Os Direitos Humanos trabalhados a partir de vivências reais é a tônica de um projeto realizado no Centro de Educação de Menores (CEM), localizado na Travessa Doutor Prisco, Centro. Na instituição, um grupo de professores trabalhou o tema ao longo do mês de novembro, destacado como o mês da consciência negra. O encerramento das atividades , no entanto, ocorre em dezembro. Algumas matérias jornalísticas selecionadas pelos estudantes se destacam nos murais que fazem parte da mostra falam sobre as violações atuais, por meio de manchetes e de fotos de corpos e rostos marcados por atos de crueldade. Por exigir muita sensibilidade, os professores de História e Língua Portuguesa propuseram leituras e filmes que abordam o Holocausto, para falar sobre o assunto e despertar reflexões. Entre as obras abordadas por eles estão: “O diário de Anne Frank”, “O menino do pijama listrado” e “Olga”.
Ainda dentro da iniciativa, o horror nas imagens dos campos de Auschwitz-Birkernau, na Polônia, salta aos olhos na exposição “Retratos de Auschwitz – A Arte em Busca da Paz”, do editor de fotografia da Tribuna, Fernando Priamo, que está em exibição na biblioteca do CEM. Nessa segunda-feira (2), esses estudantes participaram de um bate-papo com Fernando, que abordou suas impressões e sentimentos a respeito da visita à Polônia, durante uma viagem em dezembro de 2012, em uma série com cerca de 50 fotos.
De acordo com o professor de História Renê de Oliveira, um dos responsáveis pelo projeto, a ideia é a de despertar a atenção dos alunos, por meio do sentimento de empatia.
“Nos bairros em que eles moram, eles sempre veem coisas que não conseguem interpretar. Ao ver esse sofrimento, em um momento em que a sociedade não está atenta para essas dores, buscamos o entendimento deles sobre os Direitos Humanos e a necessidade de afirmar a sua importância.”
Além de Renê, estão envolvidos na elaboração do trabalho a professora Maria Elizabeth Perotti de Oliveira e Bruna Loures de Araujo Barroso, a quem o trabalho foi dedicado postumamente, pelos outros docentes participantes e pelos alunos.
Renê ressaltou o envolvimento dos alunos com as atividades que foram realizadas ao longo do mês da Consciência Negra. O trabalho com as imagens dos filmes, fotos e descrições literárias causam, segundo ele, um choque que ajuda a mexer com os estudantes. A partir disso, a discussão, iniciada dentro de sala, se alonga e passa a participar de outros espaços. De modo que o olhar desses jovens passa a perceber com mais clareza uma série de questões. Entre elas, os efeitos nefastos de levar a intolerância, a discriminação e o desrespeito às últimas consequências.
De acordo com Priamo, essa é uma oportunidade de trazer para cidade um conhecimento essencial para que essa passagem sinistra da história não se repita. Ele explica que o trabalho em Auschwitz foi feito em preto e branco, porque o campo não é o lugar da cor. “A intenção é mostrar pelas fotos o que os livros não conseguem descrever. Quando entrei no campo de concentração, sentia uma forte angústia, um aperto no peito. Chorava e não entendia o porquê. Passando pelos pontos, você sente as pessoas chorando, os policiais passando pela parte de contenção e até os cães que faziam parte dessa época. Essa presença lá é muito forte. Todos caminham em silêncio, não tem cor, não tem alegria.”
A dureza do extermínio, nas câmaras de gás, nos paredões em que as pessoas eram fuziladas, ou até mesmo no trabalho forçado, é uma visão que Fernando considera necessária, embora seja incômoda. “É horrível, mas mesmo assim, é preciso sentir, porque só sentindo criamos a consciência de que algo tão ruim pode voltar a acontecer. Por meio da arte, conseguimos fazer resistência e levar informação.”
Cartas para Anne
Em um dos cartazes feitos pelos alunos, foram coladas cartas que alguns deles escreveram para Anne Frank, a adolescente judia que teve sua vida interrompida após ser levada para o campo de concentração de Bergen-Belsen, na Alemanha. “Ela foi muito guerreira. Muita gente não conseguiria passar por metade do que ela passou. Ela aguentou o racismo por ser judia, não podia estudar, fazer amizades. Isso é horrível”, disse a aluna Laila de Souza Guimarães, que disse ter se identificado com Anne, porque as duas têm a mesma idade, 16 anos. Ela destaca no texto o choque sobre a descrição dos dois anos nos quais a família da jovem precisou viver escondida em um anexo, por conta da ameaça nazista.
A estudante Lilia Cristina Jaques, também fico tocada pela história de Anne. Ela diz que conhecer o horror vivido pela adolescente entre 1929 e 1945 é uma forma de fazer as pessoas se conscientizarem. “Assim como eu tenho sonhos, Anne também tinha. Quero que todo mundo saiba dessa história, porque ainda vivemos os efeitos dela hoje. Não temos a crueldade do campo de concentração, mas ainda temos a discriminação e o preconceito muito fortes e praticado de diversas formas”, disse Lilia. Antes do projeto, a discente Gabriela Farias não tinha informações sobre como se deu o holocausto. “Quando eu puder, vou visitar os campos de concentração. A história de Anne mexeu muito comigo, porque me imaginei no lugar dela. Ter a história interrompida de uma maneira tão trágica. Temos que amar e respeitar mais as pessoas, independente de como elas sejam e das escolhas que fazem.”