Um motorista chegou a ligar para o 190 e fazer uma denúncia anônima alertando a Polícia Militar sobre o risco de a condutora, de 36 anos, investigada pela batida fatal na Serra do Bandeirantes, causar um acidente naquela noite chuvosa de domingo, 13 de outubro. “Esse é o ponto crucial: a ligação feita por um motorista que ela ultrapassa na Estrada Engenheiro Gentil Forn. Ele liga para o Copom (Centro Operacional da PM) assustado pela forma como ela conduzia o veículo, incompatível e perigosa”, destaca o titular da 4ª Delegacia, Rodrigo Rolli, durante coletiva de imprensa na tarde desta quinta-feira (7). A transcrição da conversa, com frases marcantes, como “A mulher está embriagada, descendo aqui muito louca”, faz parte do inquérito, que deve ser concluído na próxima semana.
O denunciante ainda relata: “Ela passou por mim na direita, onde não pode, ali no São Pedro, e está pegando canteiro tudo, andando pra lá e pra cá, ela vai bater esse carro!”, prevê. Em outro momento do percurso, ele diz que a motorista está na contramão. A PM, por sua vez, afirma que vai mandar uma viatura para tentar uma abordagem. Mas não deu tempo: cerca de dez minutos após a ligação, realizada por volta das 22h e com três minutos de duração, o carro em questão invadiu a pista oposta e colidiu frontalmente contra o veículo onde estava uma família, na Rua Paracatu.
O menino Ângelo Gabriel Rodrigues de Mendonça, 2, não resistiu aos ferimentos sofridos na batida e teve morte cerebral confirmada no dia 16, três dias depois da ocorrência. Uma irmã dele, 9, também ficou gravemente ferida. Ela apresentou melhora em seu estado de saúde no dia 31, quando passou a respirar sem auxílio de aparelhos, mas segue internada no CTI infantil da Santa Casa de Misericórdia.
Trajeto de 11,6 km entre churrasco e acidente durou 24 minutos
Para concluir o inquérito, o delegado Rodrigo Rolli – que assumiu a investigação iniciada pelo delegado Rodolfo Rolli ao retornar das férias – aguarda o prontuário médico da menina internada e o laudo pericial que busca identificar a que velocidade a corretora de imóveis investigada no acidente passou pelo campus da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) naquela noite. Segundo Rolli, a apuração detalhou que o trajeto de 11,6 quilômetros entre o churrasco onde a motorista estava, no Bairro Aeroporto, e o local do acidente, no Bandeirantes, durou 24 minutos.
Na manhã desta quinta, ela foi intimada a prestar declarações na delegacia. “Ela compareceu, por volta das 9h30, e se utilizou do direito de permanecer em silêncio e só falar em juízo quando for interrogada. Ficou bastante chorosa. Está consternada, sensibilizada por todo o ocorrido, até pelo fato de também ser mãe”, avaliou o delegado.
De acordo com ele, os levantamentos realizados pelos investigadores resultaram em um relatório detalhado do caso. “A equipe passou a buscar câmeras e informações sobre o trajeto da investigada. Há imagens relevantes desse percurso, mas faltam laudos periciais.” Sobre o churrasco, ele disse que se tratava de uma confraternização, onde ela chegou e saiu sozinha, permanecendo cerca de nove horas no evento, ao qual teria comparecido por volta das 13h. “Pessoas que estavam no churrasco confirmam que ela fez uso de bebida alcoólica, além da garrafa de cerveja encontrada pela perícia no veículo”, destaca Rolli, lembrando que depoimentos de bombeiros e PMs mobilizados na ocorrência também apontam para sinais de embriaguez na mulher.
“O médico que atendeu ela no HPS foi solícito e respondeu que ela não tomou soro glicosado, só comum”, informou o delegado, em relação ao soro aplicado na investigada antes de ela fazer o teste clínico de embriaguez, cerca de quatro horas depois, cujo resultado foi negativo.
Vítimas
Ao todo, sete pessoas ficaram feridas, incluindo as duas crianças citadas, que estavam com os pais, de 28 e 29 anos, e mais uma irmã, de 6. O veículo no qual seguia a família era conduzido por um motorista de aplicativo, 29. No outro carro, estava apenas a condutora, de 36. Na noite da ocorrência, ela chegou a ser conduzida por suspeita de embriaguez ao volante para a Delegacia de Plantão, em Santa Terezinha, onde prestou depoimento e foi liberada. Ela teria se recusado a fazer o teste do bafômetro após a batida.
A investigada pode responder por homicídio culposo na direção de veículo automotor, conforme o artigo 302 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), que prevê reclusão de cinco a oito anos, e suspensão ou proibição do direito de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir, se o agente estiver sob influência de álcool; ou por homicídio com dolo eventual, quando a pessoa assume o risco de produzir o resultado.