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Juiz do caso Mari Ferrer desiste de processo contra advogada juiz-forana

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O juiz Rudson Marcos, responsável pelo julgamento do empresário André de Camargo Aranha, acusado de estuprar Mariana Ferrer, desistiu do processo de danos morais movido contra uma advogada juiz-forana que, na época do caso, usou a hashtag “estupro culposo” numa página do Instagram na qual ela atua como diretora e produtora de conteúdo. No documento a que a Tribuna teve acesso, o magistrado mencionava que a repercussão do caso gerou “discurso de ódio” contra ele. 

Em decorrência do uso da tag e das críticas ao Judiciário, o juiz processou mais de cem pessoas. Nessa esteira, está a advogada de Juiz de Fora, ajuizada em uma ação de indenização por danos no Juizado Especial Cível de Santa Catarina, na qual foi pedido o valor de R$ 15 mil. Contudo, no último mês, o caso teve uma reviravolta com o pedido de desistência da causa pelo autor.

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“Diante da não localização do endereço da ré e da falta de ferramentas para fazê-lo, não faz sentido o prosseguimento do feito”, diz o documento de 5 de julho de 2024. Na visão da advogada, porém, a justificativa é uma das motivações que o juiz teria dado ao longo de várias ações semelhantes das quais vem desistindo de dar continuidade. 

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A Tribuna perguntou ao juiz o por quê da desistência dos processos e se ele acredita que houve algum equívoco na ação. Também foi perguntado se o magistrado acredita que a decisão do caso Mariana Ferrer repercutiu para que outras mulheres temessem ou que fossem incentivadas a denunciar casos de abuso. A reportagem não foi respondida até o momento desta publicação.

 

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O julgamento e a tag “estupro culposo”

O crime teria ocorrido em 2018, mas foi dois anos após o episódio que o julgamento do caso terminou – com a absolvição do acusado proferida pelo juiz Rudson Marcos. Para ele, não havia prova suficiente para a condenação, apenas a palavra da vítima. 

A decisão causou repercussão nacional que foi alavancada, sobretudo, pela divulgação de vídeos da audiência, que revelavam Mariana sendo xingada, humilhada e oprimida pelo advogado do acusado. Devido ao fato de o juiz não ter interferido na situação, ele foi advertido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por “conduta omissa”. 

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O promotor do caso chegou a compartilhar uma hipótese de que o empresário, réu do caso, não teria conhecimento de que Mariana não estava em condições de dar consentimento sexual. Sendo assim, de acordo com a hipótese, ele não teria a intenção de ter praticado o estupro. 

O cenário foi o estopim para que diversos setores da sociedade usassem as redes sociais para protestar. A divulgação da hashtag “estupro culposo” – sendo “culposo”, na Justiça, quando não há a intenção da ação, virou objeto de mobilização nacional. Também viralizou outra tag, “estupro culposo não existe”, em alusão ao fato de que estupro sem intenção não existiria, ao contrário do que foi sugerido em audiência.  Como argumento do processo movido contra a advogada juiz-forana, o juiz relata o termo “estupro culposo” não existe esse termo no campo jurídico, criticando o uso da expressão e a onda de manifestações que ela desencadeou.

Foi neste sentido que a advogada teria comentado o caso, usando sua página de direito para as mulheres, na publicação marcada com as tags “#justiçapormariferrer” e  “#estuproculposonaoexiste”. A página faz denúncias e esclarece dúvidas jurídicas às mulheres, e foi uma das muitas que foram ajuizadas. Além dela, artistas famosos que comentaram o caso em suas redes sociais também chegaram a ser processados. 

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Violência processual e conquista das mobilizações

A  Comissão da Mulher Advogada da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Juiz de Fora enviou uma nota à reportagem, comentando sobre como as advogadas são alvo de retaliações. “Defensores de direitos humanos, especialmente mulheres, muitas vezes enfrentam ameaças, intimidações e violência por causa de seu trabalho. Proteger essas profissionais é uma questão de segurança pessoal e de assegurar que possam continuar seu trabalho sem medo de retaliações.”

Nesse sentido, a entidade destaca que uma forma de desacreditar quem defende pautas importantes é processar, o que funcionaria como uma tentativa de “calar” mulheres. No entanto, segue o documento, o papel que desempenham se mantém ativo na denúncia de violações aos direitos humanos “documentando abusos e pressionando por mudanças”, inclusive, ao fazer frente contra a violência processual.

Desde novembro de 2021, o Brasil conta com a Lei Mariana Ferrer, e a legislação estabelece que seja coibido, no âmbito jurídico, o desrespeito contra as vítimas ou supostas vítimas, além das testemunhas. A lei veio como uma resposta à grande mobilização popular que se deu a partir da divulgação da audiência do caso, uma resposta que veio ao encontro dos protestos. 

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