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Poucos fiscais, muitos abusos

cacamba toma calcada na rua santana em santa terezinha desrespeitando as regras de acessibilidade

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Caçamba toma calçada na Rua Santana, em Santa Terezinha, desrespeitando as regras de acessibilidade
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Caçamba toma calçada na Rua Santana, em Santa Terezinha, desrespeitando as regras de acessibilidade

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Cones obstruem passeio ao lado do Independência Shopping, e não há equipamentos que garantam a segurança para pedestres circularem na pista

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Área é limpa com frequência, mas bota-fora persiste na Rua A, via de acesso entre Aeroporto da Serrinha e Estádio Municipal

Diz o ditado que lei existe para ser cumprida. Mas em Juiz de Fora nem sempre o que está determinado no Código de Posturas, por meio da lei municipal número 11.197, de 2006, é respeitado. Além da falta de conscientização das pessoas, o maior agravante para os abusos é o número reduzido de fiscais. Dos 160 postos de trabalho que a lei determina, menos da metade está em atuação. Hoje são 77 fiscais nas ruas, sendo 73 na Secretaria de Atividades Urbanas (SAU) e quatro na Secretaria de Meio Ambiente (SMA), conforme levantamento feito pela Tribuna no Portal da Transparência. Outros 45 servidores já estão aposentados e 27 são pensionistas, sem contar aqueles afastados de suas funções em razão das licenças médicas e das férias. A situação se agravou nas duas últimas décadas. Nos anos 1990, o município tinha cerca de 350 mil habitantes e mais de cem fiscais, enquanto hoje, com mais de 500 mil, vive esta situação de colapso no setor.

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Como o Código de Posturas regulamenta a exploração do espaço urbano e determina regras para a manutenção de edificações e a construção civil, as consequências da falta de fiscalização são facilmente observadas: imóveis são construídos com calçadas sem qualquer equipamento de acessibilidade, mesas e cadeiras de bares, além de caçambas, ocupando passeios, e lotes vagos expostos transformados em verdadeiros bota-foras. Somam-se a isso problemas já considerados crônicos, como a venda de automóveis em vias públicas, inclusive na Área Azul, e os abusos provocados pela poluição sonora, tanto de estabelecimentos comerciais como de templos religiosos, como o jornal já denunciou em diversas ocasiões.

Nas últimas semanas, a Tribuna percorreu todas as regiões da cidade, identificou várias situações de descumprimento ao código municipal e percebeu que os flagrantes mais recorrentes são aqueles relacionados à falta de acessibilidade. Obras e pequenas reformas de imóveis, principalmente nos bairros, são suficientes para transformar os passeios em verdadeiros empecilhos, sobretudo para as pessoas com mobilidade reduzida. Caçambas e até vasos de flores são colocadas em cima de calçadas estreitas, obrigando pedestres a transitarem pelas ruas. Em outros casos, andaimes são inseridos sobre a área destinada aos pedestres sem que sejam destinadas áreas para circulação com segurança no asfalto.

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Bota-foras

Além disso, os bota-foras irregulares se espalham por toda a cidade, e resíduos da construção civil estão encontrados, principalmente, em ruas isoladas de bairros afastados. No Centro, vendedores de óculos de sol e grau de procedência duvidosa e ambulantes que comercializam produtos diversos, como sombrinhas, se espalham e dividem espaço com comerciantes de automóveis que fazem do espaço público seu próprio escritório.

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SAU reconhece problema; concurso é alternativa

A Secretaria de Atividades Urbanas (SAU) reconhece os problemas e afirma que melhorias no setor de Fiscalização podem ser obtidas a partir da realização de um novo concurso público para a área, já que a última nomeação de novos servidores ocorreu em 2008, quando chegou-se ao total de 106 fiscais. A necessidade da realização deste concurso é urgente, sobretudo porque a secretaria prevê que, nos próximos dois anos, mais dez trabalhadores irão se aposentar. “Nosso efetivo de fato está aquém da grande demanda que existe na pasta, pois, além do Código de Posturas, surgem as leis extravagantes, que são legislações pontuais, aprovadas pela Câmara Municipal que, por via de regra, deságuam aqui”, disse o secretário Sérgio Rocha, citando, por exemplo, o caso da recente lei que proíbe pessoas de jogar pontas de cigarro ao chão e da nova regra, ainda em tramitação, que pretende punir quem lavar calçada com água potável.

