
Apesar de negar o racionamento de água em Juiz de Fora, a Cesama admitiu, nesta terça-feira (5), que está realizando manobras no sistema de abastecimento do município para tentar reduzir os problemas de falta d’água que têm afetado bairros em diversas regiões da cidade. Isto significa que, de acordo com a demanda, a companhia precisa reforçar o fornecimento em determinada área, o que pode causar queda da pressão em outras. Diante da reclamação recorrente da comunidade, a Tribuna ouviu novamente a Cesama e buscou especialistas para explicar o que pode estar ocorrendo na cidade, além do consumo excessivo, conforme a própria companhia já havia informado em janeiro. Dados da empresa também apontaram que as estações de tratamento de água (ETAs) trabalharam no limite operacional em janeiro.
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Uma das hipóteses é de problemas de operação no limite destas estações. Hoje Juiz de Fora tem três ETAs, uma delas poderia estar trabalhando atualmente com maior capacidade de produção de litros por segundo, mas apresenta-se com parte de sua estrutura subutilizada desde 2015.
Enquanto a situação não é resolvida, leitores denunciam diariamente problemas com a escassez da água em suas casas. Nesta terça-feira (5), foi a vez de as reclamações chegarem dos bairros São Mateus, Alto dos Passos, Mundo Novo, Previdenciários e Granjas do Bosque, na Zona Sul, e São Pedro, na Cidade Alta.
Ampliação da capacidade
De acordo com Fabiano César Tosetti Leal, professor do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), a falta de água registrada em diferentes regiões da cidade pode, sim, estar relacionada à produção no limite operacional das estações de tratamento de água. “Se as estações estão produzindo no máximo e está ocorrendo alguma falta d’água, é porque o calor estava muito intenso e as pessoas consumiram mais água do que normalmente consomem. Se o consumo aumenta muito, às vezes, o sistema não tem condições de atender, então não tem jeito, a falta d’água vai acontecer mesmo.” Para o especialista, a solução seria a ampliação da capacidade do sistema de tratamento.
Rachaduras em estação de tratamento foram denunciadas em 2015
Das três estações de tratamento de água (ETA) em operação em Juiz de Fora – Marechal Castelo Branco, Walfrido Machado Mendonça e São Pedro -, a que está com parte da estrutura subutilizada é a ETA Walfrido Machado Mendonça, mais conhecida como ETA-CDI, instalada no Distrito Industrial, na Zona Norte. Isto porque a unidade passou por uma ampliação para, além das águas do Ribeirão Espírito Santo, receber também as de Chapéu D’Uvas. No entanto, quando as obras de ampliação da capacidade da ETA foram finalizadas, a estação apresentou problemas de infraestrutura, como trincas e rachaduras, nos primeiros testes operacionais.
Em novembro de 2018, a empresa Progeo Engenharia LTDA, contratada por meio de licitação, iniciou as intervenções para estabilização do maciço junto à unidade. De acordo com a Cesama, atualmente, as obras estão com 34% de execução, sendo que a previsão é de que sejam concluídas em maio deste ano. Ao final, a ETA-CDI ampliará sua capacidade de produção para pouco mais de 1.000 litros de água por segundo. Hoje opera com 850 litros por segundo (ver arte).
As falhas na infraestrutura da ETA-CDI haviam sido denunciadas, em 2015, pelo Sindicato dos Trabalhadores no Serviço de Água (Sinagua). De acordo com Edinaldo Ramos, presidente do Sinagua, com as obras de ampliação, consequentemente, a produção da Cesama iria ampliar a produção e auxiliar nos momentos de alto consumo. “Nossas estações, basicamente, não aguentam esse calor todo que vem fazendo. Está atípico: há bastante tempo não temos esse calor, e isso pesa mesmo, já que o consumo é muito maior. Mas o problema é que não produzimos mais do que já temos. Então, as estações estão no limite”, afirma. “O pessoal está reclamando da falta d’água, e a falta é porque não temos estação de tratamento. As que temos, não produzem o suficiente para esse calor.” Em janeiro deste ano, a Cesama chegou a produzir 26% de água a mais que o habitual. Durante o mês, foram cerca de 1.890 litros por segundo, sendo que, normalmente, a companhia trata e distribui aproximadamente 1.500.
Para o professor Fabiano Tosetti Leal, com as resoluções dos problemas na ETA-CDI, a unidade se tornaria essencial para o abastecimento de água em Juiz de Fora. “Teve o problema estrutural, mas, assim que for resolvido, ela vai ser, no futuro, a principal estação de tratamento da cidade.”
Cesama descarta problemas operacionais de estações
Segundo Marcelo Mello do Amaral, diretor de Desenvolvimento e Expansão da Cesama, as estações de tratamento são dimensionadas para atender a população com uma determinada “folga”. Estudos consideram o dia de maior consumo do ano para projetar a operação das unidades, considerando 20% a mais da capacidade produtiva em relação a nominal. “Se pegarmos 1.500 e colocarmos 20%, estaríamos falando que nossa estação deveria estar dimensionada para um máximo de 1800 litros por segundo, em termos de produção. Nós percebemos que superamos isso.” Isto porque, de acordo com Amaral, a capacidade instalada seria para um pico próximo a 1.900 litros por segundo.
