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Munição histórica: os 85 anos da Imbel

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(Foto: Olavo Prazeres)

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Uma das primeiras oficinas de estojos. (Foto: Arquivo Imbel/FJF)
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Criada na primeira metade dos anos 1930, quando o governo Getúlio Vargas investia na industrialização do Brasil, a antiga Fábrica de Estojos e Espoletas de Artilharia (FEEA), hoje Indústria de Material Bélico do Brasil (Imbel), completa 85 em Juiz de Fora. Desde então, a unidade é peça chave da base industrial da estratégia de defesa do país, produzindo munições de grosso calibre, em sua maioria, para o Exército Brasileiro. Para Juiz de Fora, a fábrica também representou um marco no processo de crescimento, principalmente na Zona Norte, onde está instalada. Com a sua chegada, a região foi povoada e se desenvolveu economicamente. Benfica hoje é um dos principais bairros da cidade. Até o abastecimento de água de Juiz de Fora foi melhorado. A empresa mira no futuro com o desenvolvimento de novas tecnologias, cuja meta é exportar os produtos fabricados em Juiz de Fora até 2026.

A fábrica tem sua origem em 1808, quando Dom João VI criou a Fábrica de Pólvora da Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro. Atualmente, a empresa tem suas unidades de produção em Piquete (SP), Rio de Janeiro (RJ), Magé (RJ), Itajubá (MG) e Juiz de Fora. Na cidade, a FEEA foi criada em 1933. Essa história foi pesquisada durante dois anos pelo historiador e restaurador Rômulo Marcos dos Santos, que escreveu o livro “F.E.E.A./ F.J.F. A Fábrica de Estojos e Espoletas de Artilharia de Juiz de Fora: Subsídios para sua história, ainda não publicado. Seus relatos dão conta de detalhes sobre a fábrica, que começam antes de sua instalação e vão até curiosidades sobre a fabricação das munições de grosso calibre. Além de fotos históricas, o estudioso recuperou documentos e objetos históricos. “Em outubro de 2017, procurei a Imbel e resolvi fazer a pesquisa. Acabei escrevendo o livro, que tem 280 páginas e aguarda apoio para ser publicado”, diz Rômulo.

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Ex-funcionário da Imbel, Mário Meireles conta como a vinda da empresa transformou a região. (Foto: Olavo Prazeres)

Para quem vivia na região, formada essencialmente por fazendas, a instalação da fábrica foi um marco. Um dos moradores da área na época, o aposentado e ex-funcionário da Imbel Mário Meireles, 102 anos, conta como a vinda da empresa transformou o local. “Muita gente da região trabalhou na construção. Contrataram pessoas principalmente durante a Segunda Guerra Mundial, e aí os empregados foram se mudando para a área”, lembra.

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Quando entrou em funcionamento, a fábrica contratou 601 pessoas. Conforme o assessor de comunicação organizacional da Imbel, o coronel da reserva Pedro Moreira, uma das preocupações desde sua fundação era que os interesses da empresa estivessem alinhados aos da cidade. “Isso vem sendo consolidado ao longo do tempo, e temos muito orgulho. Não há um estudo econômico da época, mas grande parte do dinheiro que circulava vinha da fábrica. Além de Benfica, que já era um distrito da cidade, a criação do Bairro Araújo está intimamente ligada à sua construção. São pessoas que vieram trabalhar e foram se instalando e crescendo. É muito comum na região ter gente que conhece ou tem parentes que trabalharam aqui. Era uma verdadeira cidade a fábrica, com 85 edificações”, ressalta.

Abastecimento de água

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A relação da FEEA com Juiz de Fora está relacionada também com a melhoria do abastecimento de água. A condição para que o município comprasse a fazenda onde a fábrica seria instalada era que fosse também adquirido um terreno onde hoje é a Represa João Penido. Segundo Rômulo, eram terras com vasto potencial hídrico, e a cidade vivia um problema com a qualidade da água. “Depois de pronta a represa, foi feita a compra do material para o tratamento da água. Da Alemanha, vieram tubos esmaltados com 60cm de espessura para fazer a adução da represa para o Centro e para a fábrica. Em 15 de maio de 1937, jorrou águas nas torneiras da fábrica”, conta.

Cultura e esporte

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Além da importância econômica, os estudos de Rômulo Santos apontam que a empresa, em 1949, inaugurou o Cineteatro Auditório, com projeção do filme “Asas do Brasil”, com Oscarito. No ano seguinte, a fábrica ganhou um ginásio destinado aos filhos dos funcionários. Com a construção de vilas residenciais, que existem até hoje, a unidade também abrigou uma escola, uma maternidade, capela, alfaiataria, açougue, padaria e um clube social, a ABCR, onde ocorreram grandes bailes.

