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Polícia Civil apura morte de idoso e faz exumação do corpo

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Policiais encontraram R$ 8.700 na casa da mulher durante investigação. Delegado suspeita de estelionato (Foto: Felipe Couri)
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A 1ª Delegacia de Polícia Civil apura a morte do advogado aposentado Simeão Cruz, 80 anos, enterrado no dia 13 de maio no Parque da Saudade, dois dias após assinar um testamento deixando como herdeiros o seu cuidador, 59, e uma jornalista, 52, alvos da investigação. Apesar de não possuir descendentes diretos vivos e ter os dois irmãos falecidos, a família formada por dez sobrinhos estranhou o fato, já que o idoso teria bom relacionamento com todos e teria sido sepultado às pressas, sem que os parentes fossem comunicados. Na semana passada, o delegado à frente do caso, Eurico Cunha Neto, pediu a exumação do corpo a fim de verificar a causa da morte. Os restos mortais foram enviados para necropsia em Belo Horizonte. Também já foram realizadas buscas e apreensões nas casas da jornalista e do cuidador, sendo apreendidos celulares, notebook, documentos, medicamentos e R$ 8.700, que seriam provenientes de um saque de R$ 40 mil feito na conta de Simeão. Ainda é investigado o destino de R$ 39 mil referentes à venda do veículo do aposentado.

“A gente espera esclarecer isso tudo, porque nem nos deixaram despedir do meu tio”, diz o sobrinho Marcelo Cruz, 49 anos, professor, guia de turismo e agente de viagem. Segundo ele, a família só soube da morte porque vizinhos teriam percebido uma movimentação estranha em frente ao prédio do idoso, no Bairro Alto dos Passos. Ao buscar informações, os parentes descobriram que o cuidador, a jornalista e uma terceira pessoa teriam providenciado o enterro, sem velório. “Meu tio faleceu às 7h em casa e foi enterrado às 13h. Fiquei sabendo às 17h. Quando liguei para o cuidador, ele disse apenas que havia cumprido a missão e desligou. Vi que tinha alguma coisa errada. Fui no cemitério e no cartório.” Para o sepultamento no prazo inferior a 24 horas, foi exigido o atestado médico, no qual constam como causas da morte insuficiência cardíaca e hipertensão arterial. Pouco tempo depois, a família soube da existência do testamento.

Conforme o titular da 1ª Delegacia, muitas suspeitas foram levantadas quando a polícia começou as investigações, em 8 de junho, juntando documentações e ouvindo as pessoas relacionadas no testamento, feito dentro de casa. O documento é assinado por três testemunhas, sendo elas uma amiga, 57, e um ex-namorado da jornalista, 58, além de um ex-motorista de Simeão, 28. “Descobrimos que as testemunhas não estavam presentes. O testamento foi feito por uma das beneficiárias, a jornalista, e levado até o idoso (em sua residência) dois dias antes da morte dele. Ele assinou de forma debilitada. Tudo leva a crer que as coisas não ocorreram de forma correta e que aconteceram diversas práticas criminosas”, afirma Eurico.

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No decorrer das apurações, a polícia descobriu que “outros bens do idoso foram desviados, tirados e vendidos”. “Esse dinheiro relativo a essas vendas desapareceu. Na casa da jornalista encontramos R$ 8.700 e, pela etiqueta do banco, conseguimos verificar imediatamente que esse valor foi retirado de uma das contas do Simeão. A investigada fala que ele teria dado R$ 40 mil a ela, e que o valor aprendido seria o restante”, conta Eurico. Após as primeiras evidências, o delegado decidiu pelo desenterramento do cadáver. “Diante de toda essa peculiaridade do caso, achamos por bem pedir a exumação, para verificar se essa morte realmente foi natural ou se foi provocada após feitura do testamento.” Ainda não há prazo para o resultado da necropsia.

Delegado diz que investigados entraram em contradição

De acordo com o delegado Eurico Cunha Neto, os depoimentos dos dois beneficiários no testamento de Simeão Cruz foram contraditórios. “A contradição acontece de maneira generalizada, principalmente em relação ao testamento, feito dois dias antes da morte do idoso. Ele deixa todos os bens para essa jornalista, que seria uma amiga, e para o cuidador. É enterrado, e a família não é avisada. Parentes que são do Estado do Rio de Janeiro só ficam sabendo da morte dias depois.” Segundo o policial, o cuidador trabalhava para o aposentado há oito anos e diz que, aos poucos, o idoso “foi perdendo contato com todos”, desejando deixar parte dos bens para ele.

Já a jornalista fala, em depoimento, que conhecia o idoso por possuir parentes vizinhos dele e afirma ter passado a ter mais contato com o aposentado há cerca de três anos. Ela alega não ter conhecido os familiares dele e acrescenta que o homem decidiu deixar seus bens para ela e o outro beneficiário porque os familiares “não tinham contato nenhum com ele”. A investigada conta que, cerca de 20 dias antes de sua morte, Simeão teria manifestado vontade de deixar um testamento e teria pedido a ela para digitar.

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O advogado que representa a família de Simeão, Ricardo Fortuna, ressalta que “as testemunhas do testamento foram ouvidas em sede policial e afirmaram não ter presenciado a leitura e a assinatura, que são exigências da lei para validade do testamento particular”. “Ingressamos com pedido de arquivamento do testamento, de modo que o mesmo não fosse confirmado pelo Judiciário. O pedido está sob apreciação do Ministério Público e, posteriormente, passará à Juíza da Vara de Sucessões da Comarca.”

Fortuna acrescenta que está acompanhando as investigações e fazendo o inventário dos bens, que incluiria imóveis e aplicações financeiras. “O primeiro objetivo da família é apurar as circunstâncias do óbito, já que a questão patrimonial é uma consequência lógica da sucessão hereditária.”
O médico que assinou o atestado de óbito também já foi ouvido e disse à polícia acreditar que tenha chegado à residência do paciente de quatro a cinco horas depois da morte. Ele afirma ter realizado pelo menos duas consultas anteriores a ele que, segundo o profissional, estaria lúcido, mas com a saúde debilitada. A família entende que o Samu deveria ter sido acionado, e a necropsia realizada na ocasião da morte.

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O advogado que defende o cuidador, Giovanni Malta do Valle Silva, diz que seu cliente é “vítima e foi manipulado pela jornalista”. Já o advogado de defesa da jornalista, Ulisses Sanches da Gama, afirma que sua cliente “foi tão vítima quanto o idoso, porque foi levada a erro pelo cuidador, que seria o único beneficiário e induziu que ela aceitasse ser beneficiária também”. Ainda conforme o advogado, sua cliente relatou ter convivido por muitos anos com Simeão e mantinha um grau de amizade e carinho muito grande por ele. “Ele não possuía filhos e, nas palavras dela, a considerava como uma filha.”

O delegado aguarda autorização judicial para periciar os celulares e o notebook apreendidos e também a quebra de sigilo bancário do idoso, da jornalista e do cuidador. “Vamos apurar as responsabilidades. A princípio, vemos alguns crimes de estelionato cometidos. Em relação a homicídio, latrocínio, ou o que quer que seja, precisamos realmente da resposta da Medicina Legal, da conclusão do laudo de necropsia, para tomarmos a posição correta nas investigações”, conclui Eurico.

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