“Vim para a pasta, a convite do prefeito, no intuito exatamente de criar uma agenda positiva nesta secretaria. Ele tem a dimensão de que a SAU precisa melhorar. Quando saí desta secretaria, em 1997, tinha em torno de 120 fiscais, agora são cerca de 50 ativos, já descontando os que estão em licenças médicas ou férias. Que fossem 70. Ainda assim estaria aquém da necessidade de uma cidade que evoluiu e cresceu nas últimas décadas”, pondera o secretário. A chefe do Departamento de Fiscalização, Graciela Vergara Marques, recorda que, quando ainda havia mais de cem fiscais, a população estava em torno dos 350 mil habitantes. “Agora é mais de meio milhão.”

Em nota, a assessoria de comunicação da Secretaria de Administração e Recursos Humanos (SARH) informou que a classe fiscal de posturas municipais é uma das contempladas no concurso público que a Prefeitura planeja realizar. No entanto, prazos não foram divulgados. “No momento, a PJF está realizando os trâmites administrativos necessários para a contratação da empresa que realizará o concurso. Ainda não há número de vagas definido.”

Burocracia emperra respostas mais rápidas

Para otimizar a atuação dos fiscais, a Secretaria de Atividades Urbanas (SAU) trabalha com planejamentos anuais. Desta forma, o Departamento de Fiscalização tenta atender demandas diversas pelo menos uma vez a cada 12 meses, como é o caso das piscinas e dos clubes, no verão, das peixarias, antes da Semana Santa, e abordagens a casas noturnas, salões de festas, bares, hotéis e motéis. “Importante dizer que somos polícia administrativa, e o instrumento maior do fiscal é a caneta. Então, muitas vezes, a população quer uma solução imediata para o problema, mas nós precisamos dar prazos legais e direitos à defesa”, explicou a chefe do setor, Graciela Vergara Marques, que é funcionária de carreira e atua na pasta desde o início da década de 1990. “As pessoas confundem um pouco nosso papel. A culpa dos problemas não é da fiscalização, e sim de quem comete os erros. Sei que deveríamos dar respostas mais rápidas, mas a burocracia, muitas vezes, nos impede.”

Sociedade vigiada

Graciela acredita que um efetivo maior traria diminuição nos abusos, já que a sociedade poderia se sentir mais vigiada, principalmente porque o serviço de inteligência poderia ser aperfeiçoado, antecipando-se aos problemas. “Mesmo assim, dentro dos nossos limites, temos pelo menos duas rondas nos fins de semana, ou para atender a alguma demanda específica ou para flagrar situações irregulares. É trabalhoso, mas estamos tentando atender a todos na medida do possível, e as denúncias nos ajudam muito.”

De acordo com o secretário Sérgio Rocha, embora a lei que determinou a existência de 160 fiscais seja de 1998, esta quantidade atenderia a necessidade atual. “Seria ótimo, esplendoroso, três vezes o efetivo que temos hoje. Mas chegar a esta quantidade depende de recursos orçamentários e financeiros. O concurso será aberto, e, se eventualmente tivermos a condição de suprir todas as vagas, isso será feito.”

Fiscalizar e educar

O sociólogo e professor de ciências sociais da UFJF, Paulo Fraga, avalia que fiscalizações constantes são fundamentais para o cumprimento da ordem. No entanto, ele ressalta a necessidade de este trabalho estar atrelado ao de conscientização. “A repressão pode até ser interessante, mas a longo prazo o cidadão acaba encontrando maneiras de burlar. Não estou dizendo que fiscalizar não é importante, pois é fundamental. Mas defendo que isso ocorra de forma que também eduque, porque muitos sabem que estão fazendo errado e continuam. Mas há também pessoas que adotam condutas erradas pelo não conhecimento da lei.”

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