“A doutora não gostou dos níveis do PSA e me mandou procurar o urologista”, foi assim que começou a saga do aposentado João Suriano, de 76 anos, contra o câncer de próstata. Ele já tinha o costume de fazer o exame de sangue para medir os níveis de Antígeno Prostático Específico (PSA) e sempre saía do consultório com uma notícia boa para levar para casa. Todavia, em 2017, depois daquela consulta com encaminhamento para um médico especialista, a situação era diferente. “Lembro-me de quando a médica viu o resultado do exame, que eu mesmo tinha pedido para fazer anteriormente. Ela me olhou e disse: Seu João, o senhor está com um problema”, relatou o paciente, que é morador do município de Bicas e faz o tratamento em Juiz de Fora por meio do SUS.
Encaminhado para o urologista, foi solicitado ao aposentado a biópsia, para confirmação do diagnóstico, depois da realização do toque retal. “É só para tirar dúvidas, fique tranquilo, vai lá, faz o exame e traz ele pra gente ver, vai sossegado”, disse o médico. Infelizmente, o que já era quase uma certeza se confirmou. “Quando soube, não tive reação e não entrou nada ruim na minha cabeça. Não tive medo”, conta João, mostrando as cicatrizes de uma cirurgia para retirada da vesícula e a mão direita, que teve parte perdida, depois que foi atingida por uma máquina de moer fubá. “Sou forte e vou vencer essa nova parada”, disse com convicção e fé.
O paciente terá que realizar 70 sessões de radioterapia, cerca de 50 já foram feitas. Se acha desconfortável passar pelo aparelho que emite a radiação, ele diz que, para quem já fez de tudo na vida, tendo que trabalhar como retireiro, plantador e na construção civil, a máquina não é nada. “Não se deve ter medo, nem de fazer o exame. Os homens devem deixar esse receio de lado e se pegarem com Deus, porque eu já passei por cima de muitos problemas e vou passar por cima desse também”.
Levantamento feito pela Tribuna, por meio do sistema Datasus, revelou que 111 homens juiz-foranos foram internados depois do diagnóstico do câncer de próstata neste ano, em Juiz de Fora. Desde 2007, quando iniciou a contabilização deste tipo de internação pelo Datasus, foram 1.575 homens que iniciaram o tratamento. Dados da Secretaria de Saúde mostram que, de 2014 a 2018, 272 homens morreram em decorrência deste tipo de câncer, a maior parte dos óbitos foram registrados em pacientes com mais de 75 anos, ou seja, 164 episódios. Dessa forma, a Tribuna dá prosseguimento à série “Existe Esperança!” e trata sobre o diagnóstico da doença, na segunda reportagem especial sobre o tema.
O homem que se gosta se cuida
O câncer de próstata pode ser diagnosticado com a combinação de dois exames. O primeiro é a dosagem do PSA, que é o exame de sangue que avalia a quantidade de antígeno prostático específico. Já o toque retal, que é atravessado pelo preconceito, tem o objetivo de avaliar a próstata, que é uma glândula que fica em frente ao reto. Ele permite ao médico palpar a próstata e perceber a existência de caroços ou tecidos endurecidos. “Há muita mitificação a respeito do toque em razão do machismo na sociedade. A imensa maioria dos pacientes, quando faz pela primeira vez, fica muito receoso. Depois que acaba o exame, ele pergunta: é só isso? Porque é um exame rápido e indolor”, garante o urologista Fernando Henrique Ribeiro, coordenador do Serviço de Urologia da Ascomcer e diretor técnico do hospital, acrescentando que, se alterações forem notadas durante o toque, há a indicação do exame de biópsia.
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O toque é feito com o dedo protegido por luva lubrificada. Na maioria dos homens, o nível de PSA costuma permanecer abaixo de 4 ng/ml. Alguns pacientes com nível normal de PSA podem ter um tumor maligno, que pode até ser mais agressivo, por isso esse exame, feito de forma isolada, não pode ser a única forma de diagnóstico. Nenhum dos dois exames têm 100% de precisão. Por isso, podem ser necessários exames complementares. “O exame não diminui nem um pouco a masculinidade. O homem que se gosta se cuida. O exame tem que ser feito todo ano, e não há possibilidade de fazer uma vez a cada cinco anos, como alguns pensam, pois essa doença não tem hora nem dia para acontecer. Esse rastreio é importante, porque um exame é complemento do outro”, ressalta o urologista.
A biópsia é o único procedimento capaz de confirmar o câncer. A retirada de amostras de tecido da glândula para análise é feita com auxílio da ultrassonografia. Pode haver desconforto e presença de sangue na urina ou no sêmen nos dias seguintes ao procedimento, e há risco de infecção, o que é resolvido com o uso de antibióticos. Outros exames de imagem também podem ser solicitados, como tomografia computadorizada, ressonância magnética e cintilografia óssea, com a finalidade de verificar se os ossos foram atingidos.
Diagnóstico rápido significa menos impactos
O especialista ressalta que, ao ser diagnosticada no começo, a patologia, inclusive, não interfere na ereção, que é um dos maiores receios do homem no que se refere à intervenção cirúrgica para retirada da próstata. “Nas fases iniciais, quando há a cirurgia, é completamente possível preservar os nervos responsáveis pela ereção, permanecendo o paciente com a sua função sexual normal”, afirma, acrescentando que a retenção da urina também fica preservada, já que os músculos da região não são afetados.
Contudo, alerta o médico, quanto mais avançada estiver a doença e essas estruturas comprometidas, elas deverão ser retiradas ou atingidas pela radioterapia. “Quanto mais avançado, mais efeitos colaterais vão atingir o homem. Do contrário, ele passa pelo tratamento e tem uma vida normal”.