Segunda Guerra Mundial e tragédias

A Segunda Guerra e o envio de tropas brasileiras para a Itália, impactaram diretamente os trabalhos da fábrica. A unidade precisou aumentar consideravelmente sua produção de munições e passou a ser chamada de Fábrica de Juiz de Fora. Mais pessoas foram designadas para os trabalhos no local, que abastecia o Exército. “Há imagens que mostram trens carregados de munições saindo daqui de dentro. Um desvio ferroviário foi feito ainda na construção e permitia que as composições entrassem na fábrica, e isso teve uma importância logística”, destaca o coronel Moreira.
Com a produção em ritmo acelerado, um trágico acidente ocorreu em 7 de março de 1944, na oficina 4, causando a morte de 14 operários e ferimento de centenas. “Minha oficina era do lado desta onde ocorreu o acidente, a uns 20 metros. Ouvimos aquele barulho horrível e começou a desabar teto, tudo em cima de nós, umas 160 pessoas estavam trabalhando na minha oficina na hora. Pedi proteção a Nossa Senhora e consegui sair ileso, mas a cena que vi foi muito triste. Eram pedaços de corpos espalhados, sem contar aqueles que não sobraram nada”, relembra Mário Meireles.
Para homenagear as vítimas, em 1946 foi construído um monumento ao lado de onde funcionava a oficina. “Esse traumático sinistro marcou para sempre a memória do estabelecimento, sendo anualmente relembrado em torno de um monumento construído especialmente para este fim, no qual foram inseridas posteriormente, placas que registram outros acidentes, ocorridos em 1950 e 1984, que tiveram menores proporções, mas que foram igualmente tristes”, completa Rômulo.

Em constante aperfeiçoamento

Atualmente, são feitos na Ambel os tiros de 90 e 105 milímetros. (Foto: Olavo Prazeres)

Nas décadas posteriores à sua criação, a empresa chegou a fabricar complexas espoletas de tempo para munição antiaérea e calibres para a Willys Overland do Brasil, e ainda, os “relógios cuco”. Em 1977, o Ministério do Exército extinguiu os seus estabelecimentos fabris, que seriam a partir de então incorporados à recém-criada Indústria de Material Bélico do Brasil. Ela se tornou a fiel depositária do patrimônio e do conhecimento adquirido pelo Exército Brasileiro em torno da fabricação de material de defesa no país.

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Rômulo destaca que começou, nessa época, uma série de melhorias em torno da aquisição de novas plantas de produção para a fábrica de Juiz de Fora, como a de carregamento de granadas. “Enquanto outras unidades permaneceram vinculadas ao Ministério do Exército, a Imbel experimentou, na década de 1980, um período de privatização, sob a égide da Engesa Engenheiros S/A. Esse período, tal como fora na época da Segunda Guerra Mundial, foi bastante produtivo para o estabelecimento, não só em virtude dos contratos celebrados entre a Engesa e países do Oriente Médio, mas por grandes obras no complexo fabril, tal como a construção de um carregamento de explosivos por compreensão e de novos paióis, instalação de radiografia industrial e transferência da planta de forjamento de granadas da Fábrica do Andaraí (antiga Fábrica de Projetis de Artilharia), para as dependências da Fábrica de Juiz de Fora, o que complementou ainda mais a sua produção”, diz o pesquisador.

Com o pedido de concordata feito pela Engesa, em 1990, a Fábrica de Juiz de Fora entrou em um processo de estagnação e, graças ao esforço de um pequeno núcleo de funcionários, não foi sucateada. O Exército, contudo, retomou a fábrica em nome da Imbel novamente e a mantém sob sua administração. São feitos ali os tiros de 90 e 105 milímetros. Em 2016, mais uma vez, a fábrica sofreu as consequências se uma explosão. Desta vez, o acidente ocorreu em um dos paiois que ficam em uma área anexa à fábrica. O impacto foi sentido, principalmente, no Bairro Araújo, que fica a um raio de 500 metros de distância do epicentro da explosão. Várias casas tiveram janelas e portas destruídas, mas ninguém de feriu.

Para o chefe atual da unidade, o coronel da reserva Clevis Pedro Cruz Melo, os acidentes serviram para colher ensinamentos. “Nosso carro-chefe é a segurança, entendemos que dá para conviver tranquilamente e com segurança, obedecendo normas rígidas cobradas pelo Exército Brasileiro. Há um risco, claro, como toda indústria, mas aproveitamos o último acidente para melhorar ainda mais os processos de fabricação e aprimorar regras de segurança”, ponderou.

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Imbel produz munições de grosso calibre, em sua maioria para o Exército Brasileiro. (Foto: Olavo Prazeres)

Investimento em tecnologia

Para o Coronel Cruz, a empresa desempenha um papel importante na economia de Juiz de Fora e no cenário nacional. “Para Juiz de Fora, estamos falando em 280 empregos, nossa meta é atingir um faturamento este ano que gire entre R$ 10 e R$14 milhões. Com nossas pesquisas em ciência e tecnologia, além da manutenção do conhecimento em torno da produção das munições de grosso calibre, o que foi adquirido ao longo de quase um século de experiência acumulada na Fábrica de Juiz de Fora, tentamos fomentar a base da indústria de defesa e mobilização nacional”, destaca o chefe da Imbel.

Conforme o Coronel Cruz, a meta é que empresa consiga expandir sua produção para o mercado externo até 2026. “Somos uma empresa estatal, que depende do capital da União. Nosso objetivo é nos tornarmos independente deste capital, conquistando o mercado externo. Para isso, precisamos agregar valor à munição que temos, com pesquisas e tecnologia para que possamos competir com mercado externo. Um dos exemplos são as munições guiadas por satélite e com maior potencial explosivo, tudo isso já em fase de pesquisa e testes”, finalizou.

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