O diretor explica que, por conta das altas temperaturas e dos vários dias sem chuvas em janeiro, o consumo do juiz-forano aumentou, logo, o sistema operou mais que o habitual por vários dias seguidos, o que também causa “estresse” nas redes e aumenta as chances de acontecer problemas estruturais. “Estamos utilizando o sistema em uma capacidade, teoricamente, para qual ele não foi projetado. Mas, como todo projeto, nós sempre deixamos uma margem”, reforça.
A ampliação da ETA-CDI, na opinião de Amaral, pode ajudar futuramente. No entanto, é necessário levar em conta todo o sistema de produção de água. A estabilização da unidade “ajudaria nesse momento em não trabalhar com as estações no máximo, porque, se ela tivesse uma capacidade maior instalada, não estaríamos operando nesse limite”, explica o diretor. “Mas as estações, ao nosso ver, corresponderam muito bem. Não apresentaram problema ao longo desse período e responderam bem a esse acréscimo que percebemos de consumo.”
Amaral reforça ainda a falta de conclusão da obra da ETA-CDI não seria um problema causador das dificuldades no abastecimento na cidade. “No nosso entendimento, a falha na rede que aconteceu na Avenida Brasil foi muito mais responsável por todo esse problema do que qualquer outra coisa, porque, se aquela rede não tivesse rompido, provavelmente o sistema teria recebido essa água das unidades de produção e teria respondido bem.” O diretor se refere ao problema de quebra de rede ocorrido na Avenida Brasil e descoberto no dia 22 de janeiro, entre as pontes do Manoel Honório e Santa Terezinha. Desta forma, a região mais atingida pela falta d’água foi a Zona Leste.
Regiões da cidade são afetadas por manobras operacionais
Desde segunda-feira (4), circula nas redes sociais uma informação falsa de que a Cesama teria implantado rodízio no abastecimento de água em Juiz de Fora. A companhia, no entanto, esclareceu que a notícia foi originalmente publicada em 2014. Na realidade, a empresa tem realizado as manobras para recuperar o abastecimento na Zona Leste. De acordo com o diretor de Desenvolvimento e Expansão da Cesama, Marcelo Mello do Amaral, não está sendo feito o rodízio porque, neste caso, o abastecimento seria oprimido em determinada região a fim de economizar água, interrompendo o fornecimento. Não é isso o que está sendo feito, e, sim, as manobras. Elas têm o objetivo de reforçar alguma área específica, no caso, a Zona Leste. “Lógico que isso acaba causando, às vezes, uma queda de pressão em determinada área ou uma dificuldade de recuperar um reservatório. Isso pode provocar, às vezes, alguma falta d’água pontual.”
Segundo o diretor, as manobras ajudam a agilizar a retomada do sistema. “Se não fizéssemos nenhuma manobra, esse desequilíbrio que teve no desabastecimento iria se normalizar naturalmente, só que ele iria se normalizar de acordo com as características geográficas da região. Quando fazemos essa manobra operacional, tentamos dar isonomia na questão da distribuição.”
Moradores enfrentam períodos sem água
No Bairro São Mateus, alguns pontos ficaram sem água na quarta-feira (30), segundo Carlos Alberto Jorge Pereira. Conforme o morador da Rua Belo Horizonte, a situação se normalizou na madrugada seguinte, porém, faltou água novamente no domingo (3). Já nas proximidades da Rua Lair Monteiro de Castro, a população sentiu reflexo no fornecimento desde quinta-feira (31), de acordo com Mariângela Duarte. “Hoje (4) começou a entrar água no hidrômetro, mas não deu para abastecer as residências.”
A moradora da Rua Murilo Mendes, no Granjas do Bosque, Elaine Rosa, relatou problemas ao procurar a Cesama. Elaine sentiu falta d’água no domingo, mas só conseguiu contato com a companhia na última segunda-feira (4). A informação é de que uma equipe havia saído para verificar a situação. Nesta terça-feira (5), tentou contactar novamente, mas, segundo a moradora, a Cesama não deu uma resposta. “Minha sorte é que tenho uma alternativa: atrás do meu condomínio tem água de mina. Mas, ainda assim, a Cesama ainda não abasteceu minha rua.”
O Bairro Previdenciários também teve problemas no abastecimento no domingo e na segunda-feira. “Em algumas partes da casa, abríamos a torneira e não saía água”, relatou Lívia Rinco de Oliveira, moradora da Rua Aristóteles Fabrino. A Tribuna ainda recebeu reclamações sobre falta de água em bairros como São Pedro, Alto dos Passos, Mundo Novo e Mariano Procópio.