itens relacionados à Covid-19 foi feito bem no início da crise instalada. “Estamos abastecidos para nossos protocolos internos. Em função da escassez de mercado, já criamos alguns alertas para possível substituição.”

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A assessoria do Hospital e Maternidade Therezinha de Jesus (HMTJ) disse que a unidade tem encontrado dificuldade para adquirir medicações, especialmente anestésicos, mas ponderou que as emergências não foram afetadas e que as urgências não estão sendo canceladas em função disso. As cirurgias eletivas permanecem suspensas, e a previsão da retomada foi adiada para continuar atendendo com toda segurança.

Estado e HU fizeram abastecimento robusto

A SES/MG, por sua vez, garantiu que não há, até o momento, conhecimento de desabastecimento de medicamentos nas instituições hospitalares do estado. “No âmbito do sistema estadual de saúde, nas unidades geridas pela Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), as aquisições e entregas de insumos e medicamentos são feitas por meio de fornecedores licitados e cadastrados no sistema estadual, por meio da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag). Esses itens são distribuídos nas unidades e existe um gerenciamento de estoque, que, por se tratar de uma rede, tende a ser mais robusto.”

A pasta assegurou estar buscando se precaver diante da pandemia e, “dado o caráter excepcional do contexto”, efetuou planejamento extraordinário junto à Seplag para aquisição de itens de uso hospitalar, visando a eventual aquisição de medicamentos de uso no contexto da terapia intensiva. “Infelizmente, o processo teve uma centena de itens desertos e fracassados, seja por sobrepreços de até 300%, seja por desabastecimento geral do mercado, de acordo com o relato dos fornecedores”.

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Também por meio de nota nesta terça, a SES/MG reafirmou que, apesar da dificuldade encontrada em algumas entregas pontuais, não houve, até o momento, desabastecimento desses medicamentos nessas unidades. “Em alguns casos, pode haver necessidade de substituição terapêutica por outros similares, prevista nos protocolos clínicos, caso não tenha o item momentaneamente no estoque regular.” A pasta ressaltou que, em relação às instituições prestadoras de serviços do SUS, cabe a elas, em regra geral, fazer aquisições de insumos para uso em suas unidades, por meio da remuneração aos serviços prestados.

“A SES/MG tem buscado, juntamente com outras secretarias estaduais, soluções junto ao Ministério da Saúde, que deu indicativo de que fará negociações e aquisição no mercado doméstico. Outra iniciativa da SES também tem sido manter diálogo com a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), buscando cooperação internacional para a compra de medicamentos.”

‘Alerta’

O Hospital Universitário (HU) garantiu o estoque de anestésicos e sedativos, mas mantém o alerta diante da crescente demanda por período ainda não determinado, segundo a chefe da Unidade de Abastecimento Farmacêutico do HU-UFJF/Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), Eunice Baeta. “O Hospital Universitário, no início de março, em preparação para enfrentamento da pandemia de Covid-19 e estimando o provável aumento do consumo destes medicamentos, fez um abastecimento robusto destes itens para evitar o desabastecimento. Desde então, tem sido realizado o monitoramento semanal do consumo e da cobertura de estoque e reportado ao Centro de Operações de Emergência (COE). A avaliação tem mostrado um aumento do consumo a cada semana em virtude do aumento da taxa de ocupação dos leitos de UTI Covid.”

Apesar de não haver desabastecimento até o momento, “ações estratégicas vêm sendo discutidas e implantadas para aumentar a cobertura de estoque sem prejudicar a assistência ao paciente”, observou Eunice. “Essas ações são de extrema importância, uma vez que não há previsão do tempo em que a pandemia ainda se estenderá, e pela resposta negativa do mercado nas diversas tentativas de aquisição destes medicamentos, seja pela falta ou pelos valores elevados praticados.”

Proposta do Ministério Público pode contribuir para garantir atendimento, já que instituições ligadas ao SUS deverão informar, semanalmente, quantitativo de estoques dos insumos em falta (Foto: Fernando Priamo)

Preocupação já afeta pacientes

O medo da possibilidade de falta de medicamentos também tem afetado pacientes. É o caso de um empresário de 28 anos, que sofreu um acidente motociclístico e está internado pelo SUS no Hospital e Maternidade Therezinha de Jesus (HMTJ). Ele teve uma das várias cirurgias que precisa fazer no pé esquerdo adiada duas vezes. Hospitalizado desde 13 de junho, a preocupação do paciente é de que seu caso seja afetado pela carência de remédios.

Ele preferiu não se identificar na reportagem, mas contou detalhes do longo período em que está sob cuidados médicos à Tribuna. O acidente resultou em fratura exposta, e ele conseguiu fazer as duas intervenções mais urgentes nas primeiras 72 horas após dar entrada na unidade.

Já a terceira, que consistia na retirada de pele necrosada, só foi realizada no dia 1º de julho. “Esperei 15 dias para essa cirurgia. A informação que tive foi que os casos de Covid na unidade aumentaram e, com isso, estão tratando os pacientes com esses sedativos. E que não tem para comprar. Está em falta em todo o mercado. Nem em hospitais particulares encontram esses medicamentos.”

O temor dele é de que a demora seja similar para a realização dos outros dois procedimentos cirúrgicos que necessita. “Ainda tenho que fazer dois enxertos, um de osso e um de pele, porque meu caso é delicado. Vou permanecer aqui até que sejam feitos.” Por enquanto, o paciente não tem previsão de quando será liberado. “Agora tem que controlar as medicações para eu estar pronto para a próxima cirurgia”, disse ele, com a expectativa de que aconteça nesta semana. “Se já tivesse feito a (terceira) cirurgia antes, talvez já teria recebido alta. Mas continuo com medo de não ter medicamentos para a próxima.”

Procurada pela Tribuna, a assessoria do HMTJ disse que “esses reagendamentos podem ter vários motivos, inclusive indisponibilidade do centro cirúrgico por entradas de emergências e não estão relacionados à demanda de medicação. De maneira geral, há falta ou ágio de anestésicos específicos, mas o HMTJ continua atendendo a todas as urgências e aos pacientes internados com substituição segura das drogas.” Embora seja privado, o HMTJ tem caráter filantrópico, com atendimento 100% SUS e contratualizações via Município.

MP aponta insuficiência de 22 medicamentos

A proposta do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) de criar uma rede solidária para promover remanejamento de estoques de medicamentos entre entidades foi publicada em edição extra do Diário Oficial de Minas Gerais no último sábado (4), “diante da insuficiência e da indisponibilidade temporária de 22 medicamentos, utilizados em procedimentos hospitalares”. A deliberação autoriza órgãos da administração pública direta e indireta, as instituições contratadas e as demais entidades privadas que prestam serviço de saúde no estado a adotar medidas de articulação e integração, tendo em vista a escassez dos insumos.

Para o coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa da Saúde (CAO-Saúde), Luciano Moreira, a falta desses remédios “pode inviabilizar o atendimento médico, inclusive a realização de cirurgias que não estão relacionadas à Covid-19, como, por exemplo, cirurgias cardíacas e oncológicas”.

Segundo a deliberação, “as instituições hospitalares públicas, filantrópicas ou contratualizadas com o Sistema Único de Saúde (SUS) devem informar semanalmente à Secretaria de Estado de Saúde (SES), por meio do preenchimento de formulário digital disponibilizado, o quantitativo de estoques dos medicamentos indicados”. A consolidação e análise dos dados serão realizadas pela SES, que encaminhará relatório periódico aos comitês macrorregionais Covid-19